Adriano de Sousa Lopes

1879 – 1944

Pintor e desenhador português, natural de Vidigal, lugar da Freguesia de Pousos, Concelho de Leiria, manifestou desde jovem talento para o desenho e para a pintura. Encorajado por Afonso Lopes Vieira e outros beneméritos da cidade de Leiria, vem para Lisboa estudar na Academia de Belas Artes que frequenta a partir de 1898, sendo aluno de Veloso Salgado (pintura) e Luciano Freire (desenho).

Em 1903, parte para Paris como pensionista do Legado Valmor na especialidade de Pintura de história. Frequenta a École Nationale des Beaux-Arts e a Académie Julian onde haviam estudado artistas como Pierre Bonnard ou Edouard Vuillard, formando-se com Fernand Cormon, pintor académico já então consagrado pela sua pintura de história. Em Paris, Sousa Lopes expõe em diversas edições do Salon d’Automne (em 1904, 1905, 1906 e depois novamente em 1908, 1909 e 1912). Em 1915, é organizador da Secção de Belas Artes do Pavilhão Português à Exposição Internacional Panamá-Pacífico, organizada em S. Francisco, Califórnia, EUA. Realiza uma primeira exposição individual em Lisboa, na Sociedade Nacional de Belas Artes (SNBA), em 1917, no mesmo ano em que parte para a Frente na I.ª Guerra Mundial como oficial artista com o posto de capitão. Após o armistício e até cerca de 1927, viaja pela Europa e pelo Norte de África, passando temporadas em França e em Portugal onde expõe novamente em 1927, ano em que assume, por designação de Columbano Bordalo Pinheiro, a direcção do Museu Nacional de Arte Contemporânea. Artista académico, vogal da Academia Nacional de Belas Artes (1932), Sousa Lopes recebe, ao longo dos anos 30, diversas encomendas oficiais, como as pinturas decorativas para o Salão Nobre da Assembleia Nacional ou para o Museu Militar de Lisboa, colaborando ainda em projectos de exposições históricas e comemorativas como a de Arte Portuguesa da Época das Grandes Descobertas ao século XX (Paris, 1931) ou dos Primitivos Portugueses (Lisboa, 1940), fazendo parte com Reynaldo dos Santos e João Couto, da sua Comissão organizadora.

 

Artista prolífico e versátil no domínio técnico, elogiado colorista, Sousa Lopes, como assinava, foi um pintor eclético, tendo abraçado uma grande diversidade de temas com ampla variação estilística, conforme se pode verificar no conjunto de obras pertencentes à coleção do CAM. No catálogo do artista predominam a pintura a óleo, sobre tela ou madeira, aguarelas e desenhos (águas-fortes, gravura), através dos quais Sousa Lopes produziu retratos (No salão, Retrato da Senhora F.C. em vestido de noite; Mlle H.L. dans l’atelier de Souza), cenas de interior (Num salão, senhora e homem encostado numa chaminé), encontros sociais ou mundanos (notável estudo expressionista de feição quase caricatural em Sem título), naturezas mortas (Natureza-morta, 1910) temas de património (Évora d’Alcobaça), ou de história como os Episódios do Cerco de Lisboa, um dos quais terá ganho uma Menção Honrosa no Salon d’Automne de 1906.

 

É porém na pintura de paisagem que Sousa Lopes manifesta melhor a sua vocação pessoal: numerosas versões de marinhas e céus (Mar e céu, 1923), vistas de beira mar ou de cidades e povoações de Portugal (Paisagem portuguesa) e dos países que visitou (França, Bélgica, Itália, Marrocos, Espanha), uma rara vista de pinhal (Caminho na Floresta), revelam uma atracção sensível ao Tempo, entendido este na sua dimensão atmosférica – aí por vezes ensaiando uma dissolução impressionista dos cenários e dos elementos, céu, nuvens, água, através de efeitos de luz e sombra –, e na sua dimensão cronológica, desenvolvendo uma atenção particular aos momentos ou às horas do dia e às transfigurações na percepção dos espaços induzidas pelas variações na luminosidade e no colorido das cenas.

 

Tal atenção ao Tempo é bem patente nas designações que Sousa Lopes dá às suas obras: Noite no Canal, Os Telhados de Montmartre à noite ou Pôr-do-sol, são algumas das que, na colecção do CAM, assinalam esse interesse do artista pela crónica do tempo que passa, pelas suas cambiantes formais, cromáticas e luminosas, obras nas quais melhor se acusa o efeito da pincelada impressionista.

 

Outro aspecto interessante é a escala intimista de grande parte dos seus trabalhos pictóricos, o interesse pelo apontamento sobre o motivo, a pequena dimensão das suas imagens – por vezes, breves e expressivos apontamentos de cor e movimentos –, a qual contrasta por outro lado, com a monumentalidade e a fixação historicista de alguns trabalhos resultantes de encomendas privadas ou institucionais, como os painéis a fresco concebidos para o Palácio de S. Bento que não chegaria a concluir.

 

Sousa Lopes constitui uma personalidade algo paradoxal por um certo distanciamento das realidades sociais do seu tempo (ainda mais tendo em conta o seu apreço pela indagação temporal na imagem pintada), pelo seu entendimento da pintura como refúgio, divertimento ou narração histórica (épica ou folclórica), numa linha que se define em contra-ciclo relativamente às problemáticas do movimento Moderno internacional, e contribui para prolongar, no século XX português, uma concepção da pintura alicerçada em preceitos naturalistas e numa funcionalidade mnemónica, decorativa ou ilustrativa, mormente actualizada até ao Impressionismo que o artista haveria de defender como corrente adequada a uma «sensibilidade portuguesa» (Conferência no Rotary Club de Lisboa, em 1929). As suas imagens do trabalho (sobretudo da pesca artesanal que muito o fascinou), de tipos populares (Nazarena, ou Italiana), ou das festividades tradicionais (procissões) são quase sempre ilustrações amáveis de uma realidade entendida como condição natural imutável representada com um desenho tranquilo, evitando a distorção expressionista, sobretudo nas obras de maturidade, dos finais dos anos 20 em diante. A atenção particular que Sousa Lopes lança aos ofícios ou costumes populares aparece sempre imbuída de condescendência perante o humano que o artista regista também nos retratos convencionais com modelos ou figuras humanas (Mlle. H. L. em fato de passeio; Num salão, rapaz com um arco; Num salão, Mlle H.L. e sua irmã…).

 

O contacto directo que teve com uma geografia moderna, quer através das viagens e estadias (numerosas) em Paris, Veneza, Roma, quer finalmente com a desolação e o sofrimento na grande fractura civilizacional que foi a I.ª Grande Guerra, a que assistiu na linha da frente com o posto de oficial encarregue do registo iconográfico da acção do Corpo Expedicionário Português, entre 1917 e 1918 (de que o CAM possuí alguns belos exemplares em gravura), terão provocado em Sousa Lopes, primitivo contemporâneo no dizer de Afonso Lopes Vieira, uma espécie de imunidade, ao espírito e à letra dos ideais modernos, que fundamentalmente declinaria ao longo da vida.

 

 

Ana Filipa Candeias

Dezembro de 2010

 

 

 

Atualização em 23 janeiro 2015

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