Egito: a longínqua terra próxima
Sarah Nagaty
50% – menores de 30 anos e maiores de 65 anos
Entrada gratuita – domingos a partir das 14:00 / Estudantes às sextas e sábados a partir das 18:00
Faraós Superstars desenvolve-se em torno da figura do faraó e do lugar que este tem ocupado no nosso imaginário coletivo ao longo de 5000 anos, da Antiguidade aos dias de hoje.
Uma dupla celebração está na sua origem: os 100 anos da descoberta do túmulo de Tutankhamon, no Vale dos Reis, pelo egiptólogo britânico Howard Carter e os 200 anos da decifração dos hieróglifos, por Jean-François Champollion.
A exposição reúne cerca de 250 obras de importantes coleções europeias, entre antiguidades egípcias, iluminuras medievais, pinturas clássicas, documentos, obras históricas, mas também vídeos, música pop, bens de consumo e publicidade do nosso tempo.
Este conjunto tão variado de obras convida a uma reflexão sobre a popularidade destas personagens históricas, e por vezes míticas. Porque são alguns faraós autênticas celebridades, enquanto a memória de outros se perdeu ao longo do tempo?
A natureza efémera desta popularidade, nem sempre associada ao reconhecimento histórico, é outro tema explorado nesta exposição. Khufu (Quéops, em grego), Nefertiti, Tutankhamon, Ramsés e Cleópatra continuam a ser nomes reconhecidos milhares de anos após a sua morte. Mas, atualmente, quem se lembra de Teti, de Senuseret ou de Nectanebo?
O público poderá cruzar-se com obras únicas vindas das coleções do British Museum (Londres), do Museu do Louvre (Paris), do Museo Egizio (Turim), do Ashmolean Museum (Oxford), do Musée d’Orsay (Paris), do Mucem – Musée des Civilisations de l’Europe et de la Méditerranée (Marselha), da Biblioteca Nacional de Portugal (Lisboa), do Museu da Farmácia (Lisboa), entre outras.
Em foco estarão também peças do núcleo de arte egípcia do Museu Gulbenkian, ponto de partida para uma reflexão sobre a relação que Calouste Gulbenkian estabeleceu com Howard Carter, conselheiro para a maioria das suas aquisições.
Pequenos e adultos podem explorar a exposição de um modo divertido e criativo através do jogo A Cartela do Faraó.
Poderá também encontrar várias estações táteis ao longo da exposição e todos os textos sobre as obras em formato ampliado no nosso website. Os vídeos pedagógicos, bem como as visitas orientadas, têm interpretação em Língua Gestual Portuguesa.
A exposição Calouste Gulbenkian e o Egipto, no Átrio da Biblioteca de Arte, revela mais detalhes sobre interesse do colecionador pelo Antigo Egito, as obras que adquiriu e a relação que estabeleceu com Howard Carter, seu conselheiro em algumas das suas aquisições.
Descarregue a Aplicação Museu Gulbenkian para a aceder ao audioguia gratuito.
As fontes antigas dão amplo testemunho da popularidade póstuma de alguns faraós, frequentemente de âmbito muito local e por vezes sustentada ao longo de vários séculos ou até milénios. Para os antigos egípcios, um indivíduo sobrevivia no Além enquanto o seu nome fosse escrito e pronunciado, e as suas imagens preservadas, no mundo dos vivos. Assim, cada soberano preparava o seu próprio culto funerário, mandando erigir templos e estátuas com os seus nomes inscritos em cartelas oblongas, e procurando também conquistar o favor dos seus predecessores divinizados. Devia, sobretudo, agir de modo visível pelo bem da comunidade e suscitar a estima dos seus súbditos, mesmo após a morte. Contudo, nem todos os faraós cuja fama chegou até aos nossos dias se revelaram, na altura, os mais merecedores nesses domínios.
A missão do faraó era zelar pela manutenção da ordem perfeita do mundo, estabelecida no momento da sua criação. Para tanto, o soberano devia combater as forças da desordem, procurando, em particular, ampliar ou consolidar as fronteiras do país contra as ambições dos povos vizinhos. O controlo dos territórios adjacentes assegurava o influxo de riqueza que permitia ao faraó alimentar o seu povo e construir templos bem providos de oferendas, estátuas e mobiliário precioso. Entre os faraós, aqueles que se destacaram como guerreiros e construtores foram também os que gozaram de uma mais longa posteridade até ao final da era faraónica, como Senuseret I, Senuseret III, Tutmés III e Ramsés II.
