Chalet Ficalho, em Cascais, é o vencedor do Prémio Vilalva
Mantém-se praticamente inalterado desde que foi mandado construir, em 1887, por António da Costa e Silva e sua mulher, Maria Josefa de Mello, para a filha, Helena Maria Luísa, a quem o médico havia recomendado “ares do mar”. Mais de cem anos depois, tem mais casas de banho (na altura só tinha uma), o sótão que fazia as delícias dos mais novos foi transformado em dois quartos, ganhou comodidades como o ar condicionado, um elevador ou uma piscina no jardim, tudo para poder receber hóspedes. Mas a ideia foi como que pôr em prática a máxima de Lampedusa, de que é necessário que algo mude, para que tudo fique na mesma. Assim, restaurou-se tudo o que se pôde, tentando manter (quase) tudo como quando os condes de Ficalho para lá iam passar o verão.
Construído há 136 anos, o Chalet Ficalho já viu de tudo um pouco – foi casa de veraneio (quando, no século XIX, Cascais se transforma numa estância balnear frequentada regularmente pela Família Real e pela Corte), foi deixado ao abandono aquando do exílio dos donos, no seguimento do regicídio, foi transformado em “casa dos avós” no pós-25 de abril, entrou para a Rota de Arquitetura de Veraneio de Cascais (é a 19ª de 36 paragens) e, por estar na mesma família desde 1887, não podia deixar de passar por um moroso processo de partilhas.
Chegado a 2023, o Chalet Ficalho, imóvel classificado pela autarquia, viu-se distinguido com o Prémio Gulbenkian Património – Maria Tereza e Vasco Vilalva, “pela importância patrimonial do edifício enquanto expoente de um estilo arquitetónico em grande parte já hoje destruído na maioria das zonas balneares do País, pelo caráter modelar do respeito pelas técnicas e materiais originais no projeto de recuperação e pelo equilíbrio exemplar entre a preservação do conjunto e a sua adequação à sua nova função como equipamento hoteleiro”, refere o Júri, composto por António Lamas (presidente), Gonçalo Byrne, Raquel Henriques da Silva, Rui Vieira Nery e Santiago Macias. Na sua apreciação, o Júri destaca ainda o facto de o edifício estar num pequeno parque com espécies arbóreas exóticas (o pai da condessa de Ficalho foi um dos fundadores do Jardim Botânico de Lisboa), recuperado com grande preocupação de fidelidade ao projeto paisagístico inicial.
A candidatura da recuperação do Chalet foi apresentada pelo Arquiteto Raúl Vieira (Gabinete de Arquitetura Artradi) e por Maria de Jesus da Câmara Chaves (dona da obra).
Nesta edição, foram ainda atribuídas duas menções honrosas:
Edifício das Águas Livres, Lisboa
A reabilitação e revisão dos espaços comuns e áreas de uso coletivo do Edifício das Águas Livres, em Lisboa (proposta pelo Condomínio das Águas Livres e pelo Arquiteto Rui Mendes, que trabalhou de perto com o arquiteto coautor Bartolomeu Costa Cabral), foi mencionada por ter conseguido “propor, em diferente contexto tecnológico, ambiental e regulamentar, o prolongamento do ciclo de vida do edifício, revertendo a natural erosão de elementos e materiais construtivos.” O Júri destacou também que, além do trabalho de “proteção e restauro” já executado, estão ainda em curso “processos de reabilitação e revisão de 5 novas frentes de trabalho necessário à manutenção do edifício e, por consequência, ao prolongamento da qualidade de vida dos seus moradores.”
Casas Nobres de João Pereira e Sousa, Lisboa
As Casas Nobres de João Pereira e Sousa, também em Lisboa (uma candidatura conjunta de Arquitetura e Azulejaria, proposta pelos ateliers Appleton e Domingos, Arquitectos, e Can Ran Arquitectura), distinguiram-se pelo “restauro do mobiliário de uma antiga mercearia”, “o restauro e valorização dos tetos de masseira ainda existentes, das portadas dos vãos e dos tabuões de alguns dos soalhos que assumem a passagem da história sobre eles, a eficácia das opções de «construção nova»” e “as soluções encontradas para valorizar os elementos azulejares existentes, incluindo a criação de painéis novos”.