José Augusto França, decano da História da Arte em Portugal
“Dom da natureza desejado? O voo. Como gostaria de morrer? Com pré-aviso de nove meses, o que me parece equitativo.”
José Augusto França em Memórias para o ano 2000. Lisboa : Livros Horizonte, 2002 (página 384)
José Augusto França (1922-2021) é uma das personalidades mais marcantes e influentes do panorama cultural português da segunda metade do século XX, com uma vasta obra no âmbito da história, da crítica e da sociologia da arte.
“O que lhe aconteceu foi ter escrito, por encomenda, em 56, … um estudo sobre Amadeu de Sousa Cardoso que não vendeu 500 exemplares, mas lhe apontou caminhos de história e crítica de arte que foram por aí, profissionalmente, com doutoramentos, cátedra, jubilação internacionais de boa referência, no domínio da historiografia.”
José Augusto França em José-Augusto França : uma exposição bibliográfica. Lisboa : Biblioteca Nacional de Portugal : INCM, 2012 (página 25)
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José Augusto França começou a escrever na juventude e manteve esta atividade ao longo da sua vida ativa. Com apenas 15 anos, em 1937, publicou os seus primeiros artigos no Diário do Alentejo – uma série de crónicas intituladas Tipos alfacinhas – e no República.
Mais tarde, fez formação académica na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde frequentou o curso de Ciências Histórico-Filosóficas, que não terminou (1941-1944). O interesse pelo Surrealismo levou-o a participar no denominado “Grupo Surrealista de Lisboa” (1947-1949) com, entre outros, Alexandre O’Neill, Mário Cesariny, António Pedro e João Moniz Pereira. Foi por estes anos que publicou a sua primeira obra no campo da ficção: o romance Natureza morta (1949).
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No início da década de 1950, a criação de uma revista de cariz literário e artístico, de que se publicaram 5 números – Unicórnio (1951), Bicórnio (1952), Tricórnio (1952), Tetracórnio (1955) e Pentacórnio (1956) – ficou a dever-se à sua iniciativa.
“Na «Brasileira», então, veio a ideia do Unicórnio, por efeito do convívio com os amigos surrealistas, quando ainda, nas mesas do café, se convivia […]
Seria então, e por minha mais pessoal vontade, e chamando-lhe legalmente «antologia de inéditos de autores portugueses contemporâneos», que é, e edição do autor (da antologia, conforme o código), sem, portanto, ser passível de censura. Periodicidade, taxativa da definição de revista, não tinha: sairia quando saísse, e foram cinco números, entre Maio de 1951 e Dezembro de 1956. O título mudava, como era mister, para iludir a continuidade, e nele se numerava a publicação, em prefixos latinos e gregos de ocasião, por ideia macaca, de manguito às instituições…”
José Augusto França em Unicórnio, etc. : mostra documental. Lisboa : Biblioteca Nacional, 2006 (páginas 7-8)
Ao longo dos 5 números, a revista publicou textos de autores de gerações e opiniões distintas, como Fernando Pessoa, Adolfo Casais Monteiro, Jorge de Sena, Eduardo Lourenço, Alexandre O’Neill, António Sérgio, António Pedro, António Quadros, Sophia de Mello Breyner Andresen e David Mourão Ferreira, entre outros, e na parte visual nela colaboraram os companheiros de França nas experiências surrealistas, os jovens Fernando Lemos, Marcelino Vespeira e Fernando de Azevedo, assim como António Pedro, Almada Negreiros e Júlio.
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Os anos de 1950 foram para José Augusto França de prolífica e profícua atividade, dividida entre o cinema e as artes plásticas.
