Daqui Parece uma Montanha. Artistas Contemporâneos Austríacos, Dinamarqueses e Portugueses

Projeto curatorial de Luísa Santos, que reuniu obras de artistas contemporâneos austríacos, portugueses e dinamarqueses. Esta exposição procurou evidenciar a relação com o outro enquanto processo de construção identitária, que foi uma das premissas para pensar as peças selecionadas.
Curatorial project by Luísa Santos which brought together works by Austrian, Portuguese and Danish contemporary artists. The exhibition sought to illustrate the relationship with the other as an identity-building process, one of the basic premises which informed the selection of the works.

A exposição «Daqui Parece uma Montanha. Artistas Contemporâneos Austríacos, Dinamarqueses e Portugueses» foi apresentada no Centro de Arte Moderna (CAM) da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) entre 5 de junho e 21 de setembro de 2014. Ocupou Hall, Sala A, Sala B e Nave do CAM. Inaugurou a 4 de junho, simultaneamente com outras três iniciativas: a retrospetiva de Túlia Saldanha (piso 1); a mostra temática «Arshile Gorky e a Coleção» (piso 01) e a individual «Prospecto. Cenas III, Intervalo e Cena IV», de André Guedes (Sala de Exposições Temporárias e Sala Polivalente).

A nacionalidade dos artistas selecionados foi central na criação do conceito da exposição. Nele se sublinhava que Portugal, Áustria e Dinamarca são três países que, historicamente, foram construindo as suas identidades – culturais, políticas e económicas – numa relação tensa com as respetivas vizinhanças geográficas, ora em aproximação, ora em afastamento dos «gigantes» com os quais fazem fronteira (Daqui Parece uma Montanha, 2014, p. 2).

No título da exposição, a expressão «Daqui Parece uma Montanha» explora idiomaticamente essa relação projetiva com a alteridade – fonte de tantos deslocamentos de perceção e de aceção que têm no próprio observador o seu principal reflexo. Durante o processo de produção, a exposição começou por ter o nome «A galinha da vizinha...» – dito popular que era incompleto, pedindo a resolução que todos conhecemos: «... é sempre melhor que a minha». Para a versão inglesa, foi adotado outro dito de significado equivalente: «The grass is always greener...», que se completa com «... on the other side of the fence».

Embora servindo de ignição para a reflexão, a breve problematização da história dos países foi apenas o pretexto para, nas palavras da curadora Luísa Santos, lançar um «paralelo com a condição humana e a construção de uma série de dicotomias que a caracterizam». Nesse sentido, as obras foram pensadas tendo em conta «binómios» como: «o grande em confronto com o pequeno; […] a ilusão do que o Outro parece ser e o real do que o Outro verdadeiramente é; a relação observador e observado; […] a contradição entre conhecido e desconhecido [,] traduzida pelo desejo de descoberta, de mudança para algo de maior e melhor e, paradoxalmente, a necessidade de refúgios que nos são familiares» (Ibid.).

Os trabalhos apresentados abrem uma miríade de direções dentro deste enorme campo de interrogação, e fazem-no, obviamente, sem passar por um questionamento direto da história das nações enumeradas no título da exposição.

Dalila Gonçalves (1982), Miguel Palma (1964) e Nuno Cera (1972) foram os artistas portugueses representados. Juntando-se-lhes os austríacos Claudia Larcher (1979), Gregor Graf (1976), Katharina Lackner (1981) e os dinamarqueses Ann Louise Overgaard Andersen (1977), Jeppe Hein (1974), Tove Storch (1981) e a dupla AVPD [Aslak Vibæk (1974); Peter Døssing (1974)].

