CAM em Movimento. António Jorge Gonçalves, «Lugar do Voo», 2021          

Programa «CAM em Movimento»

A partir do fecho do CAM para obras de remodelação, e como parte do programa «CAM em Movimento», António Jorge Gonçalves intervém nos tapumes que envolvem as obras do edifício. Detendo-se sobre a história do local, o ilustrador usa a linha para unir diferentes tempos e ocupações, e escolhe como protagonista um residente do Jardim: o pato-real.

Em 2021, durante os confinamentos decretados para conter a pandemia de COVID-19, o Centro de Arte Moderna (CAM) iniciou um «programa fora de portas» intitulado «CAM em Movimento». Através dele, o CAM pretendia continuar a oferecer ao seu público programação contemporânea, apesar do encerramento do edifício para obras de requalificação da área expositiva e expansão do Jardim – cujos projetos foram atribuídos, respetivamente, ao arquiteto japonês Kengo Kuma e ao arquiteto paisagista Vladimir Djurovic.

Guiado pelo desejo de apresentar uma arte mais democrática e especialmente feita para as pessoas, este novo ciclo sustenta o seu modelo na espontaneidade, reunindo uma programação pensada para suscitar a curiosidade do público através da invasão da paisagem comum e da tentativa de disrupção do quotidiano da cidade. Mediante um exercício de experimentação e reflexão, pretende-se questionar criticamente a instituição, explorando o leque de possibilidades, papéis e funções a adotar no presente e no futuro, em contexto local, nacional e internacional.

Para Benjamin Weil, diretor do CAM desde dezembro de 2020, estes são os elementos fundadores do «CAM em Movimento», e a instituição alcançaria os seus objetivos se durante o período de encerramento conseguisse alargar a sua área de influência para lá do perímetro da Fundação Calouste Gulbenkian, procurando relacionar-se com públicos que, por uma razão ou por outra, habitualmente se escusam a interagir com a arte. Afinal, para o novo diretor do CAM, a obra do edifício oferecia à instituição «uma oportunidade […] [de] se reinventar e construir um futuro dinâmico, criar e estreitar laços de colaboração com outras áreas da Fundação, e explorar novos modos de se dar a conhecer e de atrair novos públicos», aproximando-os da arte contemporânea (António Filipe Pimentel é o novo diretor do Museu Calouste Gulbenkian, Expresso, 10 dez. 2020).

Em outubro de 2021, o programa inaugural do «CAM em Movimento» incluiu várias iniciativas: a escultura Cemiterra-Geraterra (1991), de Miguel Palma, viajou até Loures para ser instalada no Parque da Quinta dos Remédios, na Bobadela; os artistas Didier Fiúza Faustino e Fernanda Fragateiro intervieram no exterior das carruagens dos comboios da CP das linhas de Sintra e de Cascais, respetivamente; 24 obras da coleção do Centro de Arte Moderna viajaram até à Casa das Histórias Paula Rego, em Cascais, para a exposição «Coleção de Arte Britânica do CAM»; um contentor de carga e transporte de mercadorias foi instalado no jardim da Fundação Calouste Gulbenkian, para servir de sala de projeção de vídeos da coleção do CAM, ao qual, mais tarde, e até ao final de 2022, se juntariam outros contentores espalhados pela cidade para acolher novos projetos artísticos site-specific – nomeadamente o de Rui Toscano na praça do Centro Comercial Fonte Nova, o de Carlos Bunga na Praça do Comércio, e o de António Pedro no Parque da Bela Vista em Chelas (um projeto desenvolvido em colaboração com os moradores do bairro).

A criação de uma sala de projeção de vídeos dentro de um contentor de carga e transporte de mercadorias, sobretudo quando colocado no meio de um jardim, era inusitada, mas seguia a linha do programa, favorecendo o encontro com a arte em locais onde esta seria, à partida, inesperada. Num dos vídeos de apresentação desta iniciativa, publicado no Facebook a 25 novembro de 2021, Benjamin Weil fala sobre o efeito de surpresa que pretendeu causar e da relação descontraída que quis estabelecer entre a arte e o público: «Quero que as pessoas pensem que podem entrar no CAM, no futuro, da mesma forma que entraram nestes contentores.» (CAM em Movimento. Benjamin Weil, 2021 [vídeo])

O primeiro contentor a ser instalado no Jardim Gulbenkian apresentou um ciclo de vídeos da coleção do CAM especialmente dedicado a questões políticas e sociais, como a solidão e a guerra, tendo a paisagem e o mundo natural como cenários de fundo.

