- 1961
- Tela
- Colagem e Óleo
- Inv. 83P448
Paula Rego
Sr. Vicente e a sua Esposa
“O período que se seguiu ao encontro com Dubuffet foi extremamente produtivo para Paula. (…) Na excitação desta redescoberta, que a pôs de novo em contacto com o espírito intuitivo que a impulsionara a desenhar histórias para seu prazer, começou a fazer um quadro por dia, e pela primeira vez, a incorporar colagens. A princípio, as imagens provinham de revistas, mas quando não encontrava a imagem requerida, pintava-a ou desenhava-a, e depois, cortava-a.”*
Efectivamente, este quadro enquadra-se numa fase da produção da artista onde encontramos obras com características similares: Retrato de uma Senhora (1959), Refeição (1959), Provérbio Popular (1961), Quando tínhamos uma casa no campo (1962) ou Aurora Latina (1962). Em todas elas, observamos afinidades relativamente aos materiais e técnicas (colagem e óleo sobre tela) e ao tipo de composição.
Na obra O Senhor Vicente e a sua Esposa (1961), a artista recorre a recortes de jornais, de papel craft, de vinhetas de banda desenhada, de desenhos da sua autoria, de papéis manuscritos, de trechos de obras literárias, intercalando, sucessivamente, o acto de desenhar, pintar, recortar e colar. A obra é assim estruturada como um palimpsesto, emergindo através da cumulativa adição de camadas num processo que parece pensar-se (e deleitar-se) no próprio acto de se ir fazendo. Deste modus operandi resulta uma característica particular da obra: uma textura evidente, adicionando uma dimensão táctil à visual.
Ainda que figurativa (dimensão corroborada pelo título narrativo), a obra assume uma bidimensionalidade directamente derivada do seu processo de realização: a sucessiva adição de colagens. Sobre um fundo em tons terrosos e azulados, a composição estrutura-se em torno de dois eixos. Do lado esquerdo, destacando-se pelo contraste cromático, temos o grupo figurativo de maiores dimensões, onde parece distinguir-se a representação da cabeça de um homem com barba (o Senhor Vicente?**); do lado direito da composição, sobressaindo também cromaticamente em relação ao fundo, observamos uma figuração de menores dimensões (a esposa?).
Para além desta apreciação da composição em “plano geral”, necessário é que façamos um “close up”, pois a obra convoca essas duas escalas de percepção. Assim, se nos aproximar-mos do grupo do lado esquerdo, notamos como ele é composto por uma plêiade de diversos elementos de pequena escala: papéis manuscritos, recortes de banda desenhada, recortes de imprensa, recortes de diversos desenhos de corpos femininos. Se nos aproximarmos da figura do lado direito, observamos uma configuração semelhante, ainda que com maior presença do desenho (traços circulares a grafite, riscos a pastel e a óleo) e menor elaboração. A ligar os dois grupos, um discreto traço amarelo na parte inferior da composição — colorindo recortes sobre uma suposta crónica da expansão portuguesa — e a direcção do olhar da figura do grupo da esquerda.
Palimpsesto sinestésico que nos convida a um permanente afastamento e aproximação, na descoberta de novos elementos e na contínua invenção de possíveis significados.
* John McEwan, , Paula Rego, Lisboa, Galeria 111/Quetzal Editores, 1998, p. 67
** Em depoimento por correspondência electrónica, datada de 13.03.2014, Paula rego explica que o mencionado Sr. Vicente era a pessoa que então lhe vendia as obras.
Luísa Cardoso
Julho 2014
Tipo | Valor | Unidades | Parte |
Largura | 90,5 | cm | suporte |
Altura | 90,5 | cm | suporte |
Profundidade | 3,5 | cm | moldura |
Largura | 100,5 | cm | moldura |
Altura | 101 | cm | moldura |
Tipo | assinatura |
Texto | P.F.R. |
Posição | frente, canto superior direito |
Tipo | data |
Texto | 61 |
Posição | frente, canto superior direito |
Tipo | Aquisição |
Data | Julho 1983 |