Os Czares e o Oriente. Ofertas da Turquia e do Irão no Kremlin de Moscovo

Exposição organizada a partir da coleção do Moscow Kremlin State Historical and Cultural Museum, que teve no Museu Calouste Gulbenkian a sua primeira exibição europeia. Com comissariado de Inna Vishnevskaya, Olga Melnikova e Elena Yablonskaya, a mostra integrou um conjunto de 66 peças.
Exhibition featuring a selection of around 66 works from the collection of the Moscow Kremlin State Historical and Cultural Museum curated by Inna Vishnevskaya, Olga Melnikova and Elena Yablonskaya. The show was held for the first time in Europe at the Calouste Gulbenkian Museum.

Exposição organizada a partir da vasta coleção pertencente ao Moscow Kremlin State Historical and Cultural Museum, patente, pela primeira vez na Europa, nas instalações do Museu Calouste Gulbenkian (MCG). Com comissariado científico das conservadoras dos Museus do Kremlin, Inna Vishnevskaya, Olga Melnikova e Elena Yablonskaya, a mostra integrou um notável conjunto de 66 peças oriundas da Turquia otomana e da Pérsia safávida, resultante de oferendas realizadas aos czares russos entre os séculos XVI e XVII.

A vinda desta exposição para Lisboa, depois de ter estado patente na Arthur M. Sackler Gallery, em Washington D.C., em 2009, surgiu de uma relação já iniciada entre as duas instituições em 2010, ano em que o MCG emprestou 25 peças da sua coleção para serem integradas numa mostra em Moscovo dedicada à obra de René Lalique.

«O Kremlin é o local sagrado da nação russa, monumento único da cultura mundial, lugar onde se concentram as relíquias nacionais.» Foi desta forma que Elena Gagarina, diretora-geral dos Museus do Kremlin, se referiu ao icónico complexo fortificado de Moscovo, palco de guerras e de desastres naturais, lugar de inúmeras cerimónias oficiais e de diversas ascensões ao trono de príncipes e czares, e também alvo de cobiça de vários invasores, inclusive de Napoleão Bonaparte (Os Czares e o Oriente. Ofertas da Turquia e do Irão ao Kremlin de Moscovo, 2014, pp. 11-13). Conhecido como a residência oficial do presidente da Rússia, o Kremlin detém um acervo de «valor incomparável», destacando-se o núcleo de armaria, no qual se guardavam as armas luxuosas dos czares e das suas famílias, mas também as ofertas que chegavam do estrangeiro (Ibid.).

Foi uma pequena parcela deste núcleo que integrou a exposição «Os Czares e o Oriente. Ofertas da Turquia e do Irão no Kremlin de Moscovo». Entre as mais de 60 peças expostas encontravam-se tecidos, armas, arreios de cavalos e joias, estas luxuosamente ornamentadas com pedras preciosas e outros adornos, por influência da joalharia produzida no Oriente. Algumas destas peças eram feitas ou restauradas nas oficinas da corte, cujo brilho atingiu o auge no século XVII, até à transferência da capital da Rússia para São Petersburgo, no século XVIII, época em que terminou este trabalho.

Durante o império de Alexandre I, o Tesouro Real foi-se transformando num espaço museológico, refletindo, por um lado, as relações entre a Rússia e os vizinhos Irão e Turquia, e, por outro lado, uma clara preferência pela estética oriental, por esta proporcionar um «luxo visual» que não se via, por exemplo, em peças holandesas ou alemãs, como apontou Olga Melnikova, uma das comissárias científicas («Tesouros do Kremlin mostram trezentos anos da “estética do poder” dos czares», TSF. Rádio Notícias, 27 fev. 2014).

As peças que integraram esta iniciativa foram estrategicamente selecionadas para representarem diferentes «formas, ornamentos, têxteis [...] e motivos decorativos produzidos por estes mestres orientais» (Os Czares e o Oriente. Ofertas da Turquia e do Irão ao Kremlin de Moscovo, 2014, p. 9).

A comissária executiva e conservadora do MCG, Maria Fernanda Passos Leite, referiu que muitas das oferendas aos czares sofreram várias intervenções nas oficinas reais, com o intuito de adaptar as peças ao estilo turco. A influência oriental nos objetos de luxo permaneceu na Rússia até à chegada ao poder de Pedro, o Grande, que impôs o gosto ocidental europeu, «mais civil» e «mais [privado]», explicou Olga Mironova (Ferreira, Público, 28 fev. 2014).

A exposição dividiu-se em quatro núcleos temáticos – «A Horda de Ouro», «O Irão no período safávida», «A Turquia otomana» e «A Rússia dos czares» –, apresentando três grupos dominantes de objetos: religiosos, militares e têxteis. Este último, como referiu João Castel-Branco Pereira, diretor do Museu Gulbenkian (de 1998 a 2014), fazia uma ligação direta com a coleção de têxteis otomanos e tapetes persas adquiridos por Calouste Gulbenkian ao longo da sua vida (Ibid.).

O primeiro núcleo, «A Horda de Ouro», nome atribuído a um dos territórios originários do Império Mogol, que se estendia pelo Cazaquistão, Ucrânia, Bielorrússia, Uzbequistão, Sibéria e Roménia, abria a exposição com as peças mais antigas, como um ícone de Nossa Senhora do Leite, cujo revestimento (oklad, prata decorada) era original do século XIV, ou um anel-sinete também do século XIV, que funcionava na época como um selo pessoal dos khans, descendentes de Gengis Khan, fundador do Império Mogol.

«O Irão no período safávida» incluía peças oferecidas à Rússia pela mão de diplomatas iranianos a partir da segunda metade do século XV. Como os dois países partilhavam interesses comerciais e tinham uma boa relação de amizade, entraram no país vários exemplares de armas, arreios para cavalos ou tecidos decorativos iranianos, fruto de ofertas de dignitários aos czares.

O penúltimo núcleo, «A Turquia otomana», fazia referência às intensas relações comerciais entre os russos e os turcos, bem como às visitas de representantes de patriarcados e episcopados ortodoxos, detalhadamente documentadas. Entre os objetos expostos, figuravam uma taça oferecida por Yuriy Panagiot ao czar Mikhail Fiodorovitch Romanov, em 1632, decorada com jades, ouro, esmeraldas, rubis e safiras, e um relógio de bolso com calendário, do século XVII, igualmente ornamentado com materiais preciosos.

Por último, o núcleo «A Rússia dos czares» encerrava a exposição com peças que se tornaram não só «um elemento essencial da vida oficial e quotidiana da corte moscovita, como também tiveram um impacto significativo na atividade das oficinas do Kremlin». Esta troca de mercadorias espelhava, acima de tudo, a relação pacífica e frutuosa «entre povos de diferentes religiões e tradições» («Os Czares e o Oriente. Ofertas da Turquia e do Irão no Kremlin de Moscovo» [folheto], 2014, Arquivos Gulbenkian, ID: 268382).

O projeto museográfico, que ficou a cargo de Mariano Piçarra, não passaria despercebido, por exemplo, à jornalista Ana Gomes Ferreira, que sinalizou os «expositores amplos, sem fundo, acompanhados de espelhos que jogam com a luz e com os reflexos e tornam a sala de exposições num cofre mágico» (Ferreira, Público, 28 fev. 2014).

O MCG publicou um catálogo profusamente ilustrado, com estudos individuais de cada peça exposta e com uma introdução ao tema redigido pela conservadora-chefe do departamento de têxteis dos Museus do Kremlin, Inna Vishnevskaya.

A exposição foi complementada com o concerto A Idade de Ouro Russa. Música de câmara de Anton Rubinstein e Sergei Taneyev, apresentado pelo Moscow Piano Quartet, interpretado pelos músicos Alexei Eremine, Alexei Tolpygo, Alexandre Delgado e Guenrikh Elessine, e com o recital O Guardador das Canções, pelos músicos Eduarda Melo e Luís Rodrigues, que trouxeram ao MCG diversas obras vocais evocativas do orientalismo e do exotismo associados à exposição.

Até ao dia do encerramento, a exposição recebeu 28 714 visitantes, com uma média diária de 392 visitas. No relatório de balanço final, foram apontados como pontos fortes a qualidade estética da exposição e a riqueza e excelência das peças.

Joana Atalaia, 2019


Ficha Técnica


Eventos Paralelos

Visita(s) guiada(s)

[Os Czares e o Oriente. Ofertas da Turquia e do Irão no Kremlin de Moscovo]

11 mar 2014 – 15 mai 2014
Fundação Calouste Gulbenkian / Museu Calouste Gulbenkian – Galeria de Exposições Temporárias
Lisboa, Portugal
Concerto

A Idade de Ouro Russa. Música de câmara de Anton Rubinstein e Sergei Taneyev

18 mai 2014
Fundação Calouste Gulbenkian / Museu Calouste Gulbenkian – Hall
Lisboa, Portugal
Concerto

O Guardador das Canções

2 mar 2014
Fundação Calouste Gulbenkian / Museu Calouste Gulbenkian – Hall
Lisboa, Portugal

Publicações


Material Gráfico


Fotografias

Conferência de imprensa
Conferência de imprensa. Maria Fernanda Passos Leite (ao centro), Clara Serra (ao centro), Yelena Gagarina (à dir.) e João Castel-Branco Pereira (à dir.)
Conferência de imprensa. Maria Fernanda Passos Leite (à dir.)
Conferência de imprensa. Maria Fernanda Passos Leite (ao centro)
Conferência de imprensa. Yelena Gagarina (ao centro)
Yelena Gagarina e Artur Santos Silva (ao centro) e João Castel-Branco Pereira (à dir.)
Jorge Manuel Barreto Xavier (à esq.), Artur Santos Silva (ao centro), Yelena Gagarina (à dir.)
Yelena Gagarina (de costas), Jorge Barreto Xavier, Nuno Vassallo e Silva e Artur Santos Silva (ao centro)
Yelena Gagarina e Artur Santos Silva (ao centro)
Artur Santos Silva (à esq.), Yelena Gagarina (de costas, ao centro) e Jorge Manuel Barreto Xavier (à dir.)
João Castel-Branco Pereira (ao centro)
Yelena Gagarina (à esq.), Artur Santos Silva (ao centro) e Jorge Manuel Barreto Xavier (à dir.)
Yelena Gagarina (à esq.), Artur Santos Silva (ao centro) e Jorge Manuel Barreto Xavier (à dir)
Yelena Gagarina (ao centro)

Documentação


Periódicos


Fontes Arquivísticas

Arquivos Gulbenkian (Museu Calouste Gulbenkian), Lisboa / MCG 03586

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém troca de correspondência entre o Museu do Kremlin e o MCG, informações sobre a organização da mostra, listagem de peças emprestadas com valores de seguros, orçamentos, apontamentos, material de divulgação, textos para imprensa, programação de visitas orientadas, pedidos de apoio financeiros, comentários à exposição, relatórios estatísticos, convites, programa de concerto, desdobrável, «condition reports», entre outros. 2007 – 2008

Arquivo Digital Gulbenkian, Lisboa / ID: 11118

Coleção fotográfica, cor: aspetos (FCG, Lisboa) 2014

Arquivo Digital Gulbenkian, Lisboa / ID: 10922

Coleção fotográfica, cor: montagem (FCG, Lisboa) 2014

Arquivo Digital Gulbenkian, Lisboa / ID: 11141

Coleção fotográfica, cor: inauguração (FCG, Lisboa) 2014

Arquivo Digital Gulbenkian, Lisboa / ID: 11383

Coleção fotográfica, cor: conferência de imprensa (FCG, Lisboa) 2014


Exposições Relacionadas

Definição de Cookies

Definição de Cookies

Este website usa cookies para melhorar a sua experiência de navegação, a segurança e o desempenho do website. Podendo também utilizar cookies para partilha de informação em redes sociais e para apresentar mensagens e anúncios publicitários, à medida dos seus interesses, tanto na nossa página como noutras.