Édi Ferreira
“Dar de volta às vezes não é dar diretamente à Fundação, mas ao mundo”
Édi Manuel da Silva Ferreira tem 22 anos e mora no Espinheiro, em Santarém. Desde pequeno que soube que “era mais de números”, o que o fez seguir a área de Economia no ensino secundário e optar pelo curso de Gestão na chegada à Faculdade. Foi numa cadeira de Introdução à Programação que encontrou a sua vocação: a Análise de Dados.
Além de trabalhar na OutSystems, onde é analista de dados sobre diferentes empresas, Édi foi voluntário no Data Science Knowledge Center da NOVA SBE, dedicando dois ou três dias por semana a recolher e analisar dados para ONGs. Terminou este ano o Mestrado em Finanças, com especialização em Análise de Dados, e sabe que é nesta área que quer construir a sua carreira, como Data Scientist.
Afirma que não é “uma pessoa inspiradora”, mas diz ter sido inspirado pela Bolsa Gulbenkian, e pelos encontros com outros bolseiros, a tornar-se uma pessoa mais dedicada às causas e a fazer a diferença no mundo.
É licenciado em Gestão e mestre em Finanças. Porque é que escolheu este percurso?
Desde pequenino que era mais números. Quando cheguei ao secundário tinha de escolher uma área e escolhi Economia, porque era a que estava mais chegada a números – e não queria nada com Físico-Química, basicamente. Entrei em Gestão, que era a minha primeira opção na universidade.
No segundo ano tive uma cadeira de Finanças de que gostei muito e pensei que esse seria o meu mestrado. No terceiro ano tive Introdução à Programação e adorei. Depois fiz um estágio na TAP, no fim do meu terceiro ano, em Corporate Finance. Gostei do estágio, mas não era aquele trabalho que queria fazer: demasiada incerteza, decisões baseadas no nada… Então pensei: vou para Finanças na mesma, mas com especialização em Análise de Dados. Terminei agora o mestrado.
Consegue explicar o tema da sua tese a alguém que não percebe nada da área?
As empresas têm recursos limitados para as necessidades delas. Neste caso, a necessidade era escolher quais é que são os clientes de valor, isto é, quais é que são os clientes que têm mais propensão para comprar o serviço delas, sem ter de ter dez mil vendedores a ir a todas as empresas.
O que fazemos é utilizar melhor os recursos que temos, ou seja, todos os dados que já temos do passado, que dão uma boa ideia de como são as empresas que contactam com eles agora, e basicamente reduzir essa lista de maneira a que os vendedores que as empresas já têm vão atrás das que têm mais propensão para comprar os seus produtos. Basicamente a minha tese é isto: usar análise de dados para criar este modelo.
Porquê esse interesse pela análise de dados?
Acho que foi mesmo porque via, através dos meus estudos em Gestão, que as coisas são muito baseadas na intuição humana, ou seja, as pessoas acham que em princípio é assim que acontece e aplicam. E os resultados vão ser sempre muito incertos. Quando podemos usar os dados das coisas que já aconteceram no passado, fazemos basicamente aquilo que as máquinas fazem: definir que aquilo que aconteceu no passado é muito possível que aconteça no futuro.
Então agora já tem uma noção do que quer ser “quando for grande”?
Na verdade eu já assinei contrato com a OutSystems, portanto vou ficar lá. Mas quando for grande quero mesmo estar nesta parte de análise de dados e ser Data Scientist. Neste momento sou só Data Analyst, mas o objetivo é passar para Scientist, que é um bocado mais esta parte de criação de modelos, e continuar ligado a isto de fazer com que as empresas passem a ser mais “data driven”, para as decisões serem tomadas com uma base mais sólida do que a intuição das pessoas.
De que forma é que a análise de dados pode ser um recurso positivo, além de permitir às empresas melhorar as suas vendas?
Eu acho que não tem de ser só orientado para o lucro. Neste momento, na OutSystems, trabalho com outras empresas, mas no futuro vejo-me mais focado na questão das pessoas, de entender o que acontece e porquê. Porque nós vemos os dados, mas depois temos de dar uma justificação plausível para eles. Essa justificação muitas vezes passa pelo comportamento das pessoas, e o desafio é arranjar maneira de explicar essa previsibilidade.
Quando estive no Centro de Dados [da NOVA SBE], por exemplo, estivemos a trabalhar num projeto para tornar uma lei mais acessível ao público. Continua a ser análise de dados, é a mesma coisa, mas em vez de servir para prever um comportamento, ajuda a tornar as coisas simples para o cidadão comum que precisa de ter acesso àquela informação. Por isso toda esta área de dados não é só para empresas grandes fazerem lucro, também pode ajudar outras organizações mais humanas e sem fins lucrativos.
Que diferença fez a Bolsa Gulbenkian na sua vida?
Acho que passou muito por conhecer pessoas melhores do que eu. Eu não sou uma pessoa muito inspiradora; mas sempre que ia a encontros da Rede de Bolseiros ouvia histórias de pessoas que eram realmente inspiradoras, que estavam a ter um impacto no mundo (mesmo que pequeno). E acho que isso foi um grande abre olhos para mim, de que vale mesmo a pena fazer qualquer coisa. Há pessoas com cinco projetos ao mesmo tempo, que são realmente dadas às causas e eu não sou, ou não era, nada assim. Agora sinto que sou um pouco mais assim por ver os outros a fazê-lo.
Como se sente por fazer parte desta rede de Bolseiros Gulbenkian?
Sinto-me muito bem, porque penso: pessoas muito boas entraram e eu também aqui estou. Eu não devo ser assim tão mau. [risos] É o dar e o receber. A bolsa, e a Gulbenkian, tentam sempre dar-nos alguma coisa – o apoio, as formações –, e depois passa por nós dar de volta, que às vezes não é dar diretamente à Fundação, mas dar ao mundo, que é o propósito da Fundação. É muito isso que eu sinto e por isso sou grato por a Gulbenkian ter apostado em mim.
Dos encontros e formações que foi tendo ao longo dos anos, há algum momento que o tenha marcado particularmente?
Adorei a formação de Mindfulness com o Vasco Gaspar. Foi um encontro de dois dias, um fim-de-semana todo, e foi onde tivemos mais contacto com os bolseiros. No fim parecia que eramos um grupo de amigos, que andávamos todos a estudar juntos há cinco anos, apesar de cada um estudar a sua área. (…) Eu não conhecia nada de Mindfulness, nunca fui um crente nessas coisas, mas depois saí de lá e percebi que acalma; não muda a pessoa mas muda a maneira de olhar para as coisas.
Onde se vê daqui a 10 anos?
Eu gosto muito de trabalhar com pessoas, portanto adoraria ter um trabalho que me permitisse trabalhar em contacto direto com elas. Com a Covid-19 tem sido estranho ter tão pouco contacto humano. No fundo, daqui a cinco ou 10 anos espero ter subido na carreira o suficiente para ter a minha própria equipa e tentar tratá-los bem, como a Gulbenkian me tratou a mim.
Histórias de Bolseiros
Desde 1955, a Fundação Gulbenkian apoiou mais de 30 mil pessoas de todas as áreas do saber, em Portugal e em mais de 100 países. Conheça as suas histórias.