Alberto Carneiro. Exposição Antológica

Exposição antológica e retrospetiva de Alberto Carneiro (1937-2017), organizada em parceria pela Fundação Calouste Gulbenkian e pela Fundação de Serralves. Abrangendo um arco temporal de 1963 a 1989, os 73 trabalhos selecionados foram exibidos em Lisboa e no Porto.
Retrospective exhibition of the work of Alberto Carneiro (1937-2017) organised in a partnership between the Calouste Gulbenkian Foundation and the Serralves Foundation. The show, which included 73 works spanning a period between 1963 and 1989, was staged in Lisbon and Porto.

A exposição antológica de Alberto Carneiro (1937-2017) esteve patente na Galeria de Exposições Temporárias da Sede da Fundação Calouste Gulbenkian (piso 0), de 23 de janeiro a março de 1991, e apresentou trabalhos realizados entre 1963 e 1989. Foram expostos desenhos, projetos, fotografias, instalações e esculturas.

A realização desta exposição surgiu no âmbito do programa de «apresentação dos mais importantes nomes ou situações criativas que pautaram a evolução do percurso artístico português das últimas décadas» (Alberto Carneiro. Exposição Antológica, 1991, p. 9). Exemplo desta programação foram as exposições antológicas e retrospetivas dedicadas a Eduardo Luiz, António Areal e Menez.

A exposição foi desdobrada entre a Fundação Calouste Gulbenkian, a Sociedade Nacional de Belas-Artes – onde foram expostas cinco peças de 1968-1969 – e a Galeria Valentim de Carvalho – onde se mostraram algumas esculturas pouco conhecidas (de 1966-1967) e uma das suas peças mais recentes à época, constituída por um círculo de madeiras, intitulada Árvore: Mandala de Fogo. A exposição foi em seguida apresentada no Porto, na Casa de Serralves e na Cooperativa Árvore.

No Porto, realizaram-se duas visitas guiadas por Alberto Carneiro, a 15 e 19 de abril, em diálogo com os críticos Fernando Pernes e Maria João Fernandes.

A coordenação da exposição, assim como do catálogo, foi da responsabilidade de Maria Helena de Freitas e do artista, em colaboração com a Fundação de Serralves. A museografia coube a José Sommer Ribeiro e à equipa de montagem do Serviço de Exposições e Museografia, em colaboração com o Centro de Arte Moderna, coordenados por Manuel Piçarra. Em Serralves, Etheline Rosas foi a responsável pela coordenação, assim como pela direção de montagem.

O espaço da exposição e a disposição dos trabalhos foram cuidadosamente pensados pelo artista e por Sommer Ribeiro, com o objetivo de apelar à infância e ao começo de tudo. Parafraseando Alberto Carneiro, pretendeu-se suscitar nos visitantes a presença dos locais de origem das suas obras e materiais, levando-os a «viver as formas e a procurar entender as relações possíveis e o percurso do autor» (Carlos, Expresso, 2 fev. 1991).

Trabalho marcado por um questionamento constante dos pressupostos da arte e da vida, em linha com os movimentos intelectuais que tomaram destaque na década de 60, a obra de Alberto Carneiro marca a introdução da arte ecológica em Portugal, sendo influenciada pela reflexão de diversas filosofias orientais, como o budismo zen e o tantrismo, o que resulta num trabalho despojado de linguagem formal, que opera no espaço da relação entre o corpo humano e o mundo natural.

«Artista do cosmos e do corpo, o cerne do seu processo evolutivo reporta-nos a meados da década de 60. Ou seja, a um período histórico simultaneamente marcado pelo ascetismo minimal e pelo pendor questionante do conceitualismo, duplamente incidente sobre o sentido antropológico da criatividade artística (acarretando a releitura da tradição escultórica ocidental até às origens mais remotas) e proporcionando as diversas vertentes da sabedoria oriental (o zen, as mandalas, o taoismo, o pensamento tântrico…), sentida em confrontação contestatária perante o modus vivendi euro-americano.» (Alberto Carneiro. Exposição Antológica, 1991, p. 11)

Nos anos 70, o artista troca a prática escultórica direta pelo estatuto de operador estético, intervindo na natureza através de performances fotografadas e da presença do corpo nu, ou transferindo os elementos naturais para os espaços institucionais, num movimento de evocação ecológica e protesto contra uma sociedade poluente e afastada da natureza. Exemplo máximo disto é o Manifesto de Arte Ecológica, que Alberto Carneiro compôs entre 1968 e 1972.

