Como é mantida a distância entre os núcleos das células

Novo estudo revela duas componentes moleculares da mecânica de como o embrião da mosca da fruta posiciona os seus núcleos, sugerindo um papel crucial das forças de repulsão para definir o tamanho de uma célula.
23 nov 2021

O interior de uma célula é longe de estático. Redes densas de proteínas e estruturas celulares estão em constante movimento, respondendo ao ambiente que as rodeia. O núcleo, detentor da maior parte do material genético da célula, também se move. O seu posicionamento inadequado pode comprometer funções essenciais da célula e o desenvolvimento embrionário. Quando as células têm apenas um núcleo, o esqueleto celular liga-o à parte interior da membrana da célula e posiciona-o dentro da mesma. Mas, como acontece nas plantas e em alguns invertebrados, as células podem ter muitos núcleos e serem extremamente grandes, com membranas demasiado afastadas para o esqueleto desempenhar este papel sozinho. Nestes casos, as células recorrem a estratégias diferentes para posicionar os seus núcleos corretamente.

Os ovos das moscas da fruta são um exemplo de uma célula de grandes dimensões que contém muitos núcleos. Após a fertilização, os núcleos dentro do ovo proliferam intensamente, formando-se centenas destes organelos, que mais tarde são envolvidos em membranas e individualizados entre células diferentes. Durante este processo, o ovo precisa de disseminar informação posicional entre os núcleos e assegurar-se que todos estão na posição correta. Um número e posição adequados determinam o tamanho da célula e a precisão do desenvolvimento do embrião. Mas como consegue a célula salvaguardar a separação dos núcleos e impedi-los de colidir à medida que aumentam em número?

Um novo estudo publicado na revista The Journal of Cell Biology revela duas proteínas necessárias para manter os núcleos afastados no embrião multinucleado da mosca da fruta. “Quando o embrião da mosca da fruta produz as células que vão dar origem ao corpo do animal adulto, estas têm de ser todas do mesmo tamanho. Descobrimos agora que os microtúbulos reticulados, uma componente do esqueleto da célula, formam uma ligação rígida e medeiam a repulsão mecânica entre os núcleos durante o processo. Se os núcleos não estão distribuídos uniformemente, o embrião não vai conseguir formar células de tamanhos equivalentes e isso afeta o desenvolvimento mais tarde”, explica Ivo Telley, investigador principal do IGC e líder da equipa que conduziu o estudo.

Com uma abordagem que cruza áreas científicas diversas, incluindo a engenharia, a genética, a biologia molecular, a bioquímica e a microscopia ótica, a equipa descobriu que diminuir a quantidade de duas proteínas, uma responsável por ligar os microtúbulos e outra que estabiliza esta ligação, leva a distâncias irregulares entre núcleos, que se aglomeram ou chegam a desaparecer. “As nossas primeiras experiências foram imediatamente promissoras, e levaram-nos a conseguir mostrar que estas proteínas são necessárias para posicionar corretamente os núcleos. Também recorremos a técnicas de bioquímica de proteínas para purificar uma versão da proteína que liga os microtúbulos que torna estas ligações mais ‘moles’, e injetámo-la no embrião ou em explantes”, destaca Ojas Deshpande, primeiro autor do estudo. Os explantes de embriões foram uma novidade técnica essencial para poder visualizar estes fenómenos. Foram feitos através da extração do citoplasma e núcleos do embrião, que são colocados numa superfície onde podem ser facilmente acessíveis e manipulados. “Esta abordagem permitiu-nos manipular os núcleos diretamente, por exemplo mudando a sua posição relativa”, afirma Ivo.

Núcleos que se dividem todos ao mesmo tempo vão inevitavelmente produzir trajetórias de colisão. Controlar a proximidade entre estes organelos dá ao embrião a possibilidade de dividir centenas de núcleos de forma sincronizada e distribuí-los por qualquer posição inocupada. Este estudo demonstra agora o mecanismo molecular pelo qual conseguem responder a distâncias curtas entre núcleos usando forças de repulsão. “A próxima pergunta prende-se com perceber quais as mecânicas que mantém os núcleos afastados a uma distância precisa. No nosso artigo discutimos como os microtúbulos e as duas proteínas que desvendámos podem definir distâncias, mas isto ainda é preciso testar diretamente, possivelmente recorrendo a abordagens bioquímicas. A forma como as moléculas conseguem definir uma medida de distância que é relevante para a célula é um campo de investigação muito interessante”, conclui Ivo.

Este estudo foi desenvolvido no Instituto Gulbenkian de Ciência e contou com o apoio de uma bolsa EU FP7 Marie Curie CIG, uma bolsa FCT PhD SFRH/BD/52174/2013, Human Frontiers Science Program YIG e financiamento IGC.

 

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