Exposição de figurinos, cenário e cortina desenhados por Pablo Picasso para o bailado O Chapéu de Três Bicos, organizada pelo Musée des Beaux-Arts de Lyon. Depois de ser apresentada neste museu, no Museo Picasso de Barcelona e na Fundación Juan March, em Madrid, a exposição inaugurou, a 1 de setembro de 1993, na Galeria do piso 1 do Centro de Arte Moderna (CAM) da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG).

Realizada no âmbito dos Encontros ACARTE 93, foi inserida num programa de exposições com temas relacionados com as artes do espetáculo, e teve grande importância por apresentar a obra de Pablo Picasso, artista que, embora célebre mundialmente, não tinha tido ainda uma exposição de grande visibilidade em Lisboa. No entanto, anteriormente, de 14 a 21 de janeiro de 1993, foi apresentado na Sala Polivalente do CAM um ciclo de filmes sobre a vida e a obra do pintor, intitulado Imagens de Picasso, com a organização do Serviço de Animação, Criação Artística e Educação pela Arte (ACARTE), em colaboração com o Centre Georges Pompidou.

«Picasso. O Chapéu de Três Bicos» foi uma mostra criada em Lyon em 1992, no âmbito da Bienal de Dança, sob o comissariado de Brigitte Léal, conservadora do Musée Picasso de Paris, e com o apoio deste museu na cedência de um grande número de obras. A exposição foi dedicada a René Jullian, conservador do Musée des Beaux-Arts de Lyon, responsável pela organização de duas importantes exposições de Picasso nesse museu.

O Chapéu de Três Bicos foi um bailado escrito pelo compositor Manuel de Falla e coreografado por Léonide Massine, para o qual Pablo Picasso foi convidado a executar a cortina, o cenário e os figurinos. A sua estreia deu-se a 22 de julho de 1919, no Alhambra Theatre, em Londres, depois de três longos anos de produção artística, mais tempo do que qualquer anterior criação dos Ballets Russes.

Para este bailado, Massine, Falla e Picasso adaptaram o conto original de Pedro Antonio de Alarcón intitulado El Sombrero de Tres Picos (1874), uma sátira política que se desenrola à volta de um triângulo amoroso que envolve um moleiro, a sua mulher e um corregedor. O Chapéu de Três Bicos é um símbolo da aproximação que muitos artistas do século XX, em especial os espanhóis e os russos, tiveram à arte popular dos seus países e, em concreto, ao folclore, que serviu de fonte de inspiração para muitos dos seus trabalhos.

Nas palavras de José Sasportes, diretor do ACARTE: «A realização da cortina, cenários e figurinos para o Chapéu de Três Bicos foi, seguramente, o trabalho que mais apaixonou Picasso e, através da presente exposição, teremos a rara oportunidade de seguir o empenho posto nesta tarefa de apreciar a justeza dos resultados. Picasso conservou até à morte os estudos para este bailado, que acabaram por vir a fazer parte da coleção do Museu Picasso de Paris.» (Picasso. O Chapéu de Três Bicos, 1993)

O conjunto de desenhos reunidos em O Chapéu de Três Bicos prenuncia uma das recorrentes sínteses picassianas: a conjugação entre a experimentação de uma figuração de pendor classicista, aqui refletida no desenho dos figurinos, e uma linguagem de pressupostos cubistas, percetível no tratamento do espaço e interpretação dos ângulos perspéticos.

Assim, Pablo Picasso pintou uma cena de tourada na cortina, numa homenagem a Goya, e realizou o cenário, principalmente constituído por uma ponte, a casa do Moleiro e uma aldeia ao longe sobre um fundo azul, elementos fundamentais do bailado. Segundo Vicente García-Márquez, o cenário apresentava «uma reunião de formas geométricas, dominada pela preocupação da perspectiva, numa paleta suave de tons de terra bastante evocadores dos campos espanhóis» (Ibid., p. 14).

Os tons terra e pastel, de tonalidades quase neutras, permitiam destacar o vestuário «de cores deslumbrantes, cujas formas eram enriquecidos de motivos variados – círculos, riscas, pregas em zigzag – como encaixados uns nos outros pelos seus anéis largos e escuros. Esses figurinos, também inspirados em Goya, homenageavam, tal como a partitura e a coreografia, as diferentes regiões de Espanha» (Ibid.).

Contudo, os figurinos chocavam visualmente pelas suas cores fortes – verde, azul e amarelo –, contribuindo para a desumanização das figuras e perturbando o público. Apesar destas reticências, a estreia de O Chapéu de Três Bicos, a 22 de julho de 1992, foi um êxito estrondoso.

A exposição foi filmada pela RTP, para o programa «Flashmoda», no qual apareceram os figurinos desenhados por Pablo Picasso, e divulgada na revista Colóquio/Artes.

Carolina Gouveia Matias, 2018