Na imprensa, destaque para a recensão elogiosa de Luísa Soares de Oliveira no jornal Público. Nesse artigo, intitulado «A identidade de David», Oliveira recorre à história bíblica de David e Golias para metaforizar «a construção da identidade em países relativamente pequenos, vizinhos de um gigante poderoso, com o qual a História se fez via conflito e admiração». Como o texto curatorial afirma, essa foi efetivamente a ignição para a reunião de peças que, em boa medida, afirmam as suas próprias interrogações específicas, e nas quais, como reconhece Oliveira, «não existe nenhuma citação política directa, como vem sendo habitual na arte, mas sim obras que trabalham o espaço, o conceito de paisagem, a casa como extensão de si e a identidade do artista» (Oliveira, Público. Ípsilon, 18 jul. 2014).

Todavia, o contexto económico europeu de 2014 não poderia deixar de chamar à colação essa dimensão política, especialmente a partir de um país como Portugal. Relembre-se que decorria a célebre crise financeira, um período de austeridade em que pululavam comparações entre países na opinião pública e, nomeadamente, interpretações que distinguiam, de um modo bastante compartimentado, as economias do norte e as do sul da Europa, arrastando consigo um caudal de preconceitos culturais e socioeconómicos. Embora latentes ou sub-reptícios, esses aspetos não deixaram de ter o seu peso neste projeto expositivo. O texto curatorial indicia-os apenas subtilmente, por exemplo ao dizer: «Fazendo um salto para o tempo social e económico actual, os movimentos migratórios proliferam, na busca de uma realidade melhor. […] Também comum é ouvir os povos usualmente entendidos como estáveis falarem no desejo de uma vida calma num desses países agora em crise, seja pelas condições geográficas, climatéricas ou culturais. A realidade do Outro parece ser sempre objecto de curiosidade e desejo.» (Daqui Parece uma Montanha, 2014, p. 5)

Segundo documentação interna, a exposição terá contado com um total de 24 801 visitas livres, durante os 93 dias em que esteve patente em Lisboa (Relatório final de exposição temporária, 2014, Arquivos Gulbenkian, CAM 00693). A programação paralela contribuiu para essa adesão tão significativa. Segundo o mesmo documento, decorreram 47 visitas com marcação prévia e cinco visitas para público geral.

A primeira iniciativa no âmbito da exposição foi uma conversa com a curadora e os artistas Miguel Palma (1964), Nuno Cera (1972), Ann Louise Overgaard Andersen (1977) e a dupla AVPD a 6 de junho de 2014. Seguiram-se três visitas gerais por Carlos Carrilho, monitor que orientou igualmente uma atividade especificamente dedicada à obra Slide de Katherina Lacker (um «agigantado» chapéu de chuva instalado no Hall do CAM mediante um cabo de aço – obra com a qual os espectadores podiam interagir).

Para os mais novos foi realizada a oficina «Daqui Parece uma Montanha... Será?!», que propôs exercícios de instalação artística, com conceção de Carla Rebelo, Raquel Feliciano, Rita Cortez Pinto e Susana Pires (Agenda Mensal. Fundação Calouste Gulbenkian, jun. 2014, p. 41; jul.-ago. 2014, p. 45). Foi ainda organizada uma atividade para famílias intitulada a «A galinha da vizinha...» (primeiro título provisório da mostra), centrada na leitura de contos «do livro Os ovos misteriosos de Luísa Ducla Soares e composições originais» (Agenda Mensal. Fundação Calouste Gulbenkian, jun. 2014, p. 37).

Após o fecho em Lisboa, a exposição seguiu em itinerância para Roskilde, na Dinamarca, onde seria apresentada no Museet for Samtidskunst, entre 11 de outubro de 2014 a 15 de janeiro de 2015.

