A Oriente na Floresta de Ise Shima. Alberto Carneiro

Exposição individual do artista português Alberto Carneiro (1937-2017), realizada pela Fundação Calouste Gulbenkian e apresentada no Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão. A mostra, resultante das influências adquiridas pelo artista aquando das suas viagens ao Oriente, apresentou uma instalação representativa da relação simbólica entre a natureza e o homem.
Solo exhibition on Portuguese artist Alberto Carneiro (1937-2017) organised by the Calouste Gulbenkian Foundation and held at the José de Azeredo Perdigão Modern Art Centre. The show, born of influences the artist acquired during his travels to the East, included an installation representing the symbolic relationship between nature and man.

Exposição individual do artista português Alberto Carneiro (1937-2017), realizada pela Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) e apresentada no Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão (CAMJAP).

Alberto Carneiro, uma referência da escultura contemporânea portuguesa, não realizava uma exposição individual em Lisboa desde 1993, integrada na programação associada à inauguração do Centro Cultural de Belém. À data da exposição «A Oriente na Floresta de Ise Shima», programada e comissariada em parceria por Jorge Molder e Rui Sanches, Alberto Carneiro havia já percorrido um longo caminho artístico e pessoal. Nascido em São Mamede de Coronado, um típico meio rural situado no norte de Portugal, trabalhou até 1958 numa oficina de arte religiosa, «onde aprendeu o imaginário, tirando partido da madeira, [da] pedra e do marfim» (Botelho, Diário de Notícias, 11 fev. 1991), diplomando-se em escultura em 1967, pela Escola Superior de Belas-Artes do Porto (onde lecionou entre 1972 e 1976). Partiria em seguida para Londres, onde frequentou durante dois anos a Saint Martin's School of Art, como bolseiro da FCG.

No seu percurso de vida algo invulgar, Alberto Carneiro desenvolveu um trabalho que – iniciado entre o final da década de 60 e a década de 70 – se inscreve nos pressupostos da arte conceptual e da Land art e que o levaram à elaboração do que João Pinharanda caracterizou como «um discurso raro (e de rara coerência) no panorama artístico nacional». De acordo com o crítico de arte, «o cumprimento de tais pressupostos, a questionação da criação artística e do estatuto do artista determinam a extensão de uma obra ímpar: entre o fascínio "selvagem" de um "canavial" e a esteticização da escultura mais recente» (Pinharanda, Público, 1991).

A exposição esteve patente na Sala de Exposições Temporárias do CAMJAP, de 23 de outubro de 1997 a 11 de janeiro de 1998, consistindo numa instalação, feita em madeira (mogno, tola e ocomé), cera e resina, que surgiu no seguimento de algumas viagens realizadas pelo artista a terras orientais. Na apresentação do catálogo, Jorge Molder e Rui Sanches salientam a genialidade artística de Carneiro, cuja obra, apesar das intervenções realizadas nos materiais – troncos, pedras, vimes, canas, entre outros –, nunca compromete a perceção da sua origem: a natureza. Com efeito, citando novamente João Pinharanda, «a natureza, na obra de Carneiro, surge como uma entidade viva – tem um estatuto de protagonista; deixa de ser entendível como paisagem (passiva) para se tornar o suporte de uma ideia, o motivo que dispõe o artista à realização da obra» (Pinharanda, Público, 25 jan. 1991).

A instalação que conformou esta «Floresta» exibiu «de forma clara um confronto entre uma estrutura de troncos sobrepostos formando uma pirâmide em torno de um elemento central, talvez a mais arquitectónica das construções de Alberto Carneiro, e uma série de fragmentos de troncos colocados em diferentes posições, como que espalhados pelo espaço da galeria» (A Oriente na Floresta de Ise Shima. Alberto Carneiro, 1997).

A estrutura central, «cuidadosamente calibrada», apresentou-se como um espaço fechado, do qual o público apenas se podia aproximar, e à volta do qual se encontrava um conjunto disperso de troncos – mais precisamente, um conjunto de construções feitas a partir da «ideia do tronco» –, que formava a «Floresta». Segundo Jorge Molder e Rui Sanches, esta «desordem» poderia significar que «a nossa própria aproximação à natureza exige sempre trabalho e é mediada pelas estruturas culturais que nos formaram» (Ibid.).

Nesta obra, verifica-se um encontro ao nível estético de Oriente e Ocidente, que Fernanda Maio, na crítica que redige para o jornal Independente, descreve do seguinte modo: «A influência do pensamento oriental está patente na necessidade de redescoberta constante da natureza e da nossa experiência perante ela, enquanto a cultura ocidental, parece implicar, no seu trabalho, uma atitude de transformação muito mais interventiva, permitindo uma abordagem crítica daquilo que na obra é o Ocidente.» (Maio, O Independente, 21 nov. 1997)

Citando Leonor Nazaré: «Ao permitir um percurso físico, A[ntónio] C[arneiro] torna-o parte da escultura, que assim funciona como oferta de uma verdade interior de relação com a estrutura e a desmultiplicação simbólica dos elementos naturais recolhidos – as canas, os troncos as mechas de trigo.» (Nazaré, Expresso, 23 fev. 1991)

O catálogo da exposição integra uma sequência de fotografias de José Manuel Costa Alves, uma apresentação da autoria dos responsáveis pela sua programação, Jorge Molder e Rui Sanches, um texto de Delfim Sardo e um resumo dos dados biográficos mais relevantes do artista. No seu ensaio, Delfim Sardo estabelece uma comparação entre a obra de Alberto Carneiro e a definição de memória coletiva conceptualizada pelo historiador de arte alemão Aby Warburg, demonstrando que o trabalho desenvolvido pelo escultor resulta de uma «preocupação continuada em relação à pesquisa sobre a paisagem como um lugar de uma evocação [plasmada] em obras como o Canavial: Memória metamorfose de um corpo ausente (1968), Uma Floresta para os teus sonhos (1970) ou Um Campo depois da colheita para deleite estético do nosso corpo (1973/76)» (A Oriente na Floresta de Ise Shima. Alberto Carneiro, 1997). De facto, esta exposição terá ilustrado a capacidade de Alberto Carneiro conseguir, mais do que criar um lugar, «reinventar um espaço simbólico e emocional» capaz de recuperar a «contemplação e pensamento que Warburg atribuía à memória, ao nosso grande arquivo» (Ibid.).

Joana Atalaia, 2018


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Eventos Paralelos

Visita(s) guiada(s)

Encontro com Alberto Carneiro

25 1997
Fundação Calouste Gulbenkian / Centro de Arte Moderna
Lisboa, Portugal

Publicações


Material Gráfico


Fotografias


Periódicos


Fontes Arquivísticas

Biblioteca de Arte Gulbenkian, Lisboa / Dossiê BA/FCG

Coleção de dossiês com recortes de imprensa de eventos realizados nas décadas de 80 e 90 do século XX, organizados de forma temática e cronológica. 1984 – 1997

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00474

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém correspondência interna e externa, recortes de imprensa, convite e textos para o catálogo. 1997 – 1999


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