Melhorar a saúde materna na Guiné-Bissau

Na Guiné-Bissau, a mortalidade materna é das mais elevadas de África e do mundo, segundo dados da UNICEF e da OMS.
03 nov 2016

Vasco Na Dum é médico e trabalha na área de Ginecologia e Obstetrícia em Bissau, no Hospital Simão Mendes, o hospital nacional de referência. Na Guiné-Bissau, a mortalidade materna é das mais elevadas de África e do mundo, segundo dados da UNICEF e da OMS que referem as complicações durante a gravidez, ao dar à luz e no pós-parto como as principais causas de morte em mulheres na idade reprodutiva.

Vasco Na Dum está desde setembro no Hospital de Nossa Senhora da Oliveira, em Guimarães. Ele é um dos dez bolseiros colocados até final do ano em diversos hospitais portugueses, no âmbito do concurso de estágios de curta duração para profissionais de saúde dos PALOP e Timor-Leste, promovido pela Fundação Calouste Gulbenkian. No mesmo hospital, estão ainda o anestesista Quintino Badam e Alexandrina Moura, enfermeira da área de Ginecologia e Obstetrícia, provenientes do Hospital de Cumura, também na Guiné-Bissau. São todos beneficiários da 6.ª edição deste concurso de estágios, que já permitiu que 99 técnicos de saúde estivessem em Portugal a aperfeiçoar técnicas e a aprofundar conhecimentos dentro da sua área de especialidade.

Saúde materna na Guiné-Bissau

Vasco Na Dum nasceu na região sul de Tombali, Cadique, e aí viveu até ir para o liceu em Bissau e depois para a Faculdade de Medicina. Com a guerra civil (em 1998), partiu para Cuba, onde terminou a formação geral de Medicina. No regresso à Guiné trabalhou durante cinco anos como médico em Tite, na região de Quinara, cerca de 300 quilómetros a sudeste de Bissau.

Atualmente, Vasco trabalha na maternidade do Hospital Simão Mendes e quer, com este estágio, aprofundar os conhecimentos no diagnóstico e no tratamento das anomalias e em situações de patologia materno-fetal no trabalho de parto. Conta que as guineenses quando vão ao hospital, “já estão com 24/28 semanas, às vezes 30 ou 32, de gravidez, e só vão muitas vezes para levantar o cartão de grávida”. Os hábitos arreigados levam-nas a ir uma vez e a não voltar, tentando fazer o parto em casa. “Se corre bem, tudo bem, mas se há complicações, vão para o centro de saúde.” A situação piora quando tentam transferi-las para o hospital: há “casos de rutura uterina, feto morto e muitas outras complicações”. Aí, refere o médico guineense, ainda têm de contar com problemas como a falta de sangue para transfusões. Vasco diz que apesar das limitações, não há falta de atenção ou descuido dos médicos, “os pacientes é que chegam tarde de mais”.

A formação nesta área é fundamental, envolvendo outros profissionais de saúde, como os enfermeiros, em que se inclui Alexandrina Moura. Para fazer face à situação que se vive na saúde materna, é preciso envolver toda a gente, refere a diretora clínica do Hospital de Guimarães, Maria José Costeira: “O trabalho de enfermagem é fulcral, os médicos são necessários para as situações mais diferenciadas, mas o trivial é abordado pela enfermagem.”

Apesar das dificuldades que sabe que vai encontrar quando regressar a Bissau e da realidade do hospital português ser bastante diferente daquela, Vasco Na Dum mostra-se confiante. “Vou tentar fazer o máximo que puder e implementar o mais possível as boas práticas que estou a aprender aqui, mas não posso fazer tudo. Há coisas que fazem aqui que não podemos fazer lá.” Por agora, fica o gosto pela experiência e pelo acolhimento recebidos: “São todos muito atenciosos e respondem a todas as minhas perguntas”, diz, com um sorriso de quem se sente em casa.

Orientar para melhor formar

José Manuel Furtado, médico ginecologista e obstetra do Hospital de Guimarães, é o responsável pela orientação do estágio de Vasco Na Dum. Pelas missões que tem realizado na Guiné conhece bem a realidade sanitária do país e tem acompanhado médicos e profissionais de saúde em idêntica situação, em edições anteriores deste projeto de estágios. Lembra que os médicos que chegam não são especializados: “São médicos de clínica geral que começam a trabalhar logo após o curso e que vão para determinada área por opção ou porque são lá colocados por necessidade. Trabalham em áreas da especialidade para a qual não estão preparados. Aprendem o que outros ensinam ou por tentativa e erro.”

Entusiasta deste tipo de cooperação, José Manuel Furtado não se poupa a esforços para acompanhar os estagiários, defendendo que esta formação lhes permite que sintam necessidade de outro tipo de aprendizagens. Está ciente das dificuldades que têm nos terrenos onde trabalham e sabe que os conhecimentos que, juntamente com a sua equipa no hospital, lhes transmite não podem ser copiados diretamente para a Guiné-Bissau. “Trata-se de adaptar o que aprende cá à sua realidade. É uma mais-valia estar aqui. Podem fomentar uma medicina completamente diferente e combater os indicadores maus que a Guiné tem.” Da experiência de estágio refere que nascem “laços com os serviços e com os profissionais que podem perdurar” e conta que são muitas vezes contactados para discussão de técnicas e protocolos.

O acolhimento de bolseiros no âmbito deste concurso da Fundação Calouste Gulbenkian, de estágios para profissionais dos PALOP, é apenas uma componente da internacionalização do hospital que, segundo o presidente do Conselho de Administração, Delfim Rodrigues, faz parte do seu dever de cooperação. “Entendemos que as parcerias com os países africanos são uma forma de confrontar os nossos profissionais com diferentes formas de trabalhar, com diferentes culturas, tornando-os mais ricos do ponto de vista técnico e humano e consequentemente mais aptos na resposta aos nossos doentes.” O hospital tem uma rede de parcerias com várias instituições portuguesas e há mais de duas décadas que colabora regularmente na formação de profissionais de saúde dos países africanos de língua portuguesa.

 

https://youtu.be/tz3w1bJqzY8

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