Dizer “o indizível” através da escrita. Pelo fim do silêncio na violência doméstica
Papel e caneta são as armas da Associação Coolabora para ajudar mulheres a ultrapassar situações traumáticas.
Através do projeto Rasgar Silêncios, inserido no terceiro eixo do programa Cidadãos Ativos, gerido pela Fundação Gulbenkian e pela Fundação Bissaya Barreto, esta associação recorre à escrita para chegar às memórias mais silenciadas.
São oficinas de escrita para mulheres que um dia foram vítimas de violência doméstica, conseguiram sobreviver e sair da situação de risco. Ainda que comecem a recuperar a vida normal, as cicatrizes que a violência deixa são difíceis de apagar e a escrita pode ser uma ajuda preciosa.
“Permite dizer aquilo que é indizível”, explica Graça Rojão, gestora do projeto Rasgar Silêncios. “É uma forma de libertar esses fardos e superar a dor.”
Por outro lado, a escrita permite “aliviar a tensão que o silêncio gera, uma vez que também não é propriamente um espaço vazio: é um espaço com vozes, por vezes até muitas ruidosas, com memórias que gritam e se sentem aprisionadas”.
Com a escrita autobiográfica estas mulheres tentam resolver os traumas do passado, mas através de “cartas fictícias” também podem ajudar os profissionais que lidam com a violência doméstica.
Em missivas dirigidas a profissionais de saúde, das forças segurança ou do sistema judicial mulheres acompanhadas na sequência de um caso de violência doméstica descrevem como se sentiram tratadas e que dificuldades tiveram.
Tanto podem ser cartas elogiosas como críticas – acima de tudo são úteis, garante Graça Rojão. “Com esse material fazemos ações de formação para estes profissionais”, explica.
Através da análise destes textos é possível estudar “as raízes da violência doméstica de e de género” e das desigualdades entre homens e mulheres, mas também criar empatia “para facilitar o processo de se pôr no lugar do outro”.
Escrever é uma forma de libertar mágoas e memórias dolorosas, mas enfrentar uma página em branco nem sempre é fácil. Graça Rojão assume que “escrever é um ato difícil e colocar no papel memórias é um ato muito exigente, mas também libertador”.
“É a própria pessoa que se reconstrói e que cria assim também uma autonomia. Ainda que seja um processo muito exigente, tem resultados que vão até ao nível mais profundo daquilo que a pessoa é e da consciência que tem de si mesma.”
Além das oficinas de escrita para cerca de 50 mulheres na zona da Covilhã, o projeto Rasgar Silêncios vai também criar um espetáculo de teatro multimédia para consciencializar a comunidade para o tema da violência doméstica.
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