Paisagem Interior. José Pedro Croft

50.º Aniversário da Fundação Calouste Gulbenkian

Intervenção de José Pedro Croft (1957) que resultou de uma encomenda da Fundação Calouste Gulbenkian ao artista, em comemoração do seu cinquentenário. A exposição foi coordenada por João Castel-Branco Pereira e Nuno Vassallo e Silva e apresentou um conjunto de esculturas inspiradas nas vitrinas das galerias.
Installation by José Pedro Croft commissioned by the Calouste Gulbenkian Foundation for its 50th anniversary. The exhibition, coordinated by João Castel-Branco Pereira and Nuno Vassallo e Silva, featured a selection of sculptures inspired by gallery windows.

«Paisagem Interior» resultou de uma encomenda feita pela Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) ao artista José Pedro Croft (1957), com o intuito de celebrar o cinquentenário da instituição. Croft concebeu uma instalação formada por sete esculturas que evocavam aspetos do edifício do Museu Calouste Gulbenkian (MCG), mecanismos de exposição dos seus objetos e algumas características da coleção, através da utilização de materiais e técnicas favoráveis a essa evocação e de uma linguagem abstrata e geométrica.

Comissariada por João Castel-Branco Pereira, a exposição esteve patente no Hall do MCG, entre 13 de abril a 15 de julho de 2007. A inauguração, a 12 de abril, contou com a presença de Emílio Rui Vilar, presidente da Administração da FCG, que para a ocasião proferiu um discurso registado no catálogo da exposição.

Além de «Paisagem Interior», o programa de celebração do quinquagésimo aniversário da FCG incluiu outras iniciativas, como a instalação Fundação, concebida em 2006 por Pedro Cabrita Reis, para a Nave do Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão. Tal como a instalação de Croft, Fundação incluía obras da Coleção do Fundador, nomeadamente uma pintura de paisagem do século XIX atribuída a Jean-Baptiste Camille Corot (Arredores de Douai) e uma escultura de Antonio Canova (Herma da Vestal Tucia, de 1818-1819).

Esta foi a primeira vez que o Museu Calouste Gulbenkian acolheu uma criação contemporânea, desafio a que, segundo Emílio Rui Vilar, José Pedro Croft respondeu com «notável mestria» (Paisagem Interior. José Pedro Croft, 2007, p. 5).

Também João Castel-Branco Pereira elogiou o resultado final, qualificando-o como «surpreendente», pela presença de esculturas que desafiam a perceção e a atitude dos visitantes, ao gerarem «incertezas através do ostensivo desacerto dos espaços e da mobilidade das imagens reflectidas, transmitindo o sentimento fugidio do que, existindo, é por natureza circunstancial e efémero» (Paisagem Interior. José Pedro Croft, 2007, p. 9).

O diretor do MCG caracterizou ainda o trabalho como «de grande eficácia cénica e espacial que reflecte de modo agudo sobre o Museu como edifício e sobre os mecanismos de exposição dos objectos e o próprio carisma da Colecção» (Paisagem Interior. José Pedro Croft, 2007, p. 7).

A encomenda realizada pela FCG não definiu quaisquer limites à criação de Croft, que, desde o início, pretendeu que a sua instalação fosse apresentada num espaço exterior ao das galerias, para que, e por ter consciência do grande contraste entre o seu trabalho e os objetos da Coleção, não perturbasse a visita à exposição permanente: «O local escolhido para a intervenção foi o hall, libertando-me do confronto directo com o peso da responsabilidade do convívio com obras maiores, dentro da sua, delas, casa. Ele é já uma enorme vitrina. Dentro, o magnífico Apolo de Houdon, fora, a escultura de Rodin que abre as portas à contemporaneidade.» (Paisagem Interior. José Pedro Croft, 2007, p. 8)

O projeto desenvolvido partiu das vitrinas utilizadas pelo MCG, desconstruindo a lógica de perceção que propõem, ao reconstruí-las de forma surpreendente e com uma dimensão maior. As esculturas, que compreendiam alturas entre 150 e 300 centímetros, numa escala calculada a partir do corpo humano e das esculturas aí presentes, foram dispostas no átrio das bilheteiras do Museu, onde dialogaram, pela sua forma, dimensão e materiais usados, tanto com este espaço de entrada e com o jardim interior e lagos que a antecedem (prestando assim homenagem à arquitetura do Museu), como com as esculturas Apolo (1790), de Jean-Antoine Houdon, e Jean d'Aire (1913), de Auguste Rodin, ali presentes.

A instalação confrontaria o visitante à chegada e à partida do MCG, modificando essa experiência e em particular a dos detentores das memórias dos objetos encontrados durante a visita à exposição permanente. A relação entre as soluções formais da instalação e o conceito de monumento vazio (ou de museu como local de armazenamento de memórias) contribuía para essa perturbação, uma vez que as peças podiam ser equiparadas às vitrinas do Museu que guardam testemunhos de eras e culturas passadas sob a forma de esculturas, cerâmicas, livros, vestes, objetos preciosos, moedas e joias.

A relação com as vitrinas, no entanto, não era algo que se limitasse ao contexto do Museu: segundo o artista, em toda a sua obra existe uma ligação com os objetos que pertencem ao quotidiano e que evocam aspetos dele, como as vitrinas de lojas, montras e supermercados. Ao mesmo tempo, o artista invocava diálogos dinâmicos de oposição ou complementaridade, entre peso e leveza, estabilidade e instabilidade, equilíbrio e desequilíbrio, verdade e ilusão.

Dentro de uma prática artística já desenvolvida em trabalhos anteriores, Croft quis desenvolver o conceito de «efemeridade estrutural da perceção visual», para conceber objetos que se erguiam através de estruturas metálicas e de vidros e espelhos, demarcando o espaço do átrio e obrigando o espectador a fazer novos percursos para obter uma visão mais completa da obra (Paisagem Interior. José Pedro Croft, 2007, p. 8).

A utilização do espelho favorecia, como muitas vezes no seu trabalho, efeitos de interpenetração e expansão, deformação e compressão do espaço. Segundo Hellmut Wohl: «Esta instalação é uma das obras de Croft mais bem conseguidas até à data, ao aplicar e sintetizar ideias, motivos, estratégias e soluções formais com as quais o artista tem experimentado durante a última década.» (Paisagem Interior. José Pedro Croft, 2007, p. 13)

Além da homenagem pretendida, «Paisagem Interior» foi uma forma de o artista expressar o grande carinho que tem pelo MCG, espaço que foi um importante contributo para a sua formação artística, a partir de 1970, altura em que Croft começou a ser seu visitante regular.

No ano seguinte, José Pedro Croft foi o vencedor do prémio de artes plásticas da Associação Internacional de Críticos de Arte 2007 (AICA 2007), atribuído por um júri constituído por Rui Mário Gonçalves, Leonor Nazaré, João Pinharanda, Nuno Crespo, Ana Tostões, Michel Toussaint e Ricardo Carvalho. Sobre o papel da exposição «Paisagem Interior» na atribuição do prémio, um artigo do Público refere: «Paisagem Interior, uma intervenção no hall do Museu Gulbenkian de Abril a Julho de 2007, incluída nas comemorações do 50.º aniversário da Fundação, foi apontada pelo júri como “um dos momentos fortes desse ano que avalizam a atribuição” do prémio.» («Prémios AICA atribuídos a José Pedro Croft e João Mendes Ribeiro», Público, 2 mai. 2008)

No mesmo jornal, num artigo do semanário Ípsilon, Óscar Faria classificou a exposição com cinco estrelas, fazendo uma leitura da instalação a partir da sua relação com as duas esculturas presentes no átrio do Museu, o que, para o autor, fundamenta uma dialética intrínseca entre história e contemporaneidade.

Tal como João Castel-Branco Pereira, Celso Martins destacou o lado cénico da intervenção e, num artigo do jornal Expresso, escreveu: «Se o quadro de referências formais se foi alterando, o que "Paisagem Interior" mostra é que à obra de Croft presidiu sempre uma dimensão teatral que progressivamente se vem tornando numa preposição da escultura como instrumento de leitura do espaço.» (Martins, Expresso, 28 abr. 2017, p. 43)

A exposição foi registada num desenho a aguarela de Eduardo Salavisa (autor de Diários de Viagem, falecido em 2020), disponível no blogue Desenhador do Quotidiano.

Carolina Gouveia Matias, 2019


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Coleção Gulbenkian

François Auguste René Rodin (1840-1917)

Jean d'Aire, Burguês de Calais (Le Bourgeois de Calais- L'Homme à la Clef")/ Figura monumental de Jean d'Aire vestido, Inv. 567

Apolo

Jean-Antoine Houdon (1741-1828)

Apolo, Inv. 552


Publicações


Material Gráfico


Fotografias

Helena de Freitas (à esq.) e Nuno Vassallo e Silva (à dir.)
José Pedro Croft
Isabel Alçada (à esq.), Emílio Rui Vilar (ao centro) e José Pedro Croft (à dir.)
Teresa Gouveia e Nuno Severiano Teixeira
José Pedro Croft (à esq.) e João Castel-Branco Pereira (à dir.)
João Carvalho Dias (à esq.)
Nuno Vassallo e Silva (à dir.)
José Pedro Croft

Documentação


Periódicos


Páginas Web


Fontes Arquivísticas

Arquivos Gulbenkian (Presidência), Lisboa / PRES 02220

Pasta com documentação referente aos discursos proferidos por Emílio Rui Vilar. Um destes discursos foi realizada no âmbito da inauguração da exposição e replicado no catálogo. 2007 – 2007


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