Os monumentos reais – templos, pirâmides e colossos – marcaram de modo duradouro a paisagem extremamente plana do vale do Nilo, dominando o horizonte quotidiano de inúmeras gerações, as quais mantinham viva a memória dos faraós que os erigiram. As estátuas colossais que permaneceram à vista dos fiéis, ao contrário das efígies divinas escondidas nos templos, eram objeto de culto e desempenhavam um papel importante na preservação da memória dos reis representados. Seguindo o exemplo dos seus antecessores, Ramsés II compreendeu bem este facto e tratou de assegurar a sua própria divinização.
A monarquia faraónica era tida como eterna e ininterrupta. Ao rei cabia, pois, mostrar-se como o digno herdeiro dos seus antecessores mais prestigiados, consagrando-lhes monumentos e inspirando-se nas suas imagens e títulos. O rei fomentava cultos memoriais, que envolviam o esforço de numerosos trabalhadores, mantendo assim uma ligação privilegiada com os seus antepassados reais, como se vê nos nomes que davam aos seus filhos.
Por terem reunificado o reino após mais de um século de divisão e construído ou restaurado numerosos monumentos, o rei Ahmés, a sua esposa Ahmés-Nefertari e o seu filho e sucessor Amen-hotep I, permaneceram na memória coletiva como os fundadores de uma época próspera. Em Tebas (Luxor), tornaram-se santos padroeiros, tanto para os assuntos do quotidiano como da vida no Além. As suas estátuas eram veneradas em capelas votivas e consultadas por oráculos durante os cortejos religiosos.
Os egípcios também procuraram erradicar a memória de certos faraós, excluindo-os das listas reais, suprimindo os seus nomes e destruindo as suas imagens. Foram assim eliminados os vestígios dos reinados, ou até da própria existência, desses reis incómodos. Tal foi o destino da mulher-faraó Hatchepsut, que criou um precedente perigoso para a transmissão masculina do poder, de Akhenaton e da sua esposa Nefertiti, que tentaram uma reforma radical da religião e do poder, e dos seus sucessores imediatos, como Tutankhamon.
A cristianização do Egito, no início da nossa era, assinalou o fim da civilização faraónica, cuja história mais recuada caiu progressivamente no esquecimento. Ao longo de mais de mil anos, desde a Idade Média até ao século XIX, a Europa e o mundo árabe retiveram apenas a memória dos faraós citados por Heródoto, Diodoro Sículo e Eliano, historiadores gregos ou latinos. Estes autores, bem como as tradições bíblicas e islâmicas, recolheram no Egito e na literatura mediterrânica uma imagem deformada dos reis antigos. Estas figuras inspiraram os artistas e os escritores das margens do Mediterrâneo, que as converteram tanto em modelos de bom comportamento político ou moral, como em exemplos a não ser seguidos.
Devido ao facto de terem mantido relações regulares com os gregos, os faraós dos séculos VII e VI a.C. são frequentemente citados na literatura clássica. Psametek I arregimentou mercenários gregos e Amásis concedeu vantagens substanciais aos mercadores do Mar Egeu. A partir do Renascimento, os artistas inspiraram-se nos textos helénicos que evocavam esses reinados, e em particular no episódio da conquista do trono por Amásis e nas histórias lendárias em torno de Psametek.
No Romance de Alexandre, ficção criada pelos sucessores de Alexandre Magno no Egito, sustenta-se que este não é filho do rei da Macedónia, mas sim de Nectanebo, o último faraó nascido em território egípcio. Versado em artes mágicas, e após fugir do seu reino invadido pelos persas, Nectanebo teria seduzido a rainha da Macedónia e concebido com ela o herói que, ao conquistar por sua vez o Egito, retomava de facto a sua legítima herança. Na esteira de Alexandre – figura popular nos mundos romano, bizantino e islâmico -, a memória deformada do último rei do Egito, antes da influência helénica, atravessou toda a Idade Média.
De Cleópatra, os historiadores romanos veicularam uma imagem de sedutora dissoluta e ambiciosa, que encarnava os perigosos encantos do Oriente. O seu suicídio lendário, por meio da mordedura de uma víbora, tornou-se um dos temas de eleição dos artistas cristãos, que viam no episódio a oportunidade de pintar a carne nua, tão censurada, mas também um gesto heroico. Em contrapartida, no mundo árabe clássico, Cleópatra era considerada uma rainha sábia, uma hábil administradora, determinada a defender o seu reino, e uma grande construtora de monumentos.
Procedente de narrativas egípcias tardias reinterpretadas pelos gregos, esta figura mítica, mais ou menos inspirada em diversos soberanos da história do Egito, combinava atributos dos faraós Senuseret I, Senuseret III e Ramsés II. Dele se dá a imagem de um conquistador temível, precursor de Alexandre e de Napoleão, e de um grande legislador e construtor: são-lhe atribuídos numerosos colossos com base em fontes historiográficas gregas e romanas. Na cultura erudita da época moderna, Sesóstris era o faraó de referência e o seu nome evocava de imediato o poder, a antiguidade e o exotismo do Antigo Egito.
