Brahms: Sinfonia n.º 3
Orquestra Gulbenkian / Lorenzo Viotti
O temperamento intensamente autocrítico de Brahms manifestava-se em particular na sua relação com a música orquestral e de câmara, domínios em que durante muito tempo viveu intimidado pela sombra de Beethoven, o paradigma que ansiava emular. As suas pretensões sinfónicas parecem ter sido estimuladas (e inibidas) ainda mais em 1853, com o artigo encomiástico em que Schumann o apresentava como o real sucessor de Beethoven. De facto, vários anos passariam até que o compositor sentisse realmente confiança para abordar o género sinfónico. A Sinfonia n.º 3, em Fá maior, op. 90, foi escrita no espaço de quatro meses, no verão de 1883, durante uma estadia em Wiesbaden, num estúdio com vista para o Reno. A estreia teria lugar a 2 de dezembro de 1883, com a Orquestra Filarmónica de Viena, sob a direção de Hans Richter. Trabalhada com mestria, esta é uma obra representativa da sua maturidade, sendo caracterizada pela estrutura compacta e sofisticada, em termos temáticos e tonais.
O primeiro andamento, Allegro con brio, concebido em forma sonata, abre com um arrojado gesto cromático que inclui um motivo de três notas que reaparecerá sob várias feições. O primeiro tema cita uma ideia apaixonada da Sinfonia n.º 3, Renana, de Schumann, dando lugar a uma atmosfera reflexiva e nostálgica. Num denso desenvolvimento, este segundo tema é reinterpretado com um caráter trágico, enquanto o primeiro surge agora entre o lírico e o monumental. Segue-se um Andante, em Dó maior, numa forma sonata modificada, marcado pelas suas melodias de cariz folclórico, bem como por um recorrente jogo de pergunta e resposta entre sopros e cordas. O terceiro andamento, Poco allegretto, em Dó menor, está estruturado numa forma ternária. A melodia melancólica apresentada inicialmente pelos violoncelos retornará mais tarde, após o jogo rítmico de uma secção contrastante, em Lá bemol maior. Por fim, o quarto andamento, Allegro, novamente numa forma sonata modificada, inicia-se vigorosamente em Fá menor, apresentando um primeiro tema mais ansioso e um segundo tema aparentemente mais despreocupado, até que a turbulência encontra resolução numa coda que retoma Fá maior, ecoando uma última vez a ideia melódica de Schumann.
Intérpretes
- Maestro
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Orquestra Gulbenkian
Em 1962 a Fundação Calouste Gulbenkian decidiu estabelecer um agrupamento orquestral permanente. No início constituído apenas por doze elementos, foi originalmente designado por Orquestra de Câmara Gulbenkian. Ao longo de sessenta anos de atividade, a Orquestra Gulbenkian (denominação adotada desde 1971) foi sendo progressivamente alargada, contando hoje com um efetivo de cerca de sessenta instrumentistas, que pode ser expandido de acordo com as exigências de cada programa. Esta constituição permite à Orquestra Gulbenkian interpretar um amplo repertório, do Barroco até à música contemporânea. Obras pertencentes ao repertório corrente das grandes formações sinfónicas podem também ser interpretadas pela Orquestra Gulbenkian em versões mais próximas dos efetivos orquestrais para que foram originalmente concebidas, no que respeita ao equilíbrio da respetiva arquitetura sonora.
Em cada temporada, a Orquestra Gulbenkian realiza uma série regular de concertos no Grande Auditório, em Lisboa, em cujo âmbito colabora com os maiores nomes do mundo da música, nomeadamente maestros e solistas. Atua também com regularidade noutros palcos nacionais, cumprindo desta forma uma significativa função descentralizadora. No plano internacional, a Orquestra Gulbenkian foi ampliando gradualmente a sua atividade, tendo efetuado digressões na Europa, na Ásia, em África e nas Américas. No plano discográfico, o nome da Orquestra Gulbenkian encontra-se associado às editoras Philips, Deutsche Grammophon, Hyperion, Teldec, Erato, Adès, Nimbus, Lyrinx, Naïve e Pentatone, entre outras, tendo esta sua atividade sido distinguida, desde muito cedo, com diversos prémios internacionais de grande prestígio. O finlandês Hannu Lintu é o Maestro Titular da Orquestra Gulbenkian, sucedendo a Lorenzo Viotti.
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Lorenzo Viotti
Maestro Convidado Principal
Na terceira temporada como Maestro Principal da Orquestra Filarmónica e da Ópera Nacional dos Países Baixos, Lorenzo Viotti dirige cinco programas diferentes no Concertgebouw de Amesterdão, incluindo obras de Brahms, Verdi, Ravel, Dvořák, Mahler, Tchaikovsky, Rachmaninov, Sibelius e Schönberg. A orquestra tem também agendada uma digressão na Alemanha e na Bélgica. Viotti dá também continuidade à sua colaboração com o encenador Barrie Kosky, concluindo a nova produção de Il trittico de Puccini, apresentada ao longo de três temporadas. Dirige ainda Lohengrin, a sua primeira ópera de Wagner.
Em 2023-2024, na qualidade de maestro convidado, Lorenzo Viotti estará envolvido em numerosos concertos e projetos, incluindo uma digressão europeia com a Filarmónica de Viena e colaborações com a Filarmónica de Munique, a Staatskapelle Berlin, a Sinfónica Nacional Dinamarquesa e a Sinfónica de Tóquio. Dirige ainda uma nova produção de Simon Boccanegra, de Verdi, com encenação de Daniele Abbado, no Scala de Milão, e uma reposição da produção de Die Csárdásfürstin, de Emmerich Kálmán, na Ópera de Zurique.
Natural de Lausanne, na Suíça, Lorenzo Viotti nasceu no seio de uma família de músicos de ascendência italiana e francesa. Estudou piano, canto e percussão em Lyon, tendo inicialmente sido percussionista da Filarmónica de Viena. Paralelamente estudou direção de orquestra com Georg Mark, em Viena, e com Nicolás Pasquet, no Conservatório Franz Liszt, em Weimar. No início da sua carreira, venceu prestigiosos concursos de direção, incluindo o Concurso Internacional de Cadaqués, o Concurso de Direção MDR (2013) e o Nestlé and Salzburg Festival Young Conductors Award (2015). Em 2017 recebeu o International Opera Newcomer Award. Foi Maestro Titular da Orquestra Gulbenkian entre 2018 e 2021, sendo atualmente Maestro Convidado Principal.
Programa
Johannes Brahms
Sinfonia n.º 3, em Fá maior, op. 90
- Allegro con brio
- Andante
- Poco allegretto
- Allegro