Federico Fellini – que tinha, segundo os autores de Lisboa, “Cidade Triste e Alegre”, «uma maneira de ver a realidade sem preconceitos» – lamentou um dia numa entrevista: «Nunca vi um pai curvar-se para o filho e perguntar o que ele faz, o que deseja, o que acha do gato, como vai a chuva, o que sonhou na noite passada e por que tem medo»*. Como o cinema, a fotografia oferece por vezes um desmentido desta constatação. Embora não figure no livro, esta imagem partilha com as fotos reproduzidas nas primeiras páginas de Lisboa o olhar atento à infância – particularmente com a imagem da menina observando o espectáculo no Coliseu: «No mundo misterioso das crianças há por vezes estes momentos de completa absorção», escreveram os autores nas notas finais do Índice. Na outra ponta do livro, Rodrigues Miguéis notava a presença das «fisionomias atentas» das crianças, lamentando a impossibilidade de preservar o seu vigor. A imagem pode reforçar mas também pode dissolver a sentença do escritor. Existem vários exemplos fotográficos célebres sobre os actos da visão; neste caso, a absorção e o desejo parecem palpáveis, como se a lente fotográfica se tivesse curvado para interrogar ou seguir os seus modelos.

* Entrevista de Giovanni Grazzini

LH