Pensar o Acolhimento Residencial de Crianças e Jovens
Os resultados do projeto lançado pela Fundação em 2012, com o objetivo de contribuir para um maior conhecimento e discussão sobre os modelos socioeducativos ligados ao acolhimento residencial de crianças e jovens em risco, são apresentados nesta sessão sob a forma de livro, junto com reflexões, testemunhos e algumas recomendações sobre práticas e políticas a seguir.
O projeto
Em 2012, a Fundação Calouste Gulbenkian tomou a iniciativa de tornar visível uma área em que as necessidades e os desafios são muitos e de grande complexidade – o Acolhimento Residencial de Crianças e Jovens. As Casas de acolhimento devem ir muito além de dar “cama, mesa e roupa lavada”: a sua função é cuidar e proteger todos aqueles que acolhem, promovendo os Direitos da Criança no seu acompanhamento e educação, ajudando-os a traçar novos rumos para a vida quando a família não o consegue de todo fazer.
Pela sua natureza, o papel destas Casas exige um processo de permanente análise crítica, atualização de conhecimentos e (re) organização das práticas e das políticas públicas que a FCG potenciou ao apoiar, até 2016, um conjunto de projetos em diferentes regiões do país. Procurou-se reforçar as competências pessoais, sociais e emocionais das crianças e jovens, preparando-os para uma vida em autonomia, formar e capacitar as equipas técnicas e educativas das Casas que acolhem estas crianças e jovens; contribuindo, desta forma, para a produção de conhecimento científico e inovação que possa sustentar mudanças no sistema nacional de acolhimento através de melhores e mais eficazes práticas de intervenção.
O livro
O livro “Pensar o Acolhimento Residencial de Crianças e Jovens”, coordenado por Maria João Leote de Carvalho e Anabela Salgueiro, detalha diferentes perspetivas sobre o trabalho realizado pela Fundação nos últimos anos nesta área, dando voz às pessoas e organizações envolvidas. Tendo por enquadramento uma intervenção de Marta Santos Pais, Representante Especial do Secretário-geral das Nações Unidas sobre Violência contra a Criança, esta publicação inclui reflexões sobre aprendizagens, conquistas, desafios deste percurso, abordando as estratégias e metodologias seguidas e os mecanismos de supervisão e avaliação implementados, bem como os principais impactos e resultados alcançados.
As recomendações
No final, são apresentadas 28 recomendações que emanam de toda esta experiência. Focadas na necessidade de adoção de práticas mais eficazes e de “políticas públicas sustentadas no cumprimento efetivo dos Direitos da Criança” (Rec. 1), estas recomendações trazem para o debate público questões significativas sobre o funcionamento do acolhimento residencial estando organizadas em torno de 7 áreas interrelacionadas: matriz de governação nas políticas públicas para a infância e juventude; enquadramento normativo das respostas de acolhimento de crianças e jovens; um sistema de acolhimento centrado nas pessoas; organizações ativas e eficazes na proteção das crianças e jovens; o acolhimento residencial como ambiente de aprendizagem e produção de conhecimento científico; sustentabilidade financeira; e comunicação social como produtora dos Direitos da Criança.
De modo inovador, recomenda-se que “as crianças e os jovens que viveram em acolhimento residencial são peritos do sistema e sua experiência pessoal é significativa para a melhoria da qualidade da intervenção” (Rec. 5). Para isso, é fundamental a audição e participação de crianças e jovens ex-acolhidos nos processos de mudança do sistema nacional de acolhimento, numa linha similar ao registado noutros países e da qual a Declaração “10 Standards for care leavers”, Be The Change Program, FICE International (2016), apresentada nesta publicação, é um exemplo. Numa mesma linha, destaca-se como as Casas apoiadas pela FCG desenvolveram experiências inovadoras, que romperam com as respostas tradicionais do sistema na transição dos jovens para a comunidade, através da criação de “redes e estruturas de suporte social que garantam a saída segura do acolhimento” (Rec.21). Constituindo-se como centro de recursos das comunidades onde se inserem, num processo de abertura para o exterior, estas iniciativas valorizam o papel que crianças e jovens ex-acolhidos podem ter como recurso para a intervenção das equipas e profissionais, contribuindo, simultaneamente, para a sua plena inserção social.
Em articulação, uma recomendação básica, frequentemente subalternizada ou esquecida: “não se pode apoiar eficazmente as crianças e jovens em acolhimento se não se cuidar das pessoas que delas cuidam (cuidar de quem cuida)” (Rec. 15). Não se trata só de pensar no “reconhecimento e qualificação permanente dos profissionais do acolhimento” (Rec. 18) ou na criação de um “Código de Ética” (Rec. 7) como outros países já dispõem especificamente para esta área – duas recomendações que se defende devem constituir exigência do próprio sistema. Os adultos que trabalham em contexto de acolhimento têm de dar resposta diariamente a múltiplos desafios e constrangimentos, de especial complexidade e exigência técnicas, que os coloca entre as classes profissionais que estarão em maior risco de sofrer processos de burnout pelo que é decisiva a implementação de dispositivos que renovem e fortaleçam o seu potencial e confiança e, simultaneamente, esteja assegurada a existência de uma rede de suporte social e técnico em cada Casa, que pode ser interna ou envolver elementos e entidades externas. Cuidar de quem cuida é um princípio orientador fundamental para a melhoria da qualidade da intervenção no sistema. A esta constatação, associa-se a ideia chave de que “a supervisão é um imperativo para melhor qualidade da intervenção” (Rec. 19), sem a qual dificilmente se poderá falar de uma resposta de acolhimento de qualidade.
Pensar o Acolhimento de Crianças e Jovens
26 de junho, 14:45, Auditório 3, Fundação Calouste Gulbenkian
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