A crítica da arte despertou em António Areal uma intensa produção escrita, mas foi acima de tudo usada como método de criação artística. O precoce interesse em desconstruir imagens na sua obra, leva-o assim sistematicamente a escolher o motivo plástico de caixas e de cubos para as suas representações pictóricas e para construir objectos tridimensionais. O cúmulo destas experiências teria lugar na exposição de Areal na Galeria Quadrante em Lisboa (1969), onde apresentou esta caixa junto a outras nove iguais, esvaziadas ou com pequeníssimas formas, mas em todos os casos acompanhadas de longos títulos estéticos e filosóficos.

Paisagem: no primeiro plano uma casa numa colina. Ao fundo, no lado direito, chove copiosamente, no seu sugestivo desacordo entre título e conteúdo, é um momento-chave na longa e provocatória reflexão de Areal acerca das categorias artísticas e da linguagem como forma de expressão plástica. Emoldurar o nada permitia apagar os vestígios da presença autoral, afastando-se da invenção formal e do manuseio de materiais, para deixar a obra como receptáculo ao que observador nela quiser projectar – enquanto “exercícios espirituais”, como Areal pretendia. Assim, por momentos, as suas pesquisas neo-figurativas e abstractas transferiam-se para a arte imaterial, que tinha aliás um importante precedente na obra de Yves Klein, que na sua histórica exposição “Le Vide” (1958) decidiu esvaziar uma galeria de Paris, deixando apenas uma semelhante vitrine sem nada lá dentro. Albert Camus escreveu então, “avec le vide, les pleins pouvoirs”.*

 

AR

 

Fevereiro de 2011

 

* “Com o vazio, abrem-se todas as possibilidades”. Nota escrita no livro de visitas da galeria.