A Arte do Século XX num Museu Holandês. Museu Municipal Van Abbe, Eindhoven

Realizada a partir de um circuito de itinerância ibérica, a exposição coletiva de arte contemporânea inaugurou na Galeria de Exposições Temporárias da Fundação Calouste Gulbenkian e procurou apresentar um conjunto de 75 obras de 62 artistas modernos e contemporâneos, pertencentes ao Van Abbemuseum, em Eindhoven.
Collective contemporary art exhibition that travelled around the Iberian peninsula, held in Lisbon at the Temporary Exhibitions Gallery of the Calouste Gulbenkian Foundation. The show presented 75 works by 62 modern and contemporary artists from the Van Abbemuseum, in Eindhoven.

Exposição de arte internacional do século XX, realizada a partir de uma seleção de obras pertencentes ao Van Abbemuseum, de Eindhoven, e que correspondeu a um circuito de itinerância ibérica, que incluiu uma apresentação em Madrid, na Fundación Juan March.

A iniciativa partiu do então diretor do museu holandês, Rudolf Herman Fuchs, que visou dar a conhecer a qualidade daquela coleção a públicos estrangeiros. A proposta foi formalmente apresentada por Theda van Royen Oliveira, adida cultural da Embaixada dos Países Baixos em Portugal e intermediária do Van Abbemuseum, que a endereçou à Fundação Calouste Gulbenkian (FCG), considerada a instituição em Portugal em melhores condições para apresentar um conjunto significativo de obras de arte internacional do século XX: «O director do museu Van Abbe, este ano diretor da Dokumenta [sic] de Kassel, que foi membro do júri da Lis’81, contactou esta Embaixada sobre a possibilidade de trazer a exposição em Maio de 1983 para Lisboa, nomeadamente para a Fundação, por ele considerada a única entidade com condições de apresentar e conservar esta importante colecção devidamente.» (Carta de Theda van Royen Oliveira para José Sommer Ribeiro, 21 out. 1982, Arquivos Gulbenkian, SEM 00291)

A proposta foi prontamente aceite pela FCG, que respeitou as exigências da instituição holandesa relativamente à segurança e estabilidade no transporte das obras, recorrendo a veículos equipados com ar condicionado e suspensão. Esta terá sido uma das primeiras ocasiões em que foram consideradas e contratualizadas condições desta natureza.

A constituição da coleção do Museu Van Abbe conheceu orientações distintas entre 1936, ano em que foi criada, e 1983, ano em que um conjunto significativo da coleção foi reunido com a intenção de ser apresentado em circuito internacional. Segundo o então diretor, Rudolf Fuchs, o conjunto de obras reunidas traduziu as afinidades artísticas e geracionais dos sucessivos diretores do museu. A aposta na arte moderna e nas vanguardas do início do século XX começou a refletir-se no acervo do museu a partir de 1946, com a direção de Edy de Wilde, que adquiriu obras de Picasso, Leger, Braque, Chagall, Kandinsky, Beckmann e Kokoschka, determinando «o percurso que o museu seguiria no futuro» (A Arte do Século XX…, 1984, p. 7).

Orientada para a arte internacional, mas também para a arte dos Países Baixos, a coleção foi sendo formada de acordo com as preferências dos seus diretores, o que explica a heterogeneidade de movimentos estéticos do acervo: o abstracionismo, o expressionismo, o construtivismo, o abstracionismo americano, a arte conceptual, a arte minimal, a arte povera, ou o grupo COBRA e o neoexpressionismo.

As 75 obras, de 62 artistas modernos e contemporâneos, foram exibidas na Galeria de Exposições Temporárias da Sede da FCG (piso 0), que foi divida em oito salas, afastando-se assim da solução mais recorrente até então de separar núcleos através de painéis divisórios. Esta montagem pretendia «criar espaços que dessem a ideia ao público português» das «salas do Museu de Eindhoven» e do seu programa museográfico (Ribeiro, JL. Jornal de Letras, Artes e Ideias, 3 jul. 1984).

Todavia, os critérios que orientaram a montagem da exposição não foram unanimemente entendidos pela crítica. Por exemplo, Sílvia Chicó, à data presidente da Secção Portuguesa da Associação Internacional de Críticos de Arte (AICA), manifestou o seu desacordo relativamente à fraca iluminação da sala e à falta de «relação formal e semântica entre as obras», referindo-se igualmente ao «nível médio» das obras de artistas relevantes da arte ocidental do século XX (Chicó, JL. Jornal de Letras, Artes e Ideias, 12 jun. 1984, p. 16).

Em resposta a esta crítica, o diretor do Serviço de Exposições e Museografia da FCG, José Sommer Ribeiro, enviou ao mesmo jornal uma carta contestando a crítica de Sílvia Chicó (que o jornal publicaria sob o título «Crítica sim, demagogia não»), na qual esclarece que o projeto expositivo havia sido discutido entre o curador e o Serviço de Exposições e Museografia da FCG, que anuiu na intenção do curador, apesar da perceção de que não seria a «solução ideal» para aquela sala. Sommer Ribeiro explica ainda que a iluminação seguiu as normas estabelecidas pelo ICOM, e termina discordando da opinião de Sílvia Chicó quanto à qualidade das obras: «Raramente o público de Lisboa terá tido oportunidade de ver obras com a qualidade das que agora se apresentam.» (Ribeiro, JL. Jornal de Letras, Artes e Ideias, 3 jul. 1984)

Igualmente para refutar estas críticas terá o pintor Fernando de Azevedo escrito relativamente à exposição: «Toda uma curiosa potencialidade museográfica pode acompanhar ou explicitar o conteúdo museológico subjacente. Assim, apareceram no espaço da Fundação as soluções inesperadas de Fuchs – Piet de Jonge, conservador do Van Abbe, e nisso surpreenderam bastante gente letrada e não (algo provincianamente surpreendida, diga-se), pouco habituada, de resto, a saber distinguir entre a metodologia museológica e as metodológicas do acaso museográfico, às vezes bem caprichosas.» (Azevedo, Colóquio/Artes, set. 1984, p. 66)

O crítico Alexandre Pomar sublinharia também a originalidade do projeto expositivo, por não ter sido orientado segundo o tradicional percurso cronológico, e manifestaria o seguinte entendimento relativamente às opções curatoriais: «O abandono da cronologia traduz-se na escolha de uma concepção de instalação que privilegia as afinidades temáticas, elementares ou construtivas das obras de arte, propondo uma outra “forma de ver, de compreender e de fruir” a arte contemporânea.» (Pomar, Diário de Notícias, 28 mai. 1984)

Esta mesma atitude elogiosa relativamente à singularidade e acerto da montagem era asseverada por António Cerveira Pinto, que elevava igualmente a dimensão «não funcionalista do espaço», entendendo que se tratava de um procedimento que procurava romper com a tradição moderna da planta livre, enquadrado nos mesmos pressupostos que orientaram a conceção do espaço na importante exposição «Depois do Modernismo», de cuja organização Cerveira Pinto havia sido um dos responsáveis (Pinto, Expresso, 26 mai. 1984).

Para contextualizar as obras patentes e justificar a ligação entre os períodos e correntes estéticas em presença, foi publicado um catálogo elucidativo da heterogeneidade da arte contemporânea, bem como das afinidades improváveis que se poderiam estabelecer entre obras temporal e esteticamente distantes, rompendo-se com a habitual leitura linear.

Filipa Coimbra, 2017


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Publicações


Material Gráfico


Fotografias


Documentação


Periódicos


Fontes Arquivísticas

Arquivos Gulbenkian (Serviço de Exposições e Museografia), Lisboa / SEM 00291

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém convite, orçamentos, ofícios internos, correspondência recebida e expedida, relação de obras, seguros. 1982 – 1984

Arquivos Gulbenkian (Serviço de Exposições e Museografia), Lisboa / SEM-S007-P0144-D00445

7 provas, cor: aspetos (FCG, Lisboa) 1984


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