Daniel Peres, 2019

The exhibition “Daqui Parece uma Montanha. Artistas Contemporâneos Austríacos, Dinamarqueses e Portugueses” (The Grass is Always Greener. Austrian, Danish and Portuguese Contemporary Artists) was on display in the Calouste Gulbenkian Foundation (FCG) Modern Art Centre (CAM) from 5 June to 21 September 2014. It occupied the Hall, Room A, Room B and the Main Hall of the CAM. Opened on 4 June, it coincided with three other exhibitions: a retrospective of Túlia Saldanha (floor 1); the thematic exhibition “Arshile Gorky e a Coleção” (Arshile Gorky and the Collection) (floor -1) and the André Guedes solo show “Prospecto. Cenas III, Intervalo e Cena IV” (Prospectus, Scenes III, Interval and Scene IV) (Temporary Exhibitions Gallery and Multipurpose Room).

The nationality of the artists selected was central to the concept. The exhibition focused on Portugal, Austria and Denmark, three countries whose cultural, political and economic identities have historically been shaped by tense relations with their geographic neighbours, alternating between periods of closeness and periods of distance in relation to the “giants” with which they share a border (Daqui Parece uma Montanha, 2014, p. 2).

The idiom “the grass is always greener” in the exhibition title explores this projective relationship with otherness, in which shifting perceptions and meanings are primarily a reflection of the viewers themselves. During its production, the provisional Portuguese title of the exhibition was “A galinha da vizinha...” (literally “the neighbour’s hen…”) a popular saying left incomplete (it ends “is always better than mine”). The English version adopted another saying with a similar meaning “the grass is always greener...”, completed by “... on the other side of the fence”.

Although it sparked the reflection, the brief examination of the countries’ histories was, in the words of curator Luísa Santos, simply a pretext for drawing a “parallel with the human condition and the construction of a series of dichotomies that define it”. As such, the works were considered through the optic of “pairs”, such as: “large contrasting with small; […] the illusion of what the Other appears to be and what the Other actually is; the relationship between observer and observed; […] the opposition between known and unknown [,] manifested in the desire to discover, to move on to something bigger and better and, paradoxically, the need for refuge in the familiar” (Ibid.).

The featured works approach this vast sphere of inquiry from several angles, doing so without directly interrogating the history of the countries named in the title of the exhibition.

Portugal was represented by Dalila Gonçalves (1982), Miguel Palma (1964) and Nuno Cera (1972). They were joined by Austrians Claudia Larcher (1979), Gregor Graf (1976) and Katharina Lackner (1981) and the Danish artists Ann Louise Overgaard Andersen (1977), Jeppe Hein (1974) and Tove Storch (1981), as well as the duo AVPD [Aslak Vibæk (1974); Peter Døssing (1974)].

Highlights of the press coverage include a glowing review by Luísa Soares de Oliveira in the newspaper Público. In this article, entitled “A identidade de David”, Oliveira references the Biblical tale of David and Goliath as a metaphor for “the construction of identity in relatively small countries that share a border with a powerful giant, their history being shaped by conflict with and admiration for the latter”.  As the curator’s essay explains, this was precisely the inspiration for bringing together these pieces which, to a great extent, ask their own specific questions and which, as Oliveira acknowledges, “do not contain overt political references, as has become usual in art, but do address space, with the concept of landscape, the home as an extension of the self and the identity of the artist” (Oliveira, Público. Ípsilon, 18 Jul 2014).

However, the economic situation in Europe in 2014 inevitably gave the collection a political dimension, particularly in a country like Portugal. During the infamous financial crisis and the resulting period of austerity, comparisons between countries – in particular overly black and white distinctions between the economies of Northern and Southern Europe – were at the forefront of public dialogue, bringing with them an array of cultural and socioeconomic preconceptions. Though latent or surreptitious, these factors inevitably coloured the exhibition. The curator’s essay references them subtly, for example saying: “Leaping forward to today’s socioeconomic situation, migratory movements proliferate, with people in search of a better future. […]  It is also common to hear people who live in countries considered stable speak of their wish for a quiet life in one of the countries now in crisis, be it for geographic, climatic or cultural reasons. The reality of the Other continues to invoke curiosity and desire” (Daqui Parece uma Montanha, 2014, p. 5)

According to internal documentation, the exhibition received a total of 24,801 free visits in the 93 days it was on show in Lisbon (Final report of the temporary exhibition, 2014, Gulbenkian Archives, CAM 00693). The parallel programming contributed significantly to this engagement. According to the same document, 47 pre-booked and five public tours took place.

