Camargo. Esculturas

Exposição individual e retrospetiva do artista brasileiro Sérgio Camargo (1930-1990), integrada num projeto internacional que visava homenagear o artista precocemente falecido em 1990. Esta mostra seria a primeira grande exposição de Sérgio Camargo em Portugal, depois de ter tido uma pequena exposição individual, em 1988, na Galeria 111.
Solo retrospective exhibition of the work of Brazilian artist Sérgio Camargo (1930-1990) included in an international project paying homage to the artist after his untimely death in 1990. The show, which would be the first large exhibition on Sérgio Camargo held in Portugal, originated as a small solo exhibition staged in 1988 at Galeria 111.

Exposição individual e retrospetiva do artista brasileiro Sérgio Camargo (1930-1990), em que foram apresentadas cerca de 90 esculturas. A iniciativa da realização desta mostra partiu do Gabinete de Arte Raquel Arnaud (representante do artista desde 1990), visando homenagear o percurso artístico de Camargo, um artista fulcral no contexto brasileiro da segunda metade do século XX, juntamente com nomes como Hélio Oiticica (1937-1980), alvo de uma exposição na FCG em 1993, e Lygia Clark (1920-1988).

Patrocinada pela empresa brasileira de telecomunicações Embratel, e contando com o apoio da Embaixada Brasileira em Portugal, bem como do Instituto Herbert Levy, o projeto de apresentação da exposição internacional foi concebido e aprovado pelo Ministério da Cultura brasileiro, enquadrando-se igualmente num conjunto de ações de promoção da cultura brasileira no exterior.

Para esse efeito, foi criada uma comissão consultiva, composta por figuras relevantes da sociedade e do panorama cultural brasileiros: Celso Lafer, Fernando Henrique Cardoso (que viria a ser presidente da República Brasileira entre 1995 e 2002), Gilberto Chateaubriand, Jens Olesen, José Mindlin, Luiz Fernando Levy e Tito Enrique da Silva Neto.

A produção desta mostra internacional começaria a definir-se em 1991, pouco depois do falecimento do artista em 1990, procurando que a itinerância em Lisboa se iniciasse em 1993, de forma a estabelecer uma relação com a apresentação de uma mostra dedicada a Camargo na Bienal de Veneza desse ano, devido à sua repercussão mundial. Todavia, o projeto foi sofrendo atrasos, como esclarece Raquel Arnaud numa carta endereçada a José Sommer Ribeiro, a 14 de janeiro de 1994: «Devido às constantes mudanças governamentais no Brasil, a aprovação do projeto pelo Ministério da Cultura retardou mais do que prevíamos os nossos planos e objetivos.» (Arquivos Gulbenkian, CAM 00348)

Assim, a exposição em Lisboa seria apenas inaugurada a 10 de novembro de 1994, terminando a 20 de janeiro de 1995, no espaço do Centro de Arte Moderna (piso 1). Inicialmente, estava planeado ser José Sommer Ribeiro a assumir a curadoria da exposição, contudo tal não se veio a verificar, ficando o trabalho curatorial a cargo do britânco Guy Brett e do brasileiro Ronaldo Brito. Terminada em Lisboa, a exposição seguiria para Oslo, onde seria apresentada no Henie-Onstad Kunstsenter, entre fevereiro e março de 1995; posteriormente, no Charlottenburg Museum, Copenhaga, entre maio e julho, e no Stedelijk Museum Schiedam, Holanda, entre setembro e outubro do mesmo ano. Inicialmente estavam igualmente programadas itinerâncias em Londres e Paris, respetivamente na Tate Gallery e no Musée d'Art Moderne de Paris; contudo, de acordo com carta de Guy Brett a Raquel Arnaud, foram procuradas outras alternativas a estes museus, nomeadamente galerias como Whitechapel e Serpentine Galleries, em Londres, ou Jeu de Paume, em Paris (Arquivos Gulbenkian, CAM 00348).

Esta exposição pretendeu destacar a importância de um artista fulcral no contexto da arte brasileira da segunda metade do século XX, particularmente devedor do movimento neoconcretista das décadas de 50 e 60, e que desde cedo assumiu um percurso singular: com 16 anos estudou com Lucio Fontana (1899-1968); aos 18 anos viajou para Paris, onde estabeleceu contactos com os escultores Constantin Brancusi (1876-1957) e Hans Arp (1886-1966); estudou na Sorbonne, onde foi discípulo do filósofo Gaston Bachelard (1884-1962); e na École Pratique des Hautes Études foi aluno do historiador de arte Pierre Francastel (1900-1970).

Esta diversidade de influências revelou-se na forma como combinou uma forte componente reflexiva no seu trabalho, interessando-se pelas questões da filosofia e da sociologia, ao mesmo tempo que explorava os conceitos de plano e volume, caros ao círculo artístico brasileiro que o viria a rodear. Como afirmou Guy Brett: «Camargo vivia e conhecia em alto grau tanto o aspecto sensorial quanto o aspecto intelectual da arte, mas o traço da sua personalidade que mais me atraía eram a sua “sabedoria do mundo”.» (Camargo. Esculturas, 1994, [s.p.])

