Saad Said: “Modelos de governança liderados pelos cidadãos levam a sociedades mais democráticas e equitativas”

O convidado que abre a conferência do Isto é PARTIS & Art for Change, a 26 de janeiro, é cofundador da organização “Citizens in Power”, no Reino Unido, e mostra possíveis caminhos para um futuro mais participativo.
22 jan 2024 6 min
PARTIS & Art for Change

Como surgiu a iniciativa Citizens in Power [Cidadãos no Poder]?

Citizens in Power” nasceu de uma colaboração entre mim e o David Jubb. Conhecemo-nos em 2017, quando trabalhávamos no setor cultural no Reino Unido. Apesar das nossas diferentes origens em termos de etnia, classe, religião, cultura e política, ambos partilhámos uma paixão mútua pela governança liderada pelos cidadãos. Imaginámos uma plataforma que pudesse unir pessoas de diversas origens e promover uma melhor tomada de decisões através da escuta ativa, da deliberação e da compreensão mútuas. Isto levou à criação de “Citizens in Power”, com o objetivo de reunir pessoas de diferentes origens para tomarem melhores decisões, escutando-se mutuamente. 

O que é a “citizen-led governance[governança liderada pelos cidadãos]?

É uma abordagem dinâmica e inclusiva para a tomada de decisões e para a liderança. Dá ênfase à participação ativa dos cidadãos no processo de governação, permitindo-lhes deliberar, tomar decisões informadas e moldar coletivamente os seus destinos. Este modelo afasta-se dos sistemas tradicionais de governação bipartidária, que frequentemente promovem a exclusividade e não representam adequadamente as sociedades dinâmicas de hoje. Em alternativa, oferece uma plataforma mais equitativa onde diversas vozes são ouvidas e as decisões são tomadas de forma colaborativa, transparente e inclusiva.

Como pode este tipo de governança ser aplicado no sector cultural? Como é que se relaciona com a arte participativa?

No sector cultural, a governança liderada pelos cidadãos pode manifestar-se através de iniciativas que promovam a cocriação, a participação e a tomada de decisões em colaboração entre comunidades, artistas e instituições. Tem um profundo eco na arte participativa, uma vez que ambos os domínios sublinham a importância de envolver a comunidade no processo criativo.

Alguns exemplos são orçamentos participativos, em que os cidadãos têm uma palavra a dizer diretamente sobre a despesa pública em projetos culturais, e modelos de cocriação, em que os cidadãos estão ativamente envolvidos na conceção e implementação de programas culturais. Estas abordagens garantem que as iniciativas refletem e respondem às necessidades e aspirações da comunidade, conduzindo a paisagens culturais mais vibrantes e inclusivas.

Quais diria que são os maiores desafios e as melhores conquistas do trabalho com projetos liderados por cidadãos no Reino Unido nos últimos anos?

Os maiores desafios passam por mudar métodos enraizados de fazer política e mentalidades resistentes à mudança, reduzir o fosso entre grupos comunitários diversos e garantir uma verdadeira inclusão e representação nos processos de tomada de decisão.

Mas, apesar desses desafios, tem havido conquistas significativas, como a implementação bem-sucedida de modelos de governação inovadores, tais como o orçamento participativo e a votação deliberativa [deliberative polling, uma metodologia de consulta pública que utiliza amostras aleatórias de cidadãos e explora a formação de opiniões com base no acesso a mais e melhor informação], que levam a sociedades mais democráticas e equitativas. Estes êxitos sublinham o potencial da governança liderada pelos cidadãos para promover um sentido de autonomia entre as pessoas e para impulsionar uma mudança social significativa. Há ainda um longo caminho a percorrer, mas creio que estamos a viver um momento importante em torno deste modelo e da sua capacidade para construir uma sociedade melhor.

O que é que os participantes podem esperar do workshop Citizens in Power: Engage?

O workshop é construído em torno de um conjunto de conversas dinâmicas, colaborativas e coletivas que oferecem uma oportunidade para compreender e explorar os diferentes níveis que as instituições utilizam para se envolverem e partilharem o poder com os cidadãos, desde a participação à cocriação até à transferência total da liderança e da tomada de decisões. Será uma oportunidade para compreender melhor os desafios e as oportunidades que cada nível de envolvimento oferece às instituições.

Citizens In Power é uma organização sem fins lucrativos, do Reino Unido, que tem como objetivo codesenhar formas de os cidadãos liderarem a tomada de decisões e moldarem o futuro. Foi fundada por Saad Eddine Said e David Jubb em 2023.

Tem atualmente uma parceria com a St Pauls Carnival, Trinity Arts e West of England Combined Authority para a criação de uma assembleia de cidadãos para a cultura, abrangendo 1,2 milhões de pessoas, que conta com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian e do Arts Council England. Está também a trabalhar em West Cumbria, no Reino Unido, para criar uma assembleia de cidadãos para definir a visão estratégica e o programa da We Are Here, uma organização financiada pelo Arts Council England.

A organização Citizens In Power está ainda a construir uma rede de organizações que pretendem trabalhar em conjunto para liderar a transição para a tomada de decisões por parte dos cidadãos no setor cultural.

Saad é também Diretor Artístico e CEO da New Art Exchange em Nottingham (desde 2022) e David é o antigo Diretor Artístico e CEO do Battersea Arts Centre (2004-2019).

 

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Conheça os projetos artísticos apoiados pela Fundação Calouste Gulbenkian, em parceria com a Fundação ‘la Caixa’, que demonstram o papel cívico das artes e da cultura na construção de comunidades mais sustentáveis, coesas e justas.

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