The first event to mark the exhibition was a discussion with the curator and the artists Miguel Palma (1964), Nuno Cera (1972) and Ann Louise Overgaard Andersen (1977) and the duo AVPD on 6 June 2014. This was followed by three general tours by Carlos Carrilho, a museum educator who also led an activity specifically focusing on Slide by Katherina Lacker (a “gigantic” umbrella suspended from a steel cable in the Hall of the CAM – a piece that encouraged visitor interaction).

For children, there was a workshop entitled “Daqui Parece uma Montanha... Será?!, designed by Carla Rebelo, Raquel Feliciano, Rita Cortez Pinto and Susana Pires, in which participants worked together to create an art installation (Monthly Agenda. Calouste Gulbenkian Foundation, Jun 2014, p. 41; Jul-Aug 2014, p. 45). Another family activity entitled “A galinha da vizinha...” (taken from the provisional exhibition title), was based on readings of stories “from the book Os ovos misteriosos by Luísa Ducla Soares and original compositions” (Monthly Agenda, Calouste Gulbenkian Foundation, Jun 2014, p. 37).

After it closed in Lisbon, the exhibition toured to Roskilde, in Denmark, where it was on show at the Museet for Samtidskunst from 11 October 2014 to 15 January 2015.


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Eventos Paralelos

Visita(s) guiada(s)

Domingos com Arte

jun 2014 – set 2014
Fundação Calouste Gulbenkian / Centro de Arte Moderna
Lisboa, Portugal
Visita(s) guiada(s)

Uma Obra de Arte à Hora do Almoço

jun 2014
Fundação Calouste Gulbenkian / Centro de Arte Moderna
Lisboa, Portugal
Visita(s) guiada(s)

À Conversa com os Artistas e a Curadora. AVPD, Miguel Palma, Nuno Cera, […], com Luísa Santos

jun 2014
Fundação Calouste Gulbenkian / Centro de Arte Moderna
Lisboa, Portugal

Publicações


Material Gráfico


Fotografias

Tove Storch e Katharina Lackner
Luísa Santos, Jorge Sampaio e Isabel Carlos
Rita Fabiana (à esq.) e Carlos Nogueira (à dir.)
Teresa Gouveia e Artur Santos Silva
Artur Santos Silva e Luísa Santos
Alberto Carneiro e Catarina Rosendo
Matilde Correa Mendes (à esq.), Ana Gomes da silva (ao centro)
Dalila Gonçalves
António Olaio e Liliana Coutinho
Luísa Santos e Artur Santos Silva
Miguel Palma e Luísa Saldanha
Patrícia Nóbrega e Carmo Vieira

Multimédia


Documentação


Periódicos


Páginas Web


Fontes Arquivísticas

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00693

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém convite, maquetes do caderno de exposição, relatórios com estatísticas diversas, plantas com design expositivo e esquemas de montagem de obras expostas, correspondência interna e externa, formulários de empréstimo de obras. 2010 – 2014

Arquivo Digital Gulbenkian, Lisboa / ID: 4329

Coleção fotográfica, cor: aspetos (FCG-CAM, Lisboa) 2014 – 2014

Arquivo Digital Gulbenkian, Lisboa / ID: 4275

Coleção fotográfica, cor: inauguração (FCG-CAM, Lisboa) 2015 – 2014


Exposições Relacionadas

Definição de Cookies

Definição de Cookies

Este website usa cookies para melhorar a sua experiência de navegação, a segurança e o desempenho do website. Podendo também utilizar cookies para partilha de informação em redes sociais e para apresentar mensagens e anúncios publicitários, à medida dos seus interesses, tanto na nossa página como noutras.