Porque são os machos de pato-real mais coloridos do que as fêmeas?
Um naturalista no Jardim Gulbenkian
As penas que revestem a cabeça e o pescoço dos machos de pato-real (Anas platyrhynchos), que parecem mudar de tom à medida que as olhamos de diferentes ângulos, chamam a atenção dos visitantes do Jardim Gulbenkian e de outros jardins. A cor desta plumagem é chamada de verde iridescente, mas o que a torna assim? Além dos pigmentos, “substâncias químicas que podemos encontrar em animais e plantas”, esta é uma cor estrutural que resulta “da refração da luz causada pela microestrutura da pena”, nota João Eduardo Rabaça, professor do Departamento de Biologia da Universidade de Évora, coordenador do LabOr – Laboratório de Ornitologia e autor do livro “As Aves do Jardim Gulbenkian”.
“Na prática, a refração funciona como um prisma que divide a luz em cores diversas: à medida que o ângulo de visão muda, a luz refratada torna-se visível e oferece uma visão cintilante.”
E na verdade, esta diferença dos machos em relação às fêmeas, muito menos coloridas, tem tudo a ver com estas últimas: acredita-se que serve para chamar a sua atenção, pois são elas que escolhem o parceiro. Os cientistas batizaram este processo de “seleção sexual”: “Na óptica de uma fêmea, um macho mais vistoso pode sugerir uma superior qualidade dos seus genes e, como tal, haverá uma vantagem reprodutiva na sua seleção”, indica.
Este contraste entre machos e fêmeas chama-se dimorfismo sexual. É comum entre muitas outras espécies de aves – sobretudo naquelas “em que o acasalamento é feito em cada época reprodutora”, adianta o investigador, que aponta a cauda dos pavões como “um exemplo especialmente expressivo”.
Em contrapartida, nos gansos e nos cisnes – que, tal como os patos-reais e outros patos, pertencem à família dos anatídeos – os machos são semelhantes às fêmeas. É que nessas espécies “o acasalamento é para a vida” e por isso “a pressão seletiva para a seleção sexual é muito menor”.
Já nos patos-reais, a ligação entre o casal é de curta duração, pois “termina quando a fêmea inicia a incubação dos ovos” – o que em Portugal acontece entre finais de fevereiro e o mês de março, depois da construção do ninho e da postura. Os machos não cuidam dos ovos nem, mais tarde, das crias. Ainda assim, têm um papel importante durante esta fase, pelo menos até ao fim da incubação: “Acompanham e guardam as fêmeas, permitindo que elas passem mais tempo a alimentarem-se.”
E porque têm as fêmeas desta espécie, tal como em muitos outros anatídeos, uma plumagem mais discreta? Como são elas que incubam os ovos e assumem a responsabilidade da dependência parental, uma plumagem que se confunda com o ambiente em redor vai protegê-las, e também às pequenas crias, face aos predadores. “Em termos simples, há vantagens em não “darem nas vistas”, resume João Eduardo Rabaça.
Um naturalista no Jardim Gulbenkian
Uma vez por mês, ao longo de um ano, a revista Wilder revelou algo a não perder no Jardim Gulbenkian e lançou-lhe um desafio: descobrir e fotografar ou desenhar cada descoberta. No ano seguinte, a partir da biodiversidade do jardim, e com a ajuda de especialistas, respondemos a vários “como e porquê” de aves, insetos, mamíferos, anfíbios e plantas.