Quando o circo e a inclusão social combinam forças

Nos últimos três anos, dezenas de jovens sujeitos à medida mais severa prevista na Lei Tutelar Educativa participaram numa iniciativa do Chapitô. Um projeto para conhecer na mostra Isto é PARTIS, entre 23 e 27 de janeiro.
03 jan 2019

Quem visita o Centro Educativo Padre António de Oliveira, em Caxias, é surpreendido por uma visão inesperada: uma tenda de circo montada no espaço exterior ao edifício. É nesta tenda que os cerca de 20 adolescentes deste Centro praticam artes circenses todas as semanas, desde 2016, com a equipa artística do Chapitô. No final de cada ano, realizam um espetáculo que é apresentado às famílias. Este é um dos 16 projetos apoiados na segunda edição da iniciativa PARTIS – Práticas Artísticas para a Inclusão Social, da Fundação Calouste Gulbenkian.

A modalidade acrobática das artes circenses “Forças combinadas”, que dá nome ao projeto, pressupõe a participação de pelo menos dois indivíduos que trabalham, em cooperação, a construção de pontos de equilíbrio, só possíveis pela conjugação dinâmica das forças individuais, em busca de uma estética marcada pela ousadia e inovação artística. O projeto do Chapitô inspira-se nessa disciplina para, com estes jovens em risco, viver o percurso transdisciplinar de uma companhia artística, abrindo as portas da “prisão” para um mundo cheio de possibilidades.

Forças Combinadas @Chapitô
Forças Combinadas @ Chapitô

Para Américo Peças, responsável pela supervisão científica do projeto, “O espetáculo é um fator transformador, porque é aí que se atinge o máximo de partilha e de exigência pessoal e interpessoal. Quando estamos num palco excedemo-nos, vamos mais longe.” A necessidade de cooperação inerente à prática artística é também uma forma de “passar da ‘egocentração’ para o encontro humano”. Estes “são miúdos que têm percursos muito individualizados, muito sós, que vivem um processo de grande solidão” e “esta aprendizagem do outro é vital para a inclusão social”, diz Américo.

O trabalho desenvolvido este ano partiu de uma perspetiva muito intimista. “Como te sentes quando estás exposto ao olhar do outro?” e “Qual a sensação de estar em palco?” foram as perguntas que conduziram ao espetáculo final apresentado às famílias em dezembro (“Perspetivas”). Para Cláudia Nóvoa, diretora artística, o trabalho com os miúdos resulta de um longo processo de negociação. “Eles à partida dizem que não querem, têm de ser um pouco empurrados e levados a fazer. Muitas vezes só depois do espetáculo é que descobrem que é possível, que valia a pena”. Durante o espetáculo, o ambiente dentro da tenda é, sobretudo, de grande emoção. Além de poderem mostrar competências em várias áreas do circo (acrobacia, tecido vertical, trapézio, malabarismo, equilíbrio, dança, etc), os rapazes cantam raps escritos por eles, com mensagens de dor e de esperança. “As famílias muitas vezes não acreditam minimamente neles. Isto é uma prova de que são capazes de fazer alguma coisa”, sublinha Cláudia.

Um “enorme investimento”, numa realidade que muitos desconhecem ou desvalorizam, é o que Teresa Ricou, mentora do Chapitô, vê nestas iniciativas. “A ideia não é fazer caridade, e sim solidariedade”, diz, contradizendo “a tendência da sociedade para a comiseração”. Há 40 anos que o Chapitô trabalha de perto com centros educativos, procurando não só colocar os jovens em contacto com a prática artística e artistas circenses, abrindo assim uma possibilidade de via profissional, mas também influenciar as políticas relativamente às medidas tutelares educativas para menores, demonstrando que é possível, através das artes, ajudar na integração e inclusão social dos jovens e contribuir para uma menor taxa de reincidência.

No dia 26 de janeiro, integrada na mostra Isto é PARTIS, uma visita ao Centro Educativo de Caxias permitirá ver o espetáculo e até participar num workshop com a equipa artística do projeto. A visita é gratuita, mas requer inscrição.

ISTO É PARTIS 2019

23 jan a 13 fev
Exposição Ilha, do projeto Retrato das ilhas: Bonfim para além das fachadas
Ordem dos Arquitetos. Saiba Mais

25 a 27 jan
Exposição do projeto Refúgio e Arte: dormem mil cores em meus dedos. Saiba Mais

25 jan
10:00 – Conferência Arte e Comunidade: diálogos irrequietos. Saiba Mais

26 jan
10:00 – Artes Circenses e Workshop Perspectivas do projeto Forças Combinadas. Saiba Mais
16:00 – Concerto Renascer do projeto Zéthoven – Plante Um Músico. Saiba Mais
18:00 – Filme-concerto Curtas Migratórias do projeto Odisseia. Saiba Mais

27 jan
16:00 – Concerto Xilobaldes do projeto Tum Tum Tum. Saiba Mais
18:00 – Documentário do projeto Geração SOMA. Saiba Mais

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