Da Califórnia a Bangalore: colaboração internacional e multidisciplinar revela novos dados sobre a formação dos centríolos

Investigadores desvendam a dinâmica de como os centríolos se formam sem um molde
19 mai 2021

Investigadores desvendam a dinâmica de como os centríolos (estruturas essenciais ao bom funcionamento das células) se formam sem um molde, observando-os a uma resolução em 4D sem precedentes. Por trás da descoberta está uma fortuita colaboração internacional que abrangeu uma longitude notável: Estados Unidos, Portugal e Índia. As experiências descritas na revista The Journal of Cell Biology mostram como se orquestra a montagem de um centríolo sem molde, e revelam novos dados para compreender a sua complexa regulação molecular.

Os centrossomas são organelos celulares que contêm dois centríolos rodeados por uma matriz de proteínas. Durante a divisão celular, interagem com o material genético e ajudam a distribuí-lo de forma igual pelas células-filha. Anomalias neste processo originam instabilidade do genoma, que leva à formação de tumores, infertilidade e microcefalias. A função dos centrossomas requer que as células tenham sempre o número certo de centríolos e isto implica que eles sejam duplicados antes da divisão celular. Tipicamente, fazem-no seguindo o molde que é dado pelos centríolos maduros. Mas nem sempre é assim. Em algumas circunstâncias, os centríolos conseguem montar-se de novo, sem necessidade de um molde, escapando assim ao controlo apertado que as células fazem normalmente ao seu número.

Uma equipa internacional coliderada pelos investigadores principais do IGC Ivo Telley e Mónica Bettencourt-Dias propôs-se a compreender melhor como se formam os centríolos de novo, um processo do qual pouco se sabe. Este ocorre naturalmente em muitos organismos, como algumas plantas, abelhas ou ratinhos, e é possível que também aconteça extemporaneamente no cancro, acelerando a cancerigénese. “No nosso laboratório, há já muito tempo tínhamos percebido que era possível induzir a formação de centríolos de novo, manipulando uma proteína que descobrimos em 2005 chamada PLK4. Esta controla a formação normal dos centríolos e está desregulada no cancro. No entanto, não tínhamos a resolução para observar este processo ao vivo, o que era muito frustrante” diz Mónica Bettencourt-Dias.

© Ivo Telley, IGC 2021

Responder a estas perguntas foi possível graças a um design experimental inovador. Este consiste em extrair o interior do ovo da mosca da fruta, um organismo modelo amplamente usado em investigação, e pô-lo no microscópio. “No ovo não há centríolos, mas conseguimos dar início à sua formação quando adicionamos a proteína PLK4 em excesso. Dentro do ovo, isto ocorre a uma grande profundidade, o que coloca uma barreira à sua observação que só foi possível ultrapassar com esta técnica. Permitiu-nos, pela primeira vez, visualizar o início da formação dos centríolos e monitorizar a sua dinâmica ao longo do tempo com uma grande resolução no espaço”, revela Catarina Nabais, primeira autora do estudo.

“Quisemos observar em detalhe a dinâmica no espaço e no tempo da formação de centríolos para perceber como ocorre este processo e como as quantidades da proteína PLK4 ou outros fatores podem afetá-lo”, explica Ivo Telley. Num curso na Califórnia, Catarina Nabais conheceu Satajit Mayor, um investigador da Índia que usava uma nova forma de microscopia que permite medir quantidades ínfimas. Catarina passou parte do seu doutoramento em Bangalore a fazer medições e ali descobriu que os níveis da PLK4 nas nossas células são muito pequenos, permitindo um controlo fino do número de centrossomas. Um pequeno aumento é suficiente para se formarem vários centrossomas, algo que é observado no cancro. Recorrendo à modelação matemática com Delphine Pessoa e Jorge Carneiro do IGC, a equipa conseguiu ainda prever como diferentes concentrações da proteína PLK4 afetam a dinâmica da formação dos centríolos.

“Este estudo revela novos ângulos dos princípios que governam a montagem dos centríolos e a dinâmica de formação de organelos dentro das células, abrindo perspectivas importantes a considerar para compreender melhor a alteração deste fenómeno na cancerigénese”, expõe Mónica Bettencourt-Dias. “A Ciência progride através de colaborações entre equipas de cientistas multidisciplinares e esta história é um exemplo disso. Biologia, física e modelação matemática juntaram-se para resolver perguntas feitas há mais de um século atrás”, destaca o investigador Ivo Telley.

 

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