Exposição

Pioneiros e Discípulos. Gravura Brasileira

Exposição que congregou duas gerações de gravadores que cruzaram caminhos no Brasil enquanto professores e alunos. Constituindo um dos muitos eventos a dar enfoque à arte e à cultura brasileiras, a mostra foi mais um testemunho de como o modernismo brasileiro gerou um sincretismo cultural com lugar próprio na arte do século XX.

This exhibition brought together two generations of Brazilian printmakers whose paths crossed as teachers and students in Brazil. As one of many events which focused on Brazilian art and culture, this display bore witness to the blended culture forged by Brazilian modernism, which laid claim to its own, unique place in 20th century art.

Aspeto da exposição «Pioneiros e Discípulos. Gravura Brasileira», Centro de Arte Moderna, Lisboa, 1988. Arquivos Gulbenkian, ID: 167837 © Mário de Oliveira

Inaugurada a 19 de fevereiro de 1988, a exposição «Pioneiros e Discípulos. Gravura Brasileira» seria um dos muitos eventos programados pela Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) a dar enfoque à arte e à cultura brasileiras no final da década de 1980.

A mostra decorreu na Sala de Exposições Temporárias do Centro de Arte Moderna (CAM), serviço responsável pela organização do evento, em estreita colaboração com o advogado e bibliógrafo brasileiro José Ephim Mindlin.

A Bienal Internacional de São Paulo voltava a ter um influente papel na preparação de exposições de arte brasileira na FCG. É durante uma deslocação à 19.ª edição da Bienal (2 de outubro a 13 de dezembro de 1987), que José Sommer Ribeiro estabelece contacto com Mindlin para, juntos, levarem a cabo as demais diligências para a realização da exposição na FCG. É no seguimento desse contacto que o então diretor do CAM dirige um pedido oficial a António Luiz Dias de Andrade, então diretor regional da Secretaria do Património Histórico e Artístico Nacional do Brasil, com vista à autorização de saída do Brasil de algumas das obras que integrariam o projeto expositivo (Carta de José Sommer Ribeiro para Dias de Andrade, 19 out. 1987, Arquivos Gulbenkian, CAM 00047).

O projeto tinha como mote a reunião de duas gerações de artistas gravadores, todos eles partilhando relações académicas entre si. Seguindo essa premissa, a mostra estruturava-se em duas partes: do lado dos «Pioneiros», encontravam-se trabalhos dos professores Axl Leskoschek (1889-1975), Oswaldo Goeldi (1895-1961), Lívio Abramo (1903-1992); da parte dos «Discípulos», obras de Fayga Ostrower (1920-2001) e Renina Katz (1925), alunas de Leskoschek, e de Darel Valença Lins (1924-2017) e Maria Bonomi (1935), alunos de Abramo e Goeldi, respetivamente (Pioneiros e Discípulos…, 1988).

No texto introdutório para o catálogo da exposição, informa Mindlin que também os membros da nova geração de gravadores vieram a exercer atividade letiva no campo da gravura (Ibid., p. 4). Esse facto oferece pertinência à premissa de hereditariedade em que se baseava a curadoria, pois a gravura será, com efeito, dos poucos âmbitos da prática artística que, desde as suas tecnologias mais ancestrais aos processos mais recentes, tem conservado uma tradição de transmissão oficinal sem que isso lhe retire valor artístico perante a contemporaneidade.

Mindlin, ele próprio detentor das 19 obras de Leskoschek que foram emprestadas, contactaria um segundo colecionador, Afonso Henriques Ramos Costa, que, a partir do Rio de Janeiro, forneceria as 13 gravuras de Goeldi que terão sido expostas (Carta de Mindlin para Ramos Costa, 9 set. 1987, Arquivos Gulbenkian, CAM 00047). As restantes 72 peças foram «cedidas pelos próprios artistas», perfazendo um total de 104 espécimes catalogados (Ibid., pp. 6-50).

Apelando ao reconhecimento de uma especificidade histórica da gravura brasileira, a mostra «Pioneiros e Discípulos» foi mais um testemunho de como o modernismo brasileiro, ao colher migrações europeias, gerou um sincretismo cultural que foi afirmando a sua própria autonomia na arte do século XX.

Até hoje, a FCG apresentou diversas exposições dedicadas à gravura brasileira. Nas imediações desta mostra, refira-se a exposição individual de Fayga Ostrower, em 1977 (artista participante nesta «Pioneiros e Discípulos» de 1988), ou ainda a coletiva de gravura brasileira contemporânea que ocorreu em 1993.

Daniel Peres, 2018

Opening on 19 February 1988, the exhibition Pioneiros e Discípulos. Gravura Brasileira would be one of many events in the Calouste Gulbenkian Foundation (FCG) programme to focus on Brazilian art and culture at the end of the 1980s.
The event was held at the Temporary Exhibition Gallery of the Modern Art Centre (CAM), the service responsible for organising the event in close cooperation with Brazilian lawyer and bibliographer José Ephim Mindlin (1914-2010).
The São Paulo Art Biennial once again took on an influential role in the preparation of Brazilian art exhibitions at the FCG. During a trip to the 19th Biennial (2 October-13 December 1987), José Sommer Ribeiro made contact with Mindlin so that together they could take the steps necessary to hold the exhibition at the FCG. Following that contact, the then-director of the CAM made an official request to António Luiz Dias de Andrade, regional director of Brazil's Secretariat for Historical and National Artistic Heritage at the time, with a view to authorising some of the works to be included in the exhibition to leave Brazil (Letter from Sommer Ribeiro to Dias de Andrade, 19 Oct. 1987, Gulbenkian Archives, CAM 00047).
The project's aim was to bring together two generations of printmaking artists, all of which shared academic relations among each other. Following that promise, the exhibition was structured into two parts: on the Pioneers side were works by teachers Axl Leskoschek (1889-1975), Oswaldo Goeldi (1895-1961), Lívio Abramo (1903-1992); the Disciples side had pieces by Fayga Ostrower (1920-2001) and Renina Katz (1925), students of Leskoschek, and by Darel Valença Lins (1924-2017) and Maria Bonomi (1935), students of Abramo and Goeldi respectively (Pioneiros e Discípulos..., 1988).
In the introduction to the exhibition catalogue, Mindlin states that members of the new generation of printmakers also taught in the printmaking field (ibidem, p.4). That lent some relevance to the premise of heredity on which the curatorship was based because printmaking is one of the few fields of artistic production in which, from the most ancestral technologies to more recent processes, a tradition of master-apprentice transmission has remained, without this in any way diminishing its artistic value in the present day.
Mindlin, who himself owned 19 pieces by Leskoschek that were loaned for the exhibition, contacted a second collector, Afonso Henriques Ramos Costa, who supplied, from Rio de Janeiro, 13 prints by Goeldi that were included in the exhibition (Letter from Mindlin to Ramos Costa, 9 Sept. 1987, Gulbenkian Archives, CAM 00047).
The remaining 72 pieces were (...) lent by the artists themselves, making a total of 104 items in the catalogue (ibid., pp. 6-50).
Turning to recognition of the historically specific nature of Brazilian printmaking, the Pioneiros e Discípulos exhibition was another demonstration of how Brazilian modernism, by integrating European migrations, generated a cultural syncretism that began to assert its own autonomy in 20th-century art.
The FCG has presented several exhibitions dedicated to Brazilian printmaking to date. Around the time of this exhibition, an individual exhibition of Fayga Ostrower's work was held in 1977 (an artist who was also present in the 1988 Pioneiros e Discípulos exhibition) and there was a collective exhibition of contemporary Brazilian printmaking that took place in 1993.