O “antigo” e o “moderno” no cinema (1951), As pontes de Paris e Paris à meia-noite (1953), O jovem cinema italiano (1953) e Charles Chaplin: o “self-made-myth” (1954) são alguns dos títulos que resultaram do seu interesse pela 7.ª Arte e da sua atividade como cinéfilo e crítico, para além de diversos artigos que foi publicando, desde o início dos anos de 1940, em jornais e revistas: Diabo –O écran duma época (31 agosto 1940) – Província de Angola – Aniki-bóbó era um bom filme (23 setembro 1945), texto escrito sob o pseudónimo J. AFRA – , Seara Nova (1949-1959), Imagem (1954-1961), por exemplo. Foi também o dinamizador da programação das “Terças-feiras Clássicas”do Jardim Universitário de Belas Artes (JUBA) realizadas no cinema Tivoli (1948-1952), em conjunto com Guilherme Filipe.
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No campo das artes plásticas, fundou com Fernando Lemos (responsável pelo desenho gráfico dos catálogos) e dirigiu a Galeria de Março – de existência breve (1952-1954). Continuou na prática de crítico de arte, iniciada em 1946 no jornal Horizonte: jornal das artes.
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“A «Galeria de Março» ficou-se devendo, assim, em parte a Almada, com resultados comerciais apreciáveis…; mas todas as exposições que depois se fizeram venderam zero quadros (minto:um!, por simpático acaso, convencendo eu um parente) e só as cerâmicas do Cargaleiro que se estreava… e porcelanas de Pedro, por curiosidade de Natal…
[…] Teve ela [a galeria] ainda banquete de primeiro aniversário,…, organizou outro, de homanagem à Vieira da Silva, …. – e durou, mesmo assim dois anos e três meses, ou melhor contandoo, 32 exposições, de modernidade possível, ecléctica como devia civicamente ser, com pontualidade de inaugurações, catálogos… e muitas e inúteis provas de estima.”
José Augusto França em Memórias para o ano 2000. Lisboa : Livros Horizonte, 2002 (páginas 113-114)
Publicou os livros Amadeo de Souza-Cardoso (1956), Primeiro diálogo sobre arte moderna (1957) e Situação da pintura ocidental (1958), para além de escrever textos em catálogos de exposições e da colaboração em jornais, nomeadamente, na página cultural de O comércio do Porto (1952-1973). Continuou igualmente com incursões na ficção literária, com as obras Azazel (1956), peça em três actos, e Despedida breve e outros contos (1958).
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Depois de várias estadias anteriores na capital francesa, em 1959, José Augusto França partiu para Paris como bolseiro do governo francês (1959-1963), diplomando-se na École Pratique des Hautes Études, em Sociologia da Arte, com a tese L’art dans la société portugaise au XXe siècle, e obtendo, primeiro o Doutoramento em História (1962), com a tese Une ville des Lumiéres: la Lisbonne de Pombal – investigação orientada pelo historiador de arte francês Pierre Francastel -, e depois o Doutoramento em Letras e Ciências Humanas (1969) com o trabalho de investigação intitulado Le Romantisme au Portugal. Todos estes estudos foram posteriormente traduzidos e publicados em Portugal.
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Regressado a Portugal em meados da década de 1960 – mantendo sempre a sua ligação ao meio cultural francês – José Augusto França realizou cursos e conferências de História da Arte na Sociedade Nacional de Belas Artes, escreveu e publicou os livros A arte em Portugal no século XIX (1966, edição revista e aumentada em 1981), e A arte em Portugal no século XX (1974, reditada em 1985 e 1991) e começou a rubrica “Folhetins artísticos” no Diário de Lisboa (1968-1987), com textos de reflexão e crítica sobre aspectos da sociedade e cultura contemporâneas. Até 1987, escreveria 500 folhetins, publicados em dois volumes pela Imprensa Nacional em 1984 e 1993.
Continuou a escrever para o Diário Popular (1957-1978) e para o Jornal de letras e artes (1961-1968). Foi igualmente nesta década que José Augusto França estendeu a sua colaboração a diversas revistas e jornais estrangeiros, como as francesas Aujourd’hui: art et architecture (1960-1967), Les cahiers du cinema, Les temps modernes, a espanhola Goya e o jornal brasileiro O Estado de São Paulo.