Os últimos trabalhos de Carneiro são como um regresso aos tempos de trabalho nas oficinas religiosas de São Mamede do Coronado e de formação na Escola Superior de Belas-Artes do Porto, debruçando-se sobre a prática escultórica em madeira e bronze.

A exposição apresentou diversas categorias do trabalho de Alberto Carneiro, sendo constituída por «envolvimentos», como as obras O Canavial: Memória-Metamorfose de um Corpo Ausente (1968), Uma Floresta para os Teus Sonhos (1970) e Um Campo depois da Colheita para Deleite Estético do Nosso Corpo (1973-1976); instalações, como Os Sete Rituais sobre um Feixe de Vimes na Paisagem (1975), O Corpo Subtil (1980), 21 Janelas sobre a Paisagem e 7 Esculturas Naturais (1973) e Uma Linha para os Teus Sentimentos Estéticos (1970-1971); obras de parede, como Within your Eyes I am Art-Form-Feelings (1969), Trajecto dum Corpo (1976), A Floresta (1978) e Sobre o Meu Corpo o Rasto da Serpente (1980); e esculturas, como Percursos na Paisagem (1982-1983), Variações sobre um Haikai de Basho (1984-1985), Mântrica (1987-1988) e Tempo/Memória (1987-1989).

O catálogo é um importante complemento da exposição, já que reúne a produção literária de Alberto Carneiro, em que se incluem manifestos e excertos do seu diário, que surgem não como explicação dos seus trabalhos mas antes como reflexão da prática artística, e uma coletânea de ensaios e críticas sobre a sua obra. Esta antologia contém textos de Ernesto de Sousa, Fernando de Azevedo, Fernando Pernes, Mário Lindolfo, João Miguel Fernandes Jorge, Salette Tavares, José Barrias e João Pinharanda. Um dos elementos mais curiosos do catálogo é a existência do mapa astrológico de Alberto Carneiro, com leitura de Flávia de Monsaraz.

A exposição teve uma grande repercussão na imprensa portuguesa e foram vários os autores que se debruçaram sobre a obra exposta do escultor.

Leonor Nazaré lembrou a importância que o espectador assume no trabalho de Alberto Carneiro, fazendo referência aos seus «envolvimentos»: «Ao permitir ao espectador um percurso físico, A. C. torna-o parte da escultura, que assim funciona como oferta de uma verdade interior de relação com a estrutura e a desmultiplicação simbólica dos elementos naturais recolhidos – as canas, os troncos, as mechas de trigo.» (Nazaré, Expresso, 23 fev. 1991)

O envolvimento do espectador na obra de Alberto Carneiro não é concretizado apenas pela sua presença física no espaço que esta ocupa, mas também pela invocação de todos os sentidos – visão, olfato, audição e tato –, tornando-se o corpo do espectador matéria da escultura.

O apelo imediato aos sentidos, que se experimentava mal se entrava na Galeria de Exposições Temporárias, será assinalado por José Luís Porfírio: «Basta passar pela óptima montagem da Fundação (uma das melhores de sempre) para descobrir que na travessia desse grande corredor rodeado de afectos e de informação é com os cinco sentidos que se vê!» (Porfírio, Expresso, 2 fev. 1991)

O artigo de Isabel Fragoso para o JL é importante pela descrição dos espaços expositivos e do modo como os trabalhos convidam à participação: «Imagine: uma das salas da Galeria de Exposições Temporárias da Fundação Gulbenkian cheia de feno pelo chão, medas estratégica e harmoniosamente colocadas de modo a interferir com o seu caminho, ou seja, "um campo depois da colheita para deleite estético do nosso corpo" (1974/76). Noutra ala estão aprisionados troncos de diversos tamanhos, de maneira a formar uma ou duas clareiras, metáfora de um bosque imaginário onde não pululam esquilos mas sim o que a imagética de cada um mandar, num reordenamento natural e pacífico, ou seja, "uma floresta para os teus sonhos" (1970).» (Fragoso, JL. Jornal de Letras, Artes e Ideias, 5 fev. 1991)

No âmbito da exposição, foi adquirida pela Fundação Calouste Gulbenkian a instalação Os Sete Rituais Estéticos sobre um Feixe de Vimes na Paisagem.

Sobre esta exposição retrospetiva, Alberto Carneiro afirmou que não se tratava do fechar de um ciclo, mas antes de algo que tem um movimento em espiral, em que se passa, em continuidade, de um ciclo para outro. Sobre o caráter retrospetivo e reflexivo da exposição, Carneiro declarou: «É uma instalação com obras dos últimos 28 anos. É um momento para interagir com diferentes momentos da obra, os tempos do seu desenvolvimento. Cada exposição foi para mim um momento de reflexão. E esta será a primeira oportunidade de ver partes significativas do meu trabalho em conjunto e poder reflectir sobre os respectivos desenvolvimentos. Um momento prospectivo relativamente às considerações que possam decorrer daqui para o futuro.» (Alberto Carneiro. Exposição Antológica, 1991, p. 197)

Carolina Gouveia Matias, 2018


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Coleção Gulbenkian

O Vôo do Homem

Alberto Carneiro (1937-2017)

O Vôo do Homem, 1966 / Inv. 81E860

Os sete rituais estéticos sobre um feixe de vime na paisagem

Alberto Carneiro (1937-2017)

Os sete rituais estéticos sobre um feixe de vime na paisagem, 1975 / Inv. 90E861

Percursos na Paisagem (memória do corpo sobre a terra)

Alberto Carneiro (1937-2017)

Percursos na Paisagem (memória do corpo sobre a terra), 1982/83 / Inv. 85E840

Uma floresta para os teus sonhos

Alberto Carneiro (1937-2017)

Uma floresta para os teus sonhos, 1970 / Inv. 96E379

Os sete rituais estéticos sobre um feixe de vime na paisagem

Alberto Carneiro (1937-2017)

Os sete rituais estéticos sobre um feixe de vime na paisagem, 1975 / Inv. 90E861


Publicações


Material Gráfico


Fotografias


Documentação


Periódicos


Fontes Arquivísticas

Biblioteca de Arte Gulbenkian, Lisboa / Dossiê BA/FCG

Coleção de dossiês com recortes de imprensa de eventos realizados nas décadas de 80 e 90 do século XX, organizados de forma temática e cronológica. 1984 – 1997

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00343

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém convite, correspondência interna e externa, orçamentos, fichas de empréstimo de obras, material para o catálogo e recortes de imprensa. 1988 – 1991

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00907

Pasta com documentação referente a aquisições. Contém a aquisição da obra «Natureza Natural» (1979), de Alberto Carneiro. 1989 – 1991

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00734

Pasta com documentação referente a aquisições. Contém a aquisição de três obras s/ título de Alberto Carneiro (escultura em aço inoxidável, de 1968, e dois desenhos a carvão, de 1987-88) e da obra «Os Sete Rituais Estéticos sobre um Feixe de Vimes na Paisagem» (1974-75). 1990 – 1991

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00815

Pasta com documentação referente a aquisições de obras de arte. Contém a aquisição da obra «Natureza Natural» (1979), de Alberto Carneiro. 1991 – 1991

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM-S005/01/01-P0107-D02593

Coleção fotográfica, p.b.: aspetos (FCG, Lisboa) 1991

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM-S005/01/01-P0107-D02591

Coleção fotográfica, cor: inauguração (FCG, Lisboa) 1991

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM-S005/01/01-P0107-D02592

Coleção fotográfica, cor: aspetos (FCG, Lisboa) 1991


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