Luigi Nono: Como una ola de fuerza y luz
Orquestra Gulbenkian / Hannu Lintu / Marisol Montalvo

O percurso de Luigi Nono marcou as vanguardas musicais do pós-Segunda Guerra Mundial. Incentivado pelo maestro e professor Hermann Scherchen e o colega e amigo Bruno Maderna, Nono frequentou os Cursos Internacionais de Verão de Darmstadt, onde desenvolveu o fascínio pelo serialismo múltiplo e pela música eletroacústica. Paralelamente, o seu empenho em causas políticas enformou grande parte da sua obra. Militante do Partido Comunista Italiano a partir de 1952, Nono entendia a música como uma forma de participação política e de transformação da sociedade. Nessa tarefa, levou as práticas sonoras contemporâneas a novos públicos, a partir de concertos e colóquios organizados em locais de trabalho.
Como una ola de fuerza y luz foi escrita em 1971 e estreada no Teatro alla Scala de Milão a 28 de junho de 1972. Claudio Abbado dirigiu o pianista Maurizio Pollini, com quem Nono desenvolveu uma relação criativa próxima, o soprano Slavka Taskova e a Orquestra do Teatro alla Scala. A banda magnética foi produzida por Maurizio Zuccheri nos estúdios da RAI de Milão, sob supervisão do compositor. Essa parte da obra consiste em gravações da voz e do piano trabalhadas eletronicamente. Nessa altura, Nono encontrava-se especialmente interessado nos movimentos de esquerda da América Latina, sobretudo a jovem democracia chilena liderada por Salvador Allende. A morte, em circunstâncias duvidosas, do jovem militante do Movimento de Esquerda Revolucionária, Luciano Cruz Aguayo, marcou Nono, que usou o poema Luciano, do jornalista e escritor argentino Julio Huasi. O texto glorifica a força e energia de Luciano, apresentando-o como exemplo de empenho na transformação do mundo.
Como una ola de fuerza y luz começa com a sobreposição de clusters orquestrais que preparam a entrada solitária da voz em tom de imprecação e lamento; segue-se uma passagem que alterna o registo cantado e o falado. Gestos percussivos do piano aproveitam a ressonância natural do instrumento com recurso ao pedal, aos quais se junta a banda magnética apresentando a gravação do piano, eletronicamente modificado. Intervenções curtas e violentas da orquestra, focadas nos instrumentos graves de bocal e nos contrabaixos, interagem com os pianos. O diálogo entre pianista e orquestra toma primazia, cedendo lugar à interação entre solista e banda magnética, numa sucessão ascendente de clusters. A reentrada do soprano faz-se num registo lírico, acompanhado pelo piano e banda magnética. As curtas intervenções pontilhísticas evocam inflexões angulares do serialismo múltiplo associado a Darmstadt. O soprano regressa com a curta imprecação “Luciano!” e retira-se, deixando a condução à fita magnética. O regresso da orquestra num registo grave, misterioso e percussivo, com polifonia horizontal, reforça o estatismo. Após uma passagem protagonizada pelas cordas, harpas e clarinetes, a entrada do piano faz-se com pontuações da orquestra. O bombo lança uma figuração ascendente sublinhada pelas ressonâncias do piano, que desemboca numa secção que explora, simultaneamente, os registos extremos, aproximando-se ao limiar da audibilidade humana, com especial destaque para os flautins. Um breve interlúdio eletrónico antecipa um tutti ressoante, baseado em curtas e marcadas intervenções em cluster. O caráter de lamento regressa com a fita magnética, em que a voz gravada é sobreposta e transformada, como se um coro de carpideiras chorasse a morte de Luciano Cruz Aguayo.
