Fernando Pessoa em Madrid
A 7 de fevereiro abre ao público a exposição Pessoa. Toda a Arte é uma Forma de Literatura no Museu Reína Sofia, em Madrid. Em coprodução com a Gulbenkian, esta mostra abordará o período artístico da modernidade portuguesa a partir dos princípios estéticos de Fernando Pessoa.
“Toda a arte é uma forma de literatura, porque toda a arte é dizer qualquer coisa”, assinava Álvaro de Campos em 1936 na revista Presença, uma das mais influentes revistas literárias portuguesas do século XX. Daqui parte o título da mostra que reúne mais de 160 obras de vários artistas como Almada Negreiros, Amadeo de Souza-Cardoso, Adriano Sousa Lopes, Mário Eloy, Júlio (Saul Dias), Sonia Delaunay, entre outros, numa abordagem das principais correntes estéticas portuguesas do século XX. Com a curadoria de João Fernandes, subdiretor do Museu Reina Sofia, e da historiadora de arte Ana Ara, a exposição conta com 56 obras do Museu Calouste Gulbenkian, numa coprodução entre as instituições espanhola e portuguesa.
Com Pessoa a ocupar a figura central da exposição, na qualidade de “motor intelectual” deste período, procura-se assim traçar uma ideia de vanguarda em Portugal. Para João Fernandes, entrevistado pela agência Lusa, “esta vanguarda portuguesa, que é de certa forma protagonizada por Fernando Pessoa”, é “extremamente interessante de apresentar e de interrogar”. Intérprete excecional da crise da identidade moderna e das suas (in)certezas, o poeta sempre se sentiu múltiplo, transferindo para o trabalho uma desorientação existencial incurável. Os seus mais de cem heterónimos incorporaram o que Pessoa identificou como a doença extrema do seu tempo: a busca da identidade na alteridade.
Partindo de três núcleos estéticos desenvolvidos pelo escritor – “Paulismo”, “Intersecionismo” e “Sensacionismo” -, a exposição “vai apresentar toda uma série de documentos, imagens e conceitos relacionados com a figura de Fernando Pessoa”, refere João Fernandes, incluindo textos e obras de pintura, desenho e fotografia das principais correntes estéticas portuguesas ao longo de mais de duas décadas (1914-1936). De entre estas obras, será também dada especial atenção às publicações desse período, como a pioneira Orpheu, A Águia, K4 Quadrado Azul, Portugal Futurista ou Presença, nas quais foram publicados textos de Pessoa, e que constituíram grandes influências estéticas e ideológicas sobre os artistas e intelectuais portugueses na primeira metade do século XX. O curador da mostra explicou à Lusa que “Fernando Pessoa contrapõe conceitos seus, vanguardas suas (…), aos modelos dominantes que chegavam de Paris, como o Cubismo ou o Futurismo”. Uma parte da exposição será ainda dedicada às artes cénicas, incorporando elementos relevantes sobre as produções mais interessantes da época em teatro e dança, como alguns trabalhos de Almada Negreiros.
As obras selecionadas refletem a inevitável influência das tendências predominantes na Europa, não esquecendo a especificidade da arte popular e portuguesa, que está claramente presente no trabalho de artistas portugueses que viajaram para Paris – caso de Amadeo de Souza-Cardoso – e no de estrangeiros que passaram por Portugal, como Sonia e Robert Delaunay. Segundo o subdiretor do museu madrileno, esta exposição é “uma outra forma de contar uma história da arte a partir de uma vanguarda periférica como a portuguesa que em Espanha é muito pouco conhecida”, e vai significar “uma grande revelação de todo este contexto da arte de vanguarda portuguesa”, servindo para “nos interrogarmos sobre o que foi a relação entre centro e a periferia, no princípio do século XX na definição das novas linguagens artísticas”. A última parte da exposição introduz o período relativo à “segunda modernidade portuguesa”, em que se destacam autores como Mário Eloy, Júlio e Sarah Affonso.
A exposição abre ao público a 7 de fevereiro de 2018 e encerra a 7 de maio. A Embaixada de Portugal em Espanha, em parceria com o ICEP e o Turismo de Portugal, irá ainda organizar atividades paralelas, como mesas-redondas e um ciclo de cinema.