João Penalva

Lisboa, 1949

Formado em ballet clássico, João Penalva percorreu os palcos europeus como bailarino profissional e cenógrafo, trabalhando junto de eminentes coreógrafos (Pina Bausch, Gerhard Bohner) antes de decidir fixar-se em Londres (1976), cidade que o acolhe desde então, onde estudou belas-artes na Chelsea School of Art e passou a entregar-se exclusivamente à pintura. Ao longo da década seguinte, estabeleceu-se como pintor neo-expressionista, aclamado em Portugal e no Reino Unido, embora nos anos 90 se tenha aberto a uma progressiva diversificação e complexificação das linguagens artísticas usadas, explorando o vídeo, a instalação, a fotografia, a música, e correlacionando imagem, texto e linguagem em função do valor central duma narratividade – construindo-a e desconstruindo-a, alternadamente. João Penalva vive e trabalha em Londres, e, desde 2002, mantém o cargo de professor externo na Academia de Arte de Malmö da Universidade de Lund, Suécia.

João Penalva iniciou a sua carreira artística como bailarino profissional (1968-1976), estudando em Lisboa, Paris e Londres e integrando as companhias de Pina Bausch (1973-1974), Gerhard Bohner (1975) e outra que formou com Jean Pomares (The Moon Dance Company, 1976). Ainda chegou a trabalhar como cenógrafo, mas decidiu mudar-se para Londres e estudar artes plásticas na Chelsea School of Art, onde concluiu licenciatura e mestrado (1976-1981) auferindo duma bolsa da FCG (1978-1980). A pintura passa a ocupar por exclusivo a sua criação artística, embora sem obliterar a anterior formação técnica. Aliás, o método coreográfico de Merce Cunningham provou ser de facto pictoricamente decisivo, «foi esse sistema racional» – confessou Penalva – «que veio marcar o resto da minha vida de artista.»* Aplicando essa concepção anti-narrativa e uma descomplexada mistura de linguagens figurativas e abstractas, as suas telas eram arranjadas ritmicamente através da disparidade de elementos decorativos e de signos geométricos, abstractos ou caligráficos que criam jogos de contraste ao nível das cores, texturas e padrões, na rédea solta própria do gestualismo neo-expressionista. Foi com estes quadros que Penalva se estreou em mostras individuais na SNBA (Lisboa, 1983) e na Galeria Roