Exposição individual do artista português André Guedes (1971). O projeto, concebido para o Centro de Arte Moderna, desenrolou-se em três momentos distintos: «Cena III», «Intervalo» e «Cena IV». Com curadoria de Rita Fabiana, ocupou a Sala Polivalente, a Sala de Exposições Temporárias e o Hall do Centro de Arte Moderna (CAM), compreendendo as vertentes de instalação, filme, performance, fotografia, e outros documentos oriundos de arquivos de coletividades culturais e recreativas da cidade da Covilhã e do Sindicato dos Trabalhadores Têxteis da Beira Baixa.

Vencedor do Prémio União Latina em 2007, André Guedes conta com diversas exposições individuais em Portugal e no estrangeiro desde 1999, desenvolvendo em paralelo um trabalho continuado no campo da performance, do teatro e da cenografia e trabalhando com encenadores como Miguel Loureiro, Miguel Pereira, Vera Mantero e Martine Pisani.

O projeto «Prospecto» iniciou-se na sequência atribuição de uma bolsa de apoio à criação concedida pela Fundación Botín, em 2012/2013, e centrou-se num trabalho de investigação realizado em torno da produção teórica e artística de William Morris (1834-1896), figura proeminente da indústria têxtil e autor de diversos ensaios sobre esta temática.

Foi a partir do ensaio de William Morris «A factory as it might be», publicado pela primeira vez na revista Justice, na edição de abril e maio de 1884, que André Guedes teve a ideia para o seu «Prospecto», apresentando a primeira parte do projeto («Cena I») em janeiro de 2013 na Fundación Botín. A «Cena II» ficou associada ao ensaio «Some hints on pattern-designing» e foi apresentada em 2013 na Galerie Crèvecoeur, em Paris. Nesta «Cena II», o artista «[põe] "em cena" uma primeira construção documental e ficcional em torno dos tecidos de lã e da sua relação com um contexto histórico-sociológico envolvente, seja ele o da fábrica e do tear, o do trabalhador, o do designer ou o do industrial» (André Guedes. Prospecto, Cena III, Intervalo, Cena IV, 2014, p. 3).

A «Cena III», que integrou o filme Planalto / Círculo Aberto Ritmo Liberto (2014), foi o núcleo que permaneceu constante ao longo dos três meses de exposição. O filme, com uma duração de cerca de trinta minutos, é testemunho da criatividade do artista, que nele «realiza uma décalage entre o som, o texto e a imagem», escolhendo como cenário uma central técnica no piso subterrâneo do CAM, onde equipamento novo convive com equipamento obsoleto e desativado (Ramos, Jornal do Fundão, 2014).

Já no átrio, a exposição incluía o objeto-escultura Tempo Livre (Tempo Liberto), feito com largos panos de lã, tecidos entre 1980 e 1990, «na mesma década em que o CAM abriu as portas ao público (1983)», e um mural documental realizado com fotografias e outros documentos provenientes dos arquivos da cidade da Covilhã e do Sindicato de Trabalhadores Têxteis da Beira Baixa, «chamando a atenção para uma história sem nomes, feita de gestos, de pequenas e de grandes ações, políticas ou pessoais, individuais ou coletivas» (André Guedes. Prospecto, Cena III, Intervalo, Cena IV, 2014).

O segundo momento, «Intervalo», foi marcado pela interação com o público a partir da projeção de vários filmes selecionados por André Guedes. Este evento teve lugar na Sala Polivalente do CAM no dia 19 de julho de 2014.

O último momento, «Cena IV», fechou este «Prospecto» com uma performance concebida e dirigida pelo artista, que resultou de uma «exploração que André Guedes tem vindo a realizar sobre a dramatização de textos não concebidos originalmente para a cena, num vaivém entre fontes documentais da e sobre a indústria têxtil da Covilhã, mas também textos literários e outros ensaios que acompanham o processo de construção da exposição» (André Guedes. Prospecto, Cena III, Intervalo, Cena IV, 2014, p. 2).

Esta performance, que teve lugar no dia 20 de setembro de 2014 na Sala Polivalente do CAM, contou com a colaboração do coreógrafo Miguel Pereira, de cinco atores e três bailarinos, e com a participação, ainda que indireta, do artista, poeta, ensaísta e engenheiro têxtil E. M. de Melo e Castro, através da apresentação de quatro videopoemas da série Signagens (1985-1989).

Distribuída em dois blocos (uma sala com os vídeos de Melo e Castro; outra sala maior onde aconteceram as danças e a leitura de textos), a performance incluiu diversas linguagens, como o vídeo, a escultura, a instalação, o teatro, a dança e a música. A folha de sala que acompanhou este evento foi inspirada, de acordo com André Guedes, no evento de Merce Cunningham A Program of Dances, de 1948.

A leitura de textos centrou-se num diálogo em que o artista dá vida a quatro tecidos, que «respondem» às perguntas de um entrevistador, abordando diferentes aspetos da sua identidade.

Além do caderno de exposição que acompanhou a exposição, o CAM publicou uma obra concebida por André Guedes com o propósito de complementar a mostra com excertos de textos de Domingos Vaz, E. M. de Melo e Castro, Fiama Hasse Pais Brandão, Richard Sennett e William Morris, que focam diversos aspetos da indústria dos lanifícios. A publicação é enriquecida com fotografias que contam um pouco da história do setor têxtil da Covilhã.

Joana Atalaia, 2019