Gulbenkian Água

O valor da água no setor agroalimentar

O desenvolvimento económico, a urbanização, a poluição, a desflorestação e as alterações climáticas têm exercido enorme pressão sobre a disponibilidade de recursos naturais finitos, designadamente a água, colocando em risco não só a nossa saúde mas também a nossa capacidade de produção de bens e serviços essenciais, incluindo alimentos.

Para prevenir um cenário futuro de escassez de água, a Fundação Calouste Gulbenkian pretende atuar na promoção de uma utilização mais eficiente deste recurso junto de toda a cadeia de valor do setor agroalimentar – do campo de cultivo à mesa do consumidor.

© Daniel Espírito Santo

O uso da água em Portugal

Em Portugal, o setor agrícola é responsável por 75% do total de água utilizada, um número que contrasta com a média da União Europeia (24%) e chega a ser superior à média mundial (69%), estando no entanto alinhado com o de países mediterrânicos como a Espanha e a Grécia. Tal é explicado pela existência de regadio, em que a rega de culturas compensa o calor e a falta de chuva que caracterizam as estações quentes do ano.

Para aprofundar conhecimento sobre esta problemática, a Fundação Gulbenkian encomendou ao C-Lab o estudo “O Uso da Água em Portugal”, desenvolvido entre 2019 e 2020.

Principais conclusões do estudo

  • Portugal enfrenta risco de escassez de água já nos próximos 20 anos
  • Maioria dos agricultores não mede a água que gasta (71% não tem contador de água)
  • Água é, maioritariamente, retirada de furos, charcas, poços e outras estruturas privadas. Tem fraca expressão no total de despesas da atividade
  • Transição para uma agricultura mais sustentável do ponto de vista hídrico exige a adoção de novas tecnologias de rega e gestão de água. Caminho está a ser feito mas tem de continuar a ser incentivado: se a maioria (65%) dos agricultores já utiliza sistemas de rega localizada (gota-a-gota), a adoção de tecnologias mais avançadas para controlo de rega e gestão da água ainda só foi abraçada por uma minoria (30% utiliza sondas de apoio à rega, 23% utiliza estações meteorológicas, 37% utiliza programas de controlo de rega)
  • Apenas 3% dos agricultores incluem cenários de longo prazo e de sustentabilidade no planeamento da sua atividade
  • 81% dos agricultores que adotaram novas tecnologias não têm dúvidas de que poupam água. Poupanças abrangem também a energia ou os fertilizantes
  • 85% afirma não ter de cumprir nenhuma exigência em relação à água junto de clientes
  • Transformação do setor tem de chegar a todos, com o apoio de organizações de produtores, consultores especializados ou empresas do setor agroalimentar

Valorizar a água no setor agroalimentar

Fazer diferente e pensar a longo prazo é um desafio que compete a todos: agricultores, setor agrícola, indústria alimentar, grande distribuição e consumidor, que faz a escolha final.

O projeto Gulbenkian Água tem três áreas de atuação prioritárias:

  1. Acelerar a transformação do setor agroalimentar financiando iniciativas de demonstração de boas práticas e do conjunto alargado de vantagens resultantes de uma gestão mais eficiente da água.
    Em 2021 esteve aberto um concurso de apoio à demonstração na gestão da água da rega, dirigido a entidades do setor agrícola ou com conhecimento do mesmo. Os projetos apoiados foram implementados entre 2021 e 2023.
  2. Comunicar o tema do valor da água na alimentação e no setor agroalimentar, contribuindo para um debate alargado sobre a criticidade deste recurso para a sustentabilidade do setor, do sistema alimentar e do País.
    A sensibilização para uma cultura de consciência e respeito no uso da água tem de chegar até ao cidadão comum. Por ocasião do Dia Mundial da Água, a 22 de março de 2021, foi lançado um vídeo com mensagens-chave que resultaram do estudo e imagens recolhidas durante a investigação. Em parceria com a Ciência Viva, a Fundação participou na exposição “ÁGUA – Uma exposição sem filtro” (que terminou em setembro de 2022) e no concurso Hidrodinamic@s, que premeia e apoia ideias que contribuam para a resolução de problemas associados à utilização, consumo, preservação e escassez de água numa de três vertentes: ambiental, social e alimentar. A Fundação Calouste Gulbenkian é, ainda, um dos membros fundadores do Pacto para a Gestão da Água.
  3. Envolver continuamente diversos stakeholders, atuando como entidade agregadora e criando oportunidades de partilha e discussão conjunta.

Projetos de demonstração de boas práticas na gestão eficiente da água de rega

1.ª fase – Projetos apoiados 2021 – 2023

Promotor: Associação Nacional dos Produtores de Milho e Sorgo (ANPROMIS)
Parceiros: Associação Nacional de Produtores de Proteaginosas, Oleaginosas e Cereais (ANPOC), Centro Operativo e Tecnológico do Arroz (COTARROZ), Centro Operativo e Tecnológico de Regadio (COTR), Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA)
Cultura: milho, cereais praganosos e arroz
Regiões: Alentejo, Ribatejo e Vale do Mondego

Projeto que promoveu dez ações de capacitação e transferência de conhecimento para 500 agricultores, entre março e julho de 2021. Além disso, incluiu um inquérito para aferição do perfil dos formandos para delinear, de forma mais personalizada, estratégias futuras para uma gestão mais eficiente da água de rega. No âmbito deste projeto, foi ainda elaborado um vídeo didático de boas práticas no uso eficiente deste recurso para alcançar um universo de 6500 agricultores.

Promotor: Centro Operativo Tecnológico Hortofrutícola Nacional - Centro de Competências
Parceiros: Torriba, Campotec, Hidrosoph, Federação Nacional das Organizações de Produtores de Frutas e Hortícolas
Cultura: Maçã, pera e tomate de indústria
Regiões: Vale do Tejo e Oeste

Projeto focado na implementação de pilotos demonstrativos em explorações agrícolas equipadas com soluções otimizadas de monitorização de água no solo. Estes pilotos dirigiram-se a 25 agricultores de três perfis distintos (mentores, seguidores e condicionados), a fim de traçar itinerários técnicos para a adoção de tecnologia de rega eficiente com base nas necessidades identificadas em cada perfil. O projeto incluiu ainda ações de capacitação e demonstração (workshops e eventos de networking), intercâmbios internacionais e produção de conteúdos multimédia.

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Promotor: Comissão Vitivinicola Regional Alentejana
Parceiros: Instituto Superior de Agronomia (ISA), Centro Operativo e de Tecnologia de Regadio (COTR), Centro de Estudos e Promoção do Azeite do Alentejo
Cultura: Vinha e olival
Região: Alentejo

Este projeto incluiu seis ações de demonstração das melhores práticas para mais de 30 agricultores, em contexto de campo, sobre a gestão integrada e sustentável dos recursos (água, energia e fertilizantes), em parcelas-tipo, com culturas da vinha e olival em plena produção e diferentes níveis de adoção de inovação. No âmbito do projeto foi ainda produzido um vídeo promocional e um manual gratuito de boas práticas de rega para vinha e olival. Simultaneamente, foi desenvolvido um sistema regional de avisos de rega.

Foram ainda realizados eventos de troca de conhecimento para um grupo mais alargado de agricultores (mais de 80).

Promotor: Associação para o Desenvolvimento da Viticultura Duriense
Parceiros: Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro - Real Companhia Velha, Sociedade Vitivinícola Terras de Valdigem, Sogrape Vinhos, Symington Family Estates
Cultura: Vinha
Regiões: Douro

Projeto que incluiu ações de demonstração para 100 agricultores em quatro quintas-piloto, complementadas com a produção de um manual de boas práticas de rega, material audiovisual com participação dos agricultores mentores responsáveis pela organização das visitas técnicas e com o desenvolvimento de atividades de intercâmbio e transferência de conhecimento para um universo de 200 a 250 viticultores.

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Promotor: Escola Superior Agrária de Santarém (Instituto Politécnico de Santarém)
Parceiros: Terrapro, Associação de Agricultores do Ribatejo, Azeitonices, Casa Relvas
Cultura: Olival
Regiões: Alentejo e Ribatejo

Projeto que consistiu no desenvolvimento de ações de demonstração para grupos de 15 a 25 agricultores em campo demonstrador, efetuadas em três alturas distintas do ciclo cultural, a fim de potenciar a discussão de perspetivas entre produtores em diversos estados de maturação de conhecimento.

Durante o projeto, nos campos de dois produtores “trainees, em diferentes estádios de utilização e implementação de tecnologias de gestão da água, foram instaladas novas tecnologias como forma de demonstrar, junto de outros produtores, o impacto dessas práticas ao longo de uma campanha e perceber, do ponto de vista prático, os desafios e oportunidades trazidos pela implementação destas tecnologias. Foram ainda desenvolvidos recursos pedagógicos como vídeos, folhetos e cursos online abertos.

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O documentário “Água e agricultura: um caminho de transformação” parte dos projetos apoiados na primeira fase para dar a conhecer um setor em transformação e com vontade de construir um futuro mais sustentável para todos.

2.ª fase – Projeto apoiado 2023 – 2024

Projeto de demonstração de boas práticas na gestão eficiente da água de rega, criado a partir da experiência e conhecimento das equipas de dois dos projetos apoiados na 1.ª fase - H2OptiDemo e H2Oliva.

O objetivo é a transferência de conhecimento e a capacitação dos agricultores no âmbito da gestão integrada dos recursos, com maior ênfase na água, através da aplicação de uma metodologia de aprender-a-fazer. Para tal, serão utilizados campos de demonstração (mentores) onde estão implementadas práticas de gestão de rega: rega deficitária no olival, rega enterrada em pomares e novas fontes de água em culturas perenes e produtores adicionais (trainees), com diferentes graus de maturação tecnológica, para demonstrar a facilidade e viabilidade das diferentes práticas e tecnologias de apoio à decisão. Dando seguimento aos trabalhos realizados nos projetos anteriores, existe um objetivo transversal de potenciar o trabalho já realizado e a monitorização realizada anteriormente, no sentindo de melhorar a utilização dos equipamentos já instalados extraindo mais informação dos mesmos para ser comunicada, mas também apoiar uma tomada de decisão mais rápida por parte do agricultor e medir o impacto dessas decisões.

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