“E nessa revista, paralela à «Architecture d’aujourd’hui» e que era então a melhor da Europa, sobre arte contemporânea, mantendo, no novo título, «Aujourd’hui arte et architecture», a mesma exigência crítica da actualidade… eu entrei a colaborar, a convite do director André Bloc, arquitecto e pintor, com quem fizera camaradagem na viagem do Brasil. E comecei por um artigo sobre «La jeune peinture portugaise», ainda em 59 – como já fizera em 53 no «Soleil noir», em 56 nos «Quattro soli», - de Roma, e mais tarde faria, já em 63 e 64, na «Civilità delle machine», de Roma também, ou na «Humboldt» de Munique, ou na «Goya» de Madrid.”
José Augusto França em Memórias para o ano 2000. Lisboa : Livros Horizonte, 2002 (página 151)
Em 1967, foi sua a organização do I Encontro de Críticos de Arte Portugueses, promovido pelo Centro Nacional de Cultura sob os auspícios da Association Internationale des Critiques d’Art, de que era membro desde 1954. Deste encontro resultou a restruturação da secção portuguesa, ocupando José Augusto França a respectiva direção e a responsabilidade pela produção de Pintura&não, espécie de boletim da secção, publicado como suplemento da revista Arquitectura (1969-1970).
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Em 1969, França tornou-se membro do Comité International d’Histoire de l’Art, por indicação do historiador da arte André Chastel.
Pelo meio, fez viagens ao Brasil, para conferências e visitas ao amigo Fernando Lemos – que aí residia depois de ter abandonado o país em 1953 -, aos Estados Unidos e ao México, realizou conferências sobre História da Arte ocidental e portuguesa na Sociedade Nacional de Belas Artes, onde criou também o Curso de formação artística (1964).
A revolução de abril de 1974, que fez cair o regime ditatorial que governou Portugal durante quase meio século, trouxe a José Augusto França a possibilidade de integrar, como professor catedrático, o corpo docente da recém-formada Universidade Nova de Lisboa e criar, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, o Departamento de História da Arte e o primeiro mestrado em História da Arte do país. No mesmo ano foi eleito presidente do Centro Nacional de Cultura (1974-1987).
Poucos anos antes, em 1971, foi-lhe confiada a direção da revista Colóquio. Artes, dando continuidade à colaboração que o crítico e historiador da arte tinha iniciado, em 1959, com a Colóquio: revista de letras e artes, criada nesse ano pela Fundação Calouste Gulbenkian. Dividida em Letras e Artes, José Augusto França dirigiu a Colóquio. Artes: revista de artes visuais, música e bailado, do primeiro ao último número – N.º 111 (outubro-dezembro 1996).
“Eu começara também, em 1959, a colaborar na revista de artes e letras que a Fundação Gulbenkian principiou então a editar, a «Colóquio», dirigida, numa e outra parte, por Reynaldo dos Santos e por Hernâni Cidade […] e desde o primeiro número, creio que só com uma falta, colaboração minha houve na «Colóquio», de temas e factos de actualidade artística, nacional ou estrangeira, conforme eu desejasse e sempre era aceite.”
José Augusto França em Memórias para o ano 2000. Lisboa : Livros Horizonte, 2002 (página 152)
Intercalando a sua vida em Lisboa, com períodos de residência em França, entre as variadas ocupações de José Augusto França na década de 1970, contam-se a realização de cursos de história da arte portuguesa no Institut d’Études Portugaises da Universidade de Paris 1-Sorbonne (1971-1975), a organização do Centro de Estudos do Século XIX, com Joel Serrão, Vitorino Nemésio e José Tengarinha (1971-1975), as presidências do Instituto de Língua e Cultura Portuguesa, organismo que antecedeu o Instituto Camões (1976-1980), e da Academia Nacional de Belas Artes (1976-1979).
