Joaquim Rodrigo

Lisboa, Portugal, 1912 – Lisboa, Portugal, 1997

Pintor português de formação autodidata, mestre e teorizador da arte concreta, Joaquim José Cardoso Rodrigo nasceu em Lisboa cidade onde passa a maior parte da sua infância.

Nos meados dos anos de 1930, ingressa no Instituto Superior de Agronomia, concluindo em 1939 a licenciatura em Engenharia Agronómica (mais tarde, em 1943, regressará a este instituto para se diplomar em Silvicultura). Já antes em março de 1938 iniciara-se no trabalho com a paisagem ao participar na equipa encarregue da criação do Parque Florestal de Monsanto, grande “pulmão verde” da cidade de Lisboa, sob a direção de Francisco Keil do Amaral. Ingressando como funcionário técnico especialista da Câmara Municipal de Lisboa, chega mesmo a residir no Parque Florestal, com a esposa Maria Henriqueta que conhecera em 1934. Nos anos de 1940, prossegue os estudos, desta vez, de silvicultura. Dentre as obras públicas de ajardinamento em que colabora nesta época, merece destaque o projeto para o arranjo da Praça do Império, no contexto da Exposição do Mundo Português. Esta atividade profissional reflete-se também nas primeiras obras que publicará em torno das temáticas da paisagem e da arte dos jardins (Jardinagem, 1ª ed. 1945, 2ª ed. 1955; O Parque Florestal de Monsanto, 1952).

A partir dos anos de 1940, Joaquim Rodrigo inicia um ciclo de viagens pela Europa que não mais irá interromper. São estas viagens – a par da vocação já consolidada de homem da terra –, outro importante estímulo para a arte que realizará nos anos subsequentes. Em 1950, inscreve-se no curso de pintura na Sociedade Nacional de Belas-Artes. É a primeira tentativa de exteriorização de um ímpeto criador que vinha amadurecendo. A experiência porém sai algo frustrada: o artista acaba por se alhear dos métodos e dos propósitos desse ensino, decidindo prosseguir por sua conta e risco, logo em 1951, montando ateliê com alguns companheiros conhecidos na própria SNBA, casa onde curiosamente vem a expor pela primeira vez, no mesmo ano. A vontade de pintar, todavia, não mais iria abandoná-lo. O conhecimento adquirido através das viagens, das visitas a museus, permite-lhe estruturar a sua pintura em premissas teóricas sólidas: tendo visto em Paris, o desabrochar e a projeção pública das tendências do Abstracionismo (e do Expressionismo também), revela uma compreensão surpreendente do racionalismo pictórico que poderá aplicar às suas obras originais, com a sua economia de linhas retas ou curvas e planos de cores gerando relações espaciais de contiguidade, equilíbrio ou contraste. Nessa época, o artista assimilou com particular interesse a herança do construtivismo e do neoplasticismo nas artes visuais e pôde aproximar-se do movimento informal de artistas que gravitavam em torno do projeto da Galeria de Março de José-Augusto França, com o esforço de projeção – à escala portuguesa ou lisboeta – de uma arte abstrata, com direito a Salão próprio (Iº Salão de Arte Abstrata, 1954). O artista irá naturalmente figurar neste evento, com três obras cujas designações alfanuméricas já traduziam todo um programa de trabalho em torno do serialismo e da ideia de variação sobre o tema base da forma geométrica elementar (triângulos, retângulos, quadrados, círculos). Em 1958, encontramo-lo na Retrospectiva da Pintura não figurativa em Portugal (Lisboa, Faculdade de Ciências), enquanto pelo lado da sua atividade de paisagista, vemo-lo a colaborar nos arranjos exteriores do Pavilhão de Portugal na Exposição Mundial de Bruxelas, no mesmo ano.

A ideia de trabalho por variações sobre elementos básicos fundamentais acompanharia Joaquim Rodrigo ainda no seu regresso às formas figurativas, no início da década de de 1960: a sua conceção solar, intencionalmente ingénua ou infantil do desenho (informada a partir das matrizes expressionistas ou da arte bruta europeias), não deixa de servir um propósito de comentário sobre a política portuguesa no período de agitação social estudantil e contestação à política ditatorial do regime com o início das hostilidades entre Portugal e as então Colónias ultramarinas. Quadros como SM (1961) ou Kultur (1962) refletem a atenção do artista a esse mundo que o rodeia e com o qual se sente em total dissensão.

Na segunda metade da década de 1960, vemos Joaquim Rodrigo empenhado em diversos projetos no âmbito do paisagismo e da pintura: em 1966, integra a equipa de Nuno Portas na urbanização da zona dos Olivais e de Chelas, em Lisboa, com a conceção dos espaços exteriores e ajardinamentos. Pouco depois, a partir de 1968, a sua pintura inflete para uma conceção caracterizada pela redução drástica dos dados iconográficos (até então inscritos em redes ou numa malha orgânica densa e fina) à sua expressão mais económica: os fundos aveludados e homogéneos – em tonalidades ocre ou terras -, tornam-se os territórios simbólicos privilegiados para uma inscrição parcimoniosa e meditada dos elementos gráficos e iconográficos, orgânicos, figurativos ou não, tomando como paradigma as pinturas sobre terra dos aborígenes australianos ou das etnias africanas que vinha estudando atentamente nos anos anteriores.

Em 1972, organiza na SNBA (a que se mantivera ligado por diversas vezes) uma primeira retrospetiva da sua obra plástica, a que se segue, no mesmo ano, a atribuição do Prémio de Artes Plásticas Soquil. É de certo modo a confirmação pública de um pensamento plástico original e ímpar em Portugal que fora pela primeira vez reconhecido com a atribuição do Prémio Nacional de Arte Moderna Diogo de Macedo, em 1959. Chamado por diversas vezes a integrar representações portuguesas em mostras internacionais de arte (Bienal de São Paulo, 1957; 1989; Art Portugais, Bruxelas, Paris, 1967; Exposição Tríptico, Gent, 1991), Joaquim Rodrigo deixa-nos uma obra pictórica profusa e coesa, estruturada em bases conceptuais sólidas (“pintura telemétrica”, “diferenciação cromática”, “quadro – tipo”) que o próprio artista formulou em escritos de maturação lenta mas segura (O Complementarismo em Pintura, 1982; O Pintar certo, 1995). Foi ainda um caso único entre os seus pares ao propor uma arte concreta, alicerçada em preceitos de simplicidade, equilíbrio e depuramento formais. Joaquim Rodrigo sabia o que procurava – edificar uma ciência da arte fundada em premissas materiais. E tão intensa e meditada foi a sua demanda de rigor conceptual que o levou a destruir uma parte das obras que criou em certos períodos, por exemplo, o ciclo de obras abstratas – geométricas dos anos de 1950.

 

Ana Filipa Candeias

Maio de 2013

Atualização em 16 abril 2023

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