Na realidade, a produção artística de Camargo sempre se opôs a uma visão académica e formalista da arte, estabelecendo uma relação com a sociedade que se revelava na sua «sabedoria do mundo», muitas vezes assumindo uma visão irónica face aos problemas do mundo. Há que ter em conta que em 1964 o Brasil sofreu um golpe militar, contribuindo para o clima de ditadura militar vivido durante duas décadas e que terminaria apenas em 1985.

Por outro lado, esta visão do mundo era acompanhada por um diálogo artístico assente na geometrização das formas, onde noções de volume e plano assumem uma preponderância extrema. Aliados a esta investigação sobre a multiplicação do volume em planos, motivo recorrente na obra escultórica de Camargo, surgem conceitos como a serialidade, a repetição e a aleatoriedade, motivo pelo qual as suas obras se assumem como não-composições.

Na obra de Camargo, estabelece-se uma relação entre natureza e cultura, em que a intervenção de forças naturais se combina com a ação humana, o resultado de uma construção cultural. Essa relação revela-se nas escolhas do artista: «[…] ideia de que as forças naturais (electricidade, vento, luz, etc.) levariam a expressão da obra além das escolhas feitas pelo artista.» (Ibid.) Esta ligação aos elementos da natureza é ainda mais clara quando temos em conta que o material de eleição da produção escultórica de Sérgio Camargo foi o mármore branco.

A singularidade da obra produzida por Camargo garantiu-lhe reconhecimento nacional e internacional desde 1955 até à data da sua morte, tendo sido representado nas Bienais de São Paulo, Veneza e Paris, bem como na IV Documenta de Kassel. A título de exemplo, em 1963 a sua famosa série Relevos Brancos conquistou o primeiro prémio na Bienal de Paris, tendo sido igualmente premiada na Bienal de São Paulo.

A exposição em Lisboa apresentou cerca de 90 trabalhos escultórios ilustrativos da carreira do artista, tendo o projeto expositivo ficado a cargo da empresa especializada Expomus – Exposições, Museus e Projetos Culturais. Foi publicado um catálogo, com o apoio da Fundação Banco do Brasil, procurando dar a conhecer o processo criativo do artista, através de textos dos curadores da exposição, Guy Brett e Ronaldo Brito, e, especialmente, dando a possibilidade ao leitor de «entrar» no ateliê do artista, através do amplo registo fotográfico que favorece a compreensão das noções de serialidade e repetição no seu trabalho.

A inauguração contou com a presença dos curadores, bem como de personalidades relevantes na cena cultural e artística brasileira, como o crítico e historiador Paulo Sérgio Duarte, Franklin Pedroso, Aspásia Camargo, a viúva do artista, o poeta e jornalista Gerardo Mello Mourão, a escultora Maria Carmen Perlingeiro e Raquel Arnaud.

Paralelamente à inauguração da exposição, no dia 11 de novembro realizou-se uma mesa-redonda dedicada à obra de Camargo, contando com a participação de Catherine David, curadora do Jeu de Paume, onde chegaria a realizar uma exposição dedicada ao artista brasileiro Hélio Oiticica, amigo de Camargo, bem como Guy Brett, Ronaldo Brito, Rui Sanches, diretor-adjunto do CAMJAP, Paulo Sérgio Duarte, Jacques Leenhardt, presidente da Associação Internacional de Críticos de Arte, e Per Hovdenakk, diretor do Henie-Onstad Kunstsenter.

Esta exposição seria a primeira grande mostra de Sérgio Camargo em Portugal, depois de o artista ter tido uma pequena exposição individual, em 1988, na Galeria 111.

Patrícia Simões, 2019


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Eventos Paralelos

Mesa-redonda / Debate / Conversa

[Camargo. Esculturas]

11 nov 1994
Fundação Calouste Gulbenkian / Edifício Sede – Zona de Congressos
Lisboa, Portugal

Publicações


Material Gráfico


Fotografias


Documentação


Periódicos


Fontes Arquivísticas

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00348

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém documentação relativa à organização do projeto internacional, lista de obras, seguros, correspondência, convite e documentos sobre transporte. 1991 – 1995

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM-S005/01/01-P0175/01-D02761

Coleção fotográfica, cor: inauguração (FCG-CAMJAP, Lisboa) 1994

Arquivo Digital Gulbenkian, Lisboa / ID: 116069

Coleção fotográfica, cor: aspetos (FCG-CAMJAP, Lisboa) 1994

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM-S005/01/01-P0175/01-D02762

Coleção fotográfica, cor: montagem (FCG-CAMJAP, Lisboa) 1994


Exposições Relacionadas

Aparício

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1984 / Sede Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa

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