Entre as obras que José Augusto França publicou ao longo desta década, constam Onze quadros para “A Brasileira do Chiado” (1971), Millares : “Antropofaunas”, “Neanderthalios” et autres oeuvres recentes de 1966 à 1970 – texto escrito para a exposição no Musée d’art moderne de la ville de Paris (1971) -, a 2.ª edição do estudo pioneiro sobre a obra de Amadeo de Souza-Cardoso (1972), Almada, o português sem mestre (1974), A arte em Portugal no Século XX (2.ª edição revista em 1984, reeditada em 1991 e em 2009), Zé Povinho na obra de Rafael Bordalo Pinheiro 1875/1904 (1975), Le romantisme au Portugal (1975) e O modernismo na arte portuguesa (1979).
Em 1972, o seu estudo sobre a cidade pombalina foi traduzido para italiano e publicado em Roma, numa coleção dedicada à arquitectura dirigida pelo historiador de arquitectura Manfredo Tafuri.
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Na década seguinte, o seu labor de escrita no âmbito da cultura, da crítica e da história da arte não esmoreceu, sendo publicados os livros Rafael Bordalo Pinheiro, o português tal e qual (1981), O retrato na arte portuguesa (1981), Cem exposições (1982), com os textos sobre exposições publicados entre 1949 e 1980, Amadeo de Souza-Cardoso, o português à força ; Almada Negreiros, o português sem mestre (1986) – reúne os textos de Amadeo de Souza-Cardoso, numa 3.ª edição refundida, e Almada Negreiros, o português sem mestre (2.ª edição) -, Malhoa, o português dos portugueses & Columbano, o português sem portugueses (1987), História da arte ocidental, 1789-1980 (1987).
Paralelamente, José Augusto França continuou a escrever em jornais e a publicar textos em catálogos de exposições em galerias.
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Na Fundação Calouste Gulbenkian, para além da direção da Colóquio. Artes, José Augusto França foi responsável por diversas exposições, realizou conferências, participou em mesas-redondas e ocupou o cargo de diretor do Centro Cultural Português em Paris (1983-1989).
Durante a sua direção, o Centro Cultural Português realizou colóquios internacionais e exposições – com os artistas portugueses em destaque no ciclo L’artiste du mois, um programa que divulgou ao público parisiense a obra de 27 artistas, recitais e concertos, para além de ter apoiado a publicação de diversas obras literárias de autores portugueses por editoras francesas.
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Desta sua estadia parisiense resultou ainda a organização de duas importantes exposições, que divulgaram junto do público francês, respetivamente, aspetos da história da arte portuguesa de Oitocentos e da Lisboa pombalina: a exposição Soleil et ombres: l’art portugais du XIXème siècle, apresentada no Musée du Petit Palais, entre outubro de 1987 e janeiro de 1988, e Une ville des Lumières: la Lisbonne de Pombal (1988), realizada no Centro Cultural Português, no âmbito do colóquio La ville régulière: modèles et tracés.
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Dividindo o seu quotidiano entre a sua residência francesa de Jarzé (em 1972, José Augusto França casou com a historiadora de arte francesa Marie-Thérese Mandroux) e o apartamento da Rua da Escola Politécnica, durante os períodos em Lisboa era frequente encontrá-lo na Biblioteca Nacional, fazendo as suas investigações, e no jardim da Estrela, onde começou a passar as suas manhãs, sentado na esplanada defronte dum dos lagos, lendo o jornal, ou conversando com amigos que, sabendo onde encontrá-lo, por lá passavam.
“O jardim botânico é extraordinário, mas é a subir e a descer, o jardim do Príncipe Real é perto demais de minha casa, e um dia vim até aqui e pensei: cá está o meu jardim. Não me recordei nada de menino, com certeza, mas achei que me convinha.”
Entrevista de Ana Barata a José Augusto França em Estrela: jardim romântico. “LX metrópole”, N.º 6 (março 2002), página 22
Ao longo da década de 1990 José Augusto França continuou a escrever sobre arte e cultura – Os anos vinte em Portugal: estudo de factos sócio-culturais (1992), Bosch ou o visionário integral (1994) – a viajar (Rússia, Japão, Goa), e a comissariar exposições, como D. João VI e o seu tempo (1999).
Em 1992, tornou-se professor jubilado da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, onde realizou a “oração de sapiência” História, que História? (1995) e em 1998 foi eleito para a Real Academia de Belas Artes de São Fernando (Madrid).
Ainda em 1992, o então designado Departamento de Documentação e Pesquisa do Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian dedicou-lhe uma exposição bibliográfica, associando-se às celebrações que recebeu pela sua jubilação, e como agradecimento pela doação da sua bibliografia ativa.
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No dealbar desde século, publicou as suas Memórias para o ano 2000. E regressou à ficção, escrevendo romances – Buridan (2002), A bela Angevina (2005), por exemplo – e contos.
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“A suposição de virem a ser póstumas as memórias, havida ao seu início, quando as pensei ou quando, em 1993, comecei as escrevê-las, com os anos foi abrandando – mesmo que todas as memórias sejam sempre de além-túmulo. Na verdade, nasci com esperança de vida de trinta e cinco anos, ia-não-ia chegar ao dobro, ultrapassei-o depois – e me prefacio agora.”
José Augusto França em Memórias para o ano 2000. Lisboa : Livros Horizonte, 2002 (página 2)
Em 2004, José Augusto França decidiu doar à sua cidade natal, Tomar, a coleção de arte que foi fazendo ao longo dos anos. Foi assim criado o Núcleo de Arte Contemporânea José Augusto França, que integra obras de, entre outros artistas, Almada Negreiros, Fernando Lemos, José de Guimarães, Mário Eloy, Bernardo Marques, António Pedro e Marcelino Vespeira.
Em 2012, a Associação Portuguesa de Historiadores de Arte organizou, na Fundação Calouste Gulbenkian, um congresso internacional de história da arte em sua homenagem, tendo a Biblioteca de Arte realizado uma exposição bibliográfica com obras que integram a coleção que lhe foi doada em 1992.
José Augusto França recebeu diversas condecorações honoríficas, entre as quais se contam a Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique (1991), a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique (2006) e a Grã-Cruz da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada (2021).
A Coleção José Augusto França foi doada à Fundação Calouste Gulbenkian pelo historiador e crítico de arte em 1992, e reúne um conjunto de documentação composto pelos seus escritos desde o final da década de 1950, até ao início dos anos de 1990. Constituindo uma das coleções especiais do acervo da Biblioteca de Arte, integra algumas das obras mais relevantes e conhecidas da vasta bibliografia de José Augusto França. Estão também presentes outros títulos escritos paralelamente aos estudos no âmbito da história e da sociologia da arte, nomeadamente os seus textos sobre o cinema.
Outro núcleo importante desta coleção são os catálogos de exposições em museus e galerias, em que participou como comissário ou em que colaborou, e os textos que publicou em revistas especializadas nacionais e estrangeiras, bem como os que escreveu em jornais diários nacionais e estrangeiros.
Para além das obras que José Augusto França escreveu até à década de 1990, que constituem esta coleção, encontram-se no acervo documental da Biblioteca outras obras por ele escritas e publicadas desde aquela década, de que se destacam: A sétima colina: roteiro histórico-artístico (1994), que coordenou, no âmbito da Lisboa Capital da Cultura 94, Lisboa 1898: estudo de factos socioculturais (1997), 28, crónica de um percurso (1998), 100 quadros portugueses no século XX (2000), as Memórias para o ano 2000 (2000) e Lisboa: história física e moral (2008) um dos seus últimos estudos sobre a capital portuguesa.
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Artistas e autores
Saiba mais sobre a vida e obra de artistas e autores representados na Biblioteca de Arte e Arquivos Gulbenkian.