Espólio Movimento de Renovação da Arte Religiosa
Em maio de 1953 inaugurou-se na Galeria de São Nicolau, em Lisboa, a Exposição de arquitetura religiosa contemporânea, organizada por um conjunto de jovens arquitetos e estudantes de arquitetura, ligado ao Movimento de Renovação da Arte Religiosa (MRAR): Henrique Albino, Nuno Teotónio Pereira, João Braula Reis, João Correia Rebelo, António de Freitas Leal, José Maia Santos e João Medeiros e Almeida.
Num desdobrável davam-se a conhecer aos visitantes os seus princípios motivadores: a exposição não se limitava a apresentar trabalhos, mas também a criticar o “panorama doloroso da nossa arquitectura, a inexistência no nosso meio de uma crítica competente” que tornavam urgente “uma acção de esclarecimento e uma revisão de conceitos”, para que a arquitetura religiosa nacional pudesse “mostrar ao mundo de hoje a verdadeira face da Igreja de Cristo”, abandonando modelos arquitetónicos que perpetuavam uma estética pretensamente tradicional e nacionalista, alheia aos princípios defendidos pelo Movimento Moderno.
Foram esta atitude crítica e esta vontade de renovação formal da produção arquitetónica e da arte sacra que, um ano antes, motivaram a fundação do Movimento de Renovação da Arte Religiosa por “uma comunidade católica de artistas e de outras pessoas interessadas, com o fim genérico de promover, em todos os domínios da arte religiosa, o encontro de uma verdadeira criação artística com as exigências do espírito cristão” (Estatutos, Artigo 1.º).
Na génese imediata do MRAR esteve a reação contra o anunciado projeto do arquiteto Vasco Regaleira para a igreja de São João de Brito, expressa através de um abaixo-assinado, onde se afirmava que esse projeto não se coadunava “nem com os tempos que correm nem com o ambiente geral do Bairro de Alvalade”.
Num contexto mais alargado, o MRAR foi, entre nós, a expressão de uma nova conceção teológica que começou a esboçar-se na Europa, sobretudo na Suíça e na Alemanha, nos anos seguintes ao final da I Guerra Mundial, que colocava a celebração da Missa no centro do culto cristão/católico, e que em termos da conceção arquitetónica colocava o altar como ponto central da organização espacial da planta das novas igrejas.
Desde 1952, e até sensivelmente ao final da década de 1960, quando começou a dissolver-se, o MRAR manteve uma ação dinâmica e interventiva, sobretudo formativa, editorial e expositiva, mais do que arquitetónica e artística, muito por causa dos constrangimentos políticos e económicos do país.
Ao longo deste período, foram seus membros ativos arquitetos como Nuno Teotónio Pereira (1922-2016), António de Freitas Leal (1927-2018), Nuno Portas (n. 1934), João Correia Rebelo (1923-2006), Diogo Lino Pimentel (1934-2019), Formosinho Sanches (1922-2004) e Luís Cunha (1933-2019); artistas plásticos como José Escada (1934-1980), Madalena Cabral (1922-2015), Eduardo Nery (1938-2013), Manuel Cargaleiro (n. 1927) e Jorge Vieira (1922-1998); historiadores da arte e conservadores como Flórido de Vasconcelos (n. 1920) e Maria José de Mendonça (1905-1984).
A Fundação Calouste Gulbenkian apoiou várias ações realizadas pelo MRAR, nomeadamente um “Curso de Arquitetura Sacra” (janeiro 1958) organizado no âmbito do concurso para a construção da igreja do Sagrado Coração de Jesus; a realização da Exposição de arte sacra moderna (1956 e 1960); o concurso do anteprojeto para a construção da Sé de Bragança e a apresentação em Portugal (1964) da exposição itinerante Novas igrejas na Alemanha.
Esta ligação reatou-se em março de 2007, quando um dos seus fundadores, o arquiteto Nuno Teotónio Pereira fez a doação à Biblioteca de Arte da Fundação Calouste Gulbenkian do seu espólio, a que se juntaram mais alguns documentos oferecidos pelos arquitetos António de Freitas Leal e Diogo Lino Pimentel.
O conjunto é constituído por 300 espécies documentais, distribuídas por 6 dossiês, fundamental para o estudo não só do MRAR, como da arquitetura moderna em Portugal. Um dos documentos que o integra é o folheto elaborado pelo arquiteto açoriano João Correia Rebelo, uma espécie de manifesto onde pela fotografia e pela palavra se mostrava a todos – desde o Senhor ministro, ao simples cidadão – no contexto das conceções estéticas da década de 1950, exemplos do que ele considerava ser boa e má arquitetura.
A Biblioteca de Arte, no âmbito da política que concilia a preservação e a disponibilização dos seus fundos documentais, procedeu à digitalização deste Espólio, cuja consulta, por questões relacionadas com direitos de autor e de personalidade, apenas pode ser realizada a partir da sua rede interna.
Obras da Biblioteca
Uma seleção de livros e revistas, fotografias, catálogos de exposições e outros documentos cujos temas se relacionam com a história da arte, as artes visuais modernas e contemporâneas, a arquitetura, a fotografia e o design portugueses.