Os reis egípcios mais frequentemente citados na Europa e no mundo islâmico, desde a Idade Média até aos nossos dias, são incontestavelmente aqueles que a Bíblia refere como «Faraó» e que o Alcorão designa como «Firaun». É um desses soberanos que dá ouvidos a José/Yussuf e que o eleva à posição de ministro, sendo assim considerado uma figura hospitaleira e benevolente, em particular entre os judeus da diáspora. É outro faraó que se opõe a Deus e ao seu enviado, Moisés, personificando a opressão arbitrária e a tirania impiedosa em todas as culturas que se referem ao Êxodo.
A partir de 1822, os egiptólogos começaram a compreender o significado dos hieróglifos e, progressivamente, os faraós foram resgatados do esquecimento. Os meios de comunicação e os museus, em plena ascensão no século XX, elevaram-nos ao estatuto de vedetas internacionais, pondo de lado as personagens da literatura antiga. Ramsés, Akhenaton, Nefertiti e Tutankhamon juntaram-se a Khufu e Cleópatra como heróis de novas narrativas populares que refletiam o nosso fascínio pelo Egito. Ao mesmo tempo, as suas imagens e os seus nomes serviram de base a definições identitárias, sobretudo entre os próprios egípcios.
Com a industrialização dos produtos de consumo e da publicidade, os faraós passaram também a ser utilizados para estimular a imaginação dos consumidores. A sua imagem foi assim disseminada numa variedade de meios: imprensa, filmes, fotografia, publicidade, bens de consumo, imagens populares e obras de arte.
À luz dos textos entretanto decifrados, Ramsés II, cujos feitos tinham sido desde há muito atribuídos ao lendário Sesóstris, passou a ser uma vez mais o faraó de referência. O seu nome tornou-se familiar nos círculos da egiptomania e do orientalismo de finais do século XIX, e disseminou-se a ideia de que seria ele o «Faraó» do Êxodo, o poderoso antagonista de Moisés e de Deus. Na década de 1960, a espetacular missão de salvamento dos seus templos de Abu Simbel foi o pretexto para a divulgação regular, na imprensa e na televisão, da sua imagem monumental.
A arqueologia do período entre 1880 e 1910 revelou ao mundo as figuras de Akhenaton e de sua esposa, Nefertiti, então apresentados como os criadores do monoteísmo. Os seus retratos também seduziram o Ocidente pela sua aparente modernidade. Em 1922, o arqueólogo britânico Howard Carter descobriu o túmulo de Tutankhamon, sucessor de Akhenaton, e o seu fabuloso tesouro. O acontecimento foi divulgado no mundo inteiro por meio da imprensa, da fotografia e do cinema, então em pleno desenvolvimento. A nova notoriedade desses soberanos esquecidos foi reforçada por exposições de estrondoso sucesso.
Com os movimentos nacionalistas, que precipitariam a saída do Egito do domínio britânico na década de 1920, os faraós passaram a ser promovidos a símbolos patrióticos. Ainda que o Islão continuasse a ser a principal referência, as figuras antigas permitiram aos egípcios transcender as identidades individuais e os particularismos locais. Tornaram-se então fontes de inspiração para as artes, referências para comparação política e até mesmo marcas e produtos comerciais destinados tanto aos turistas como aos próprios egípcios.
As revoluções tecnológicas permitiram multiplicar e difundir pelo mundo inteiro informações e algumas imagens estereotipadas dos grandes faraós. Estes tornaram-se ícones acessíveis a todos, simbolizando todos os aspetos que alimentam o nosso fascínio pelo Egito antigo: longevidade, personalização do poder, busca da imortalidade, materiais preciosos, referências bíblicas e mistérios. Os seus supostos vícios e virtudes inspiraram os escritores, enquanto a sua fama atraiu o público e persuadiu os consumidores.
A partir do século XX, vários pensadores que procuraram revalorizar a história dos povos africanos, manchada pelo tráfico de escravos e pelo colonialismo, defenderam a tese de que os faraós eram negros. Desde então, tanto em África como nas diásporas africanas, muitos criadores, celebridades do hip-hop, do rap e do rythm & blues, bem como cidadãos comuns, adotaram os ícones faraónicos para os converter em figuras tutelares da sua identidade negra e em símbolos do seu orgulho negro.
Embora a pirâmide de Khufu, com 147 metros de altura, tenha sido o monumento mais alto do mundo até à construção das catedrais na Idade Média, a verdade é que não subsistem imagens do faraó, à exceção de uma modesta estatueta de marfim com 7 cm de altura, que se encontra no Cairo.
À frente de um próspero império, Ramsés II fazia-se representar em pé de igualdade com as divindades egípcias. Em alguns monumentos é representado como faraó, a fazer oferendas a si próprio enquanto divindade.
Depois de um período de divisão interna do reino, Ahmés reunificou o Egito no século XVI a.C., expulsando os rivais, os Hicsos, que dominavam o norte do país. No Egito do século XX, que passou pela colonização e pelo imperialismo, este feito militar foi glorificado, nomeadamente pelo escritor Naguib Mahfouz.
Os sucessores do jovem faraó fizeram questão de destruir e também apoderar-se dos seus monumentos, substituindo o nome de Tutankhamon pelos seus próprios nomes nas inscrições existentes, de modo a apagar todos os vestígios do reinado daquele que era filho de Akhenaton, o faraó iconoclasta.
De acordo com uma lenda originada em Alexandria, o grande conquistador grego não era o verdadeiro filho do rei da Macedónia, mas sim de sua esposa e do faraó Nectanebo, que a seduziu fingindo ser um deus. Esta lenda é encontrada em muitos manuscritos medievais que relatam a vida de Alexandre.
… pelo menos, não no sentido que hoje damos à palavra: trata-se de uma imagem oficial e idealizada, representando um rosto geometricamente perfeito e simétrico, construído de acordo com o sistema de medição do Antigo Egito. Conhecem-se outras imagens da rainha em que esta é representada exatamente com as mesmas feições deformadas do seu marido, o faraó Akhenaton. Na realidade, a sua aparência continua a ser um mistério.
Foi este o nome com que, em 1779, o entomologista holandês Pieter Cramer classificou uma espécie de borboletas sul-americanas. Este termo, em latim, retoma o nome do lendário rei egípcio Sesóstris cujo nome era sinónimo de grandeza e majestade no século XVIII.
Em várias ocasiões, na Bíblia e no Alcorão, utiliza-se o título majestático egípcio «faraó» como nome próprio de diversos governantes egípcios não identificados, incluindo o faraó que perseguiu Moisés, símbolo da tirania e da impiedade, castigadas por Deus.
No Egito, o regime do presidente Gamal Abdel Nasser promoveu o orgulho nacional e a identidade egípcia, encorajando a utilização de nomes de faraós e rainhas famosos em produtos de fabrico egípcio.
Khufu reinou entre cerca de 2635 e 2605 a.C. e Cleópatra entre 51 e 30 a.C., cerca de 2600 anos mais tarde. Em 2022, passaram apenas 2052 anos desde a morte de Cleópatra. Estes números dão uma ideia da longevidade da civilização dos faraós, durante a qual perdurou a memória de grandes monarcas como Khufu.
Visitas orientadas: Faraós Superstars, celebridade e simbolismo
Com Carlos Carrilho e Filipa Santos, em português e em língua gestual portuguesa
Qua, 11, 25 jan; 08, 22 fev / 16:00
Sex, 06, 20 jan; 03, 17 e 24 fev / 16:00
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Visita e conversa com a convidada: Egito – a longínqua terra próxima
Com Sarah Nagaty, em inglês
Sex, 24 fev; 03 mar / 19:00
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Visita orientada: Faraós Superstars
Em português
Pré-escolar, 1º, 2º e 3º ciclos, secundário, profissional, superior, academias e universidades seniores
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Visita livre: Faraós Superstars
1º, 2º e 3º ciclos, secundário, profissional, superior, academias e universidades seniores
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Visita orientada: Faraós Superstars
Com Carlos Carrilho, Filipa Santos e Raquel Feliciano, em português, inglês e francês
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Visita livre: Faraós Superstars
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Faraós in Motion: workshop de animação stop motion
Com Fidel Évora e Maria Remédio, em português
Seg, 19, ter, 20 e qua, 21 dez 22 / 10:00
Poemas aos Faraós: workshop de spoken word e performance
Com Melissa Rodrigues e Nuno Piteira, em português
Sáb, 04 e 11 fev / 10:00
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Nascer e morrer no Antigo Egito
Com a egiptóloga Inês Torres, em português
Ter, 17 e 24, qua, 18 e 25 jan / 21:00
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Tutankhamun and Carter: Assessing the Impact of a Major Archaeological Find
Qui, 16 fev e sex, 17 fev
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Nas Terras dos Faraós. Representações do Antigo Egito no cinema
06 jan – 19 jan 2023 / Cinemateca Portuguesa
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Calouste Gulbenkian e o Egito
Átrio da Biblioteca de Arte
16 nov 22 – 06 mar 23
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Frédéric Mougenot – Palais des Beaux-Arts de Lille
João Carvalho Dias – Museu Calouste Gulbenkian