Uma outra educação em Timor
Letícia Soares nunca sonhou ser nutricionista. Queria ajudar o seu país a melhorar os cuidados de saúde, mas este novo curso abriu-lhe novas possibilidades em Timor. Nutrição e Dietética, Farmácia, Ciências Biomédicas e Laboratoriais são áreas de ensino desenvolvidas no âmbito do projeto de Formação em Saúde (ForSa), gerido pela Fundação Gulbenkian.
Letícia Soares será uma das primeiras nutricionistas timorenses. A jovem finalista da primeira edição do curso de Nutrição e Dietética da Faculdade de Medicina e Ciências da Saúde de Timor, uma área desconhecida até agora mas que Letícia encarou como uma oportunidade para trabalhar em saúde. “Ao longo do curso, percebi que havia muita falta de profissionais na área e, por isso, quero ajudar a promover a saúde e o bem-estar das pessoas e contribuir para a prevenção e tratamento de doenças”, diz. Apesar da experiência adquirida, considera que para ser melhor profissional deve continuar a estudar. “Quero trabalhar em Nutrição clínica, ajudar os pacientes a tratarem-se por meio da alimentação”, assegura Letícia. Mas também não põe de parte a área do ensino, da formação e investigação científica.
Os novos cursos foram criados no âmbito do ForSa, um projeto que envolve a Fundação Calouste Gulbenkian, o Camões IP e a Universidade Nacional de Timor Lorosae, com o objetivo de melhorar as capacidades pedagógicas e organizativas da Faculdade de Medicina e Ciências da Saúde de Timor, nomeadamente na abertura de novas áreas identificadas como necessárias no país. Um enorme desafio, nas suas diversas vertentes, mas de que o responsável pela assistência técnica ao projeto, por parte da Fundação Gulbenkian, faz um balanço “extremamente positivo” já que a Faculdade está a formar os primeiros licenciados do país nestas áreas. Pedro Catarino salienta o facto de os cursos de Nutrição e Dietética e de Ciências Biomédicas e Laboratoriais serem os únicos que estão a formar profissionais destas áreas em Timor.
A realização do primeiro Dia Aberto na faculdade foi para o responsável um dos eventos mais marcantes do ano que agora terminou. Pedro Catarino diz que graças a esta atividade de extensão à comunidade, os alunos do ensino secundário puderam conhecer a oferta formativa. O Dia Aberto permitiu também o upgrade dos cursos de bacharelato para licenciatura que “tiveram uma elevada taxa de sucesso”.
Um dos cursos bem-sucedidos é o de Farmácia, que vai na segunda edição, e ao qual as autoridades timorenses atribuem grande relevância pela elevada escassez de recursos humanos. A futura farmacêutica Rosita Guterres não tem dúvidas em destacar como fundamentais a formação e a questão do controlo de qualidade dos medicamentos para Timor. A aluna considera que a formação na área é “muito importante para assegurar a eficácia e segurança dos medicamentos”. No fim do curso, quer trabalhar no apoio ao diagnóstico e na promoção do uso racional dos medicamentos.
Um ano em Timor
Pedro Catarino passou o ano de 2017 em Timor a assessorar tecnicamente a direção da Faculdade de Medicina e Ciências da Saúde, ao nível do funcionamento e organização dos novos cursos, mas também enquanto professor de bio farmácia e toxologia. Um desafio assente nas diferenças com a cultura ocidental, num país onde a língua portuguesa está longe de ser usada e praticada. Diz o professor que foi frequente “o recurso a uma linguagem básica em português, e uma redução da velocidade de fala, bem como o uso da língua inglesa, melhor percebida que o português”.
A organização estrutural da Universidade, as diferentes maneiras de trabalhar e o clima – temperaturas médias da ordem dos 30ºC. e humidade relativa de 90 por cento ou mais – são algumas das coisas que destaca de um país e de “um povo cuja bondade também marca a diferença”. E dá um exemplo referindo que, poucos dias depois de ter chegado ao país, estava à hora de almoço à porta da Universidade e um grupo de estudantes que não conhecia o convidou para almoçar. “Segundo eles parecia triste e cansado, por isso ofereceram-me almoço”, conta.
Pedro Catarino considera que esta está a ser uma experiência humana muito enriquecedora, referindo o facto de os timorenses mostrarem desapego pelos bens materiais e privilegiarem as relações familiares com os vivos e com os elementos familiares já falecidos. Uma verdadeira “lição de vida”.