Denis Mukwege

Prémio Calouste Gulbenkian 2015
20 jul 2015

O médico congolês que tem dedicado a sua vida a operar e reconstituir mulheres vítimas de violação e mutilação na República Democrática do Congo, é o vencedor do Prémio Calouste Gulbenkian 2015.

No valor de 250 mil euros, o Prémio foi entregue dia 20 de julho, no Anfiteatro ao Ar Livre, que acolheu mais de mil pessoas que prestaram uma justa e sentida homenagem à ação e coragem deste homem, que prossegue uma luta admirável pela defesa dos direitos da mulheres num país onde a violação e a mutilação sexual são utilizadas como arma de guerra.

Nascido em 1955,  Mukwege especializou-se no tratamento de mulheres violentadas pelas milícias armadas do seu país, sobretudo durante a guerra civil (1998-2003). O hospital que fundou em 1999, em Bukavu – The Panzi Hospital – tornou-se uma referência mundial na reparação e tratamento das lesões provocadas por este género de agressão, tendo, desde então, prestado apoio clínico, psicológico, social e jurídico a dezenas de milhares de mulheres.

Apesar de a guerra civil na República Democrática do Congo ter terminado em 2003, vários grupos armados lutam pelo controlo dos riquíssimos recursos naturais do país, criando um clima de guerra e de instabilidade, em que as mulheres se tornaram as principais vítimas. As violações são um instrumento de domínio através do terror e dão-se sistematicamente nas aldeias, com toda a comunidade a assistir. Normalmente, os agressores não ficam por aí, torturando e mutilando gravemente as mulheres. Muitas são queimadas com substância químicas ou alvejadas a tiro nos órgãos genitais. Esta estratégia, usada pelas milícias armadas,  com consequências devastadoras para as mulheres e para toda a comunidade, leva as pessoas a abandonar as aldeias, os seus campos e os seus bens.

Há alguns anos atrás, Mukwege escapou a uma tentativa de assassinato, após ter denunciado e condenado o uso da violência sexual nesta guerra motivada por interesses puramente económicos. Nessa altura abandonou país com a família, mas acabou por voltar, inspirado pela determinação das mulheres em lutar contra as atrocidades de que são vítimas.

Na cerimónia de entrega do prémio, Artur Santos Silva sublinhou a importância da ação de Denis Mukwege, “fundamental para o equilíbrio humanitário nesta zona do mundo”. O presidente da Fundação Gulbenkian destacou a coragem deste médico congolês que regressou ao seu país apesar das ameaças contra a sua vida e a da família, considerando-o um “verdadeiro exemplo para a humanidade”.

Jorge Sampaio, presidente do júri, destacou, por seu lado,  “o infatigável e corajoso desempenho” de Denis Mukwegw que o tornou  um “símbolo forte” da luta pelo ”reconhecimento da dignidade” e dos “direitos iguais e inalienáveis a todos os membros da família humana”. Defendendo a responsabilidade das organizações da sociedade civil e dos povos em “despertar a consciência da humanidade” afirmou “serem precisas pessoas como o premiado, que aliam “um extraordinário sentido de profissionalismo a uma poderosa exigência de humanismo” . São pessoas assim, afirmou, “que mostram o caminho ao liderar pelo exemplo, que nos inspiram e nos dão razões acrescidas para agir e confiar na nossa capacidade de construir um mundo em que todos os homens, todas as mulheres e todas as crianças possam aspirar à dignidade”.

Aplaudido de pé pelas cerca de mil pessoas que encheram o Anfiteatro ao Ar Livre Denis Mukwege agradeceu a distinção, explicando o modo como as violações são usadas como estratégia para criar um clima de instabilidade política e de insegurança, que abrem espaço à ocupação do território para a exploração ilegal das riquezas minerais do país. Perante uma plateia visivelmente emocionada, falou de um cenário de profundo horror, onde, para além das mulheres e crianças, já nem os bebés escapam.

Apelou à comunidade internacional para “usar todos os meios possíveis” para evitar estas atrocidades diárias, contribuindo para “transformar os minerais de sangue em minerais para o desenvolvimento e para a paz”.  Terminou destacando a importância deste prémio que quebrou o clima de indiferença geral, constituindo um gesto de solidariedade para com as mulheres congolesas.

Denis Mukwege, foi vencedor do Prémio Olof Palme em 2008 e do Prémio Sakharov em 2014, entre outros.

 

Prémio Gulbenkian

No valor de 250 mil euros o Prémio Calouste Gulbenkian é atribuído a uma instituição ou a uma pessoa, portuguesa ou estrangeira, que se tenha distinguido na defesa dos valores essenciais da condição humana. Foi atribuído pela primeira vez em 2012 à West-Eastern Divan Orchestra, a formação liderada por Daniel Barenboim, tendo nos anos seguintes, contemplado, respetivamente, a Biblioteca de Alexandria (2013) e a Comunidade de Santo Egídio (2014).

O Júri do Prémio Calouste Gulbenkian é constituído por Jorge Sampaio (Presidente), Vartan Gregorian (Carnegie Corporation, EUA), Comandante Pedro Pires (antigo Presidente da República de Cabo Verde), SAR Princesa Rym Ali da Jordânia (fundadora Jordan Media Institute), António Nóvoa (antigo reitor da  Universidade de Lisboa) e Mónica Bettencourt-Dias (investigadora Instituto Gulbenkian de Ciência).

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