Em novembro, no dia em que inaugurava a terceira mostra deste ciclo, com a obra The Current Situation (2015), de Pedro Barateiro, inaugurava também o projeto desenvolvido por António Jorge Gonçalves (Lisboa, 1964) para a cerca de tapumes que protege os trabalhos de requalificação do edifício do CAM e de ampliação do Jardim Gulbenkian.

Convidado pela curadora Ana Vasconcelos, o ilustrador e autor de banda desenhada criou uma série de 23 desenhos que refletem sobre «a história do lugar onde hoje se situa a Fundação Gulbenkian pelos olhos de um pato-real, espécie comum no Jardim» (CAM \ CAM em Movimento. Lançamento do livro Lugar do Voo, 2023).

Servindo-se desse protagonista – o pato-real (Anas platyrhynchos) –, e do voo como «metáfora visual para os movimentos entre passado e presente», Gonçalves usou o desenho para relacionar os diferentes tempos, ocupações e acontecimentos que ocorreram neste espaço público que hoje serve a produção cultural, mas que outrora foi «campo de cultivo, jardim zoológico, velódromo, centro hípico e feira popular» (Santos, Contemporânea, jan.-mar. 2022).

A assinalar a exposição, a Fundação Calouste Gulbenkian publicou um livro contendo os 23 desenhos originais do autor. O lançamento do livro desdobrável, também intitulado Lugar do Voo, ocorreu no Centro Interpretativo Gonçalo Ribeiro Telles, no dia 7 de fevereiro de 2023. A sessão foi orientada pela curadora Ana Vasconcelos e contou com a presença do autor, de Raquel Alcobia, estudante e ativista do movimento Greve Climática Estudantil, e da investigadora Isabel Gordo (Instituto Gulbenkian Ciência). Ainda nesse dia, inaugurava a segunda fase do projeto assinado por António Jorge Gonçalves com o título Ontem vi o futuro – um conjunto de 48 desenhos nos quais o autor reflete sobre a incerteza do futuro.

As obras Lugar do Voo e Ontem vi o futuro ficaram instaladas, respetivamente, na Rua Dr. Nicolau de Bettencourt e na Rua Marquês de Sá da Bandeira, até à conclusão das obras do CAM.

Tendo surgido no contexto do programa inaugural do «CAM em Movimento», esta mostra foi objeto de uma ampla cobertura jornalística, nomeadamente pelas revistas Time Out (Joana Moreira, 19 out. 2021), Umbigo (Joana Duarte, 3 nov. 2021), Visão (Rodrigo Cruz Silva, 16 out. 2021) e Gerador (Nogueira, 5 fev. 2021), sendo ainda tema de um artigo da Agência Lusa publicado no Diário de Notícias da Madeira (16 out. 2021). Seria igualmente noticiada na Porto Canal, na RTP Notícias, na Sapo Magazine (15 out. 2021) e na Rádio Renascença (16 out. 2021), com um testemunho do próprio artista. Catarina Dias Ribeiro dedicou-lhe uma reportagem, transmitida nos programas As Horas Extraordinárias (RTP3, 29 out. 2021) e Portugal em Direto (RTP1, 3 nov. 2021), e Luísa Santos assinou na revista Contemporânea (jan.-fev. 2022) o mais extenso e expressivo artigo de reflexão crítica publicado até à data sobre a iniciativa «CAM em Movimento», onde alude a esta intervenção.

Madalena Dornellas Galvão, 2023


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Eventos Paralelos

Lançamento editorial

Lugar do Voo

7 fev 2023
Fundação Calouste Gulbenkian / Centro Interpretativo Gonçalo Ribeiro Telles
Lisboa, Portugal

Publicações


Material Gráfico


Fotografias


Multimédia


Documentação


Periódicos


Páginas Web


Fontes Arquivísticas

Arquivo Digital Gulbenkian, Lisboa / ID: 31780

Coleção fotográfica, cor: aspetos 2021

Arquivo Digital Gulbenkian, Lisboa

Conjunto de documentos referentes à exposição. Contém materiais gráficos, artigos de imprensa, entre outros. 2021


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