Investir nas crianças e jovens

Enquanto se lança o concurso para a segunda leva de Academias Gulbenkian do Conhecimento, as primeiras Academias já promovem competências sociais e emocionais em crianças e jovens de todo o País.
©Márcia Lessa
03 abr 2019

“Eu sou o rei desta turma. Não, eu sou o rei da escola”, anunciou João Pinto ao entrar na sala de aula. A algazarra era tanta que poucos o ouviram, mas o anúncio estava feito e seria muito útil aos que, nos meses seguintes, viriam trabalhar competências sociais e emocionais com os alunos daquelas duas turmas dos 5º e 7º anos de escolaridade.

Nunca é fácil manter o foco de 15 jovens. E o facto de a sessão com os mentores da Associação Lifeshakers promover a participação e o trabalho em grupo potencia a desordem. João Pinto seria pois um elemento fundamental para, com o seu perfil de líder, repor a ordem em momentos-chave do trabalho. Naquela manhã, Afonso, Patrícia e Keveni, da Lifeshakers, queriam abordar o tema da Criatividade. À pergunta “o que é a criatividade?” discorreu-se “criar”, “um desenho”. “Não há respostas certas nem erradas”, esclareceu Afonso. “Ter imaginação”, “ter ideias diferentes”, prosseguiram. Seguiu-se a expressão plástica do conceito: numa folha de papel, cada aluno podia desenhar o que fosse do seu agrado. Um terço desenhou um telemóvel. Outros uma carteira Channel, maquilhagem, comida. Um aluno desenhou uma pistola, uma moto e um molho de notas, como que para mostrar quem tinham pela frente.

Afonso é novo na Lifeshakers. Mas Patrícia, fundadora da Associação, já trabalha com aquele universo do Monte da Caparica há vários anos. E Keveni é um deles – andou naquela escola, conhece-os bem e apesar do ar doce também teve os seus desacatos. Depois de um ano como voluntário, a aprender com o exemplo e a crescer como pessoa, estreia-se como mentor deste projeto.

 

32 Academias no terreno, outras tantas a caminho

Instalada “no bairro” há vários anos, a Associação está a dar os seus primeiros passos enquanto Academia Gulbenkian do Conhecimento. Neste contexto, o objetivo é trabalhar com as crianças e jovens (dos 11 aos 20 anos, de 14 turmas dispersas por três escolas) competências como “a Criatividade, o Pensamento Crítico ou a Resolução de Problemas”. Se, no fim do projeto, conseguirem pôr os jovens a criar ou desenvolver iniciativas capazes de tornar a Escolinha de Rugby (criada pela Associação para aquela população do Monte da Caparica) sustentável, tanto melhor. Mas se só ganharem competências sociais e emocionais, o trabalho não terá sido em vão.

Keveni sabe bem o que se pretende. Quando entrou na Associação Lifeshakers, diz, “falava muito nas aulas, ficava chateado muito rápido, era muito desorganizado”. Enquanto voluntário, conta, teve “de aprender [certos valores] para poder transmitir; aprendi a adaptar-me aos outros, a ser mais criativo.” Olha para a sala de aula onde decorre a sessão e diz: “temos os ciganos, os pretos, os brancos – desculpe, mas é mesmo assim – e às vezes há mais agressividade, sim. Mas juntamo-nos. Já se brinca, há respeito.” São estes pequenos passos – a capacidade de resolver problemas, de olhar para as coisas com mais criatividade, de ter pensamento crítico, mas também de comunicar, ser resiliente, de se adaptar à mudança – que as Academias Gulbenkian do Conhecimento pretendem promover, de forma a preparar crianças e jovens para um futuro em rápida mudança. Além da Lifeshakers, há no terreno mais três dezenas de Academias a trabalhar competências sociais e emocionais em jovens até aos 25 anos e está em curso um segundo processo de seleção de projetos para novas Academias. Com elas, a Fundação pretende chegar, em cinco anos, a mais de 13 mil alunos através do financiamento (e mentoria) de pelo menos 100 organizações por todo o País.

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