Intérpretes
- Maestro
- Soprano
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Orquestra Gulbenkian
Em 1962 a Fundação Calouste Gulbenkian decidiu estabelecer um agrupamento orquestral permanente. No início constituído apenas por doze elementos, foi originalmente designado por Orquestra de Câmara Gulbenkian. Ao longo de sessenta anos de atividade, a Orquestra Gulbenkian (denominação adotada desde 1971) foi sendo progressivamente alargada, contando hoje com um efetivo de cerca de sessenta instrumentistas, que pode ser expandido de acordo com as exigências de cada programa. Esta constituição permite à Orquestra Gulbenkian interpretar um amplo repertório, do Barroco até à música contemporânea. Obras pertencentes ao repertório corrente das grandes formações sinfónicas podem também ser interpretadas pela Orquestra Gulbenkian em versões mais próximas dos efetivos orquestrais para que foram originalmente concebidas, no que respeita ao equilíbrio da respetiva arquitetura sonora.
Em cada temporada, a Orquestra Gulbenkian realiza uma série regular de concertos no Grande Auditório, em Lisboa, em cujo âmbito colabora com os maiores nomes do mundo da música, nomeadamente maestros e solistas. Atua também com regularidade noutros palcos nacionais, cumprindo desta forma uma significativa função descentralizadora. No plano internacional, a Orquestra Gulbenkian foi ampliando gradualmente a sua atividade, tendo efetuado digressões na Europa, na Ásia, em África e nas Américas. No plano discográfico, o nome da Orquestra Gulbenkian encontra-se associado às editoras Philips, Deutsche Grammophon, Hyperion, Teldec, Erato, Adès, Nimbus, Lyrinx, Naïve e Pentatone, entre outras, tendo esta sua atividade sido distinguida, desde muito cedo, com diversos prémios internacionais de grande prestígio. O finlandês Hannu Lintu é o Maestro Titular da Orquestra Gulbenkian, sucedendo a Lorenzo Viotti.
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Hannu Lintu
Maestro Titular
O maestro finlandês Hannu Lintu é o atual Maestro Titular da Orquestra Gulbenkian. Em paralelo, prossegue o seu trajeto como Maestro Principal da Ópera e Ballet Nacionais da Finlândia. Estas responsabilidades surgiram na sequência dos grandes sucessos obtidos na direção da Orquestra Gulbenkian, bem como na liderança de produções com a Ópera e Ballet Nacionais da Finlândia. Na temporada 2023/24, foi anunciada uma futura parceria artística com a Orquestra Sinfónica de Lahti, com início no outono de 2025.
Os compromissos do maestro em 2024/25 incluem a sua estreia no Festival de Bergenz (Oedipe de Enesco), bem como regressos à Sinfónica de Chicago, à Sinfónica da BBC, à Sinfónica da Rádio Finlandesa, à Filarmónica de Londres, à Sinfónica de St. Louis e à Sinfónica de Oregon.
Nos últimos anos dirigiu, entre outras orquestras, a Filarmónica de Nova Iorque, a Filarmónica de Berlim, a Orquestra de Cleveland, a Sinfónica da Rádio da Baviera, a Orquestra Nacional da Radio France, a Sinfónica de Boston, a Sinfónica da Rádio Sueca, a Deutsches Symphonie-Orchester Berlin, a Radio Filharmonisch Orkest, a Sinfónica de Atlanta, a Orquestra do Konzerthaus de Berlim, a Orquestra de Câmara de Lausanne e a Sinfónica de Montreal, bem como solistas como Gil Shaham, Kirill Gerstein, Daniil Trifonov ou Sergei Babayan.
Para além das grandes obras sinfónicas, dirige regularmente repertório de ópera. Neste domínio, os destaques recentes incluem O Navio Fantasma de Wagner, na Ópera de Paris, e Pelléas et Mélisande de Debussy, na Ópera Estadual da Baviera, bem como várias produções para a Ópera e Ballet Nacionais da Finlândia, incluindo o ciclo O Anel do Nibelungo de Wagner, Dialogues des Carmélites de Poulenc, Don Giovanni de Mozart, Turandot de Puccini, Salome de R. Strauss, Billy Budd de Britten, e uma versão coreografada da Messa da Requiem de Verdi.
Hannu Lintu gravou para as editoras Ondine, Bis, Naxos, Avie e Hyperion. Recebeu vários prémios, incluindo dois ICMA para os Concertos para Violino de Béla Bartók, com Christian Tetzlaff, e para a gravação de obras de Sibelius, com Anne Sofie von Otter. Estas duas gravações, bem como Kaivos, de E. Rautavaara e os Concertos para Violino de Sibelius e de T. Adès, com Augustin Hadelich e a Royal Liverpool Orchestra, foram nomeados para os prémios Gramophone e Grammy.
Hannu Lintu estudou violoncelo e piano na Academia Sibelius, em Helsínquia, instituição onde mais tarde se formou em direção de orquestra com Jorma Panula. Estudou também com Myung-Whun Chung na Accademia Musicale Chigiana, em Siena. Em 1994 venceu o Concurso Nórdico de Direção de Orquestra, em Bergen.
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Marisol Montalvo
Soprano
Dotada de uma voz extraordinariamente flexível, a americana Marisol Montalvo é uma das mais solicitadas intérpretes de música do século XX e contemporânea. Para além de colaborar com grandes orquestras e maestros de renome mundial, teve o privilégio de trabalhar com muitos dos principais compositores contemporâneos, incluindo Matthias Pintscher, Olga Neuwirth e Wolfgang Rihm. Alguns compuseram peças e personagens especialmente para ela, incluindo Peter Eötvos (Sierva Maria, em Love and Other Demons), Pascal Dusapin (Prothoe, em Penthesilea) e Marco Stroppa (Olbia em Re Orso). A sua afinidade com a música contemporânea proporcionou também colaborações regulares com o Klangforum Wien, o Ensemble Intercontemporain, o International Contemporary Ensemble, o Remix Ensemble e o Ensemble Modern.
Embora tenha alcançado sucesso num vasto repertório operático, Montalvo está particularmente associada ao papel principal de Lulu, de Alban Berg. Após a sua estreia na Ópera Nacional de Paris, o Le Monde descreveu a sua atuação como uma “verdadeira revelação”. Posteriormente, Lulu tornou-se a peça central do seu trabalho teatral; apresentou-a na Deutsche Oper Berlin, no Théâtre du Capitole de Toulouse, no Teatro de la Maestranza, no Theater an der Wien, na Komische Oper Berlin e no Theater Basel, entre outros palcos.
Montalvo desenvolve uma relação de trabalho particularmente próxima com o maestro Christoph Eschenbach, que tem sido seu mentor e parceiro regular de concertos. Desde a estreia no Carnegie Hall, com a Orquestra de Filadélfia, convidou-a para trabalhar com ele e com orquestras como a Filarmónica de Viena, a Sinfónica de Houston, a Filarmónica de Londres, a Filarmónica de Munique ou a Orquestra de Paris. Mais recentemente, Montalvo interpretou o papel de Sophie, numa versão de concerto de O Cavaleiro da Rosa, com Eschenbach e a National Symphony Orchestra, no Kennedy Center de Washington DC.Trabalhou também com maestros como Daniel Harding, Vladimir Jurowski, Christopher Hogwood, Yuri Temirkanov, Bernhard Kontarsky, Sylvain Camberling, Sussana Mälkki, Lothar Zagrosek ou Sir Neville Marriner, e com a Orquestra de Cleveland, a Filarmónica de Los Angeles, a Sinfónica de São Francisco, a Filarmónica de São Petersburgo, a Deutsches Symphonie-Orchester Berlin, a Sinfónica SWR, a Sinfónica da Rádio de Viena, a Sinfónica da Rádio Finlandesa e a Sinfónica de Bamberga, entre outras. Apresentou-se na Ópera de Zurique, no Festival de Bregenz, no Gran Teatro del Liceu de Barcelona, no Festival de Baden-Baden, no Teatro Real de Madrid, no Festival de Ópera de Glyndebourne, no Théâtre du Châtelet, no Grande Teatro de Genebra, na Ópera de Monte Carlo, na Ópera Nacional da Lituânia, na Ópera Nacional Polaca e na Opéra-Comique, entre outros prestigiados palcos.
Programa
Luigi Nono
Como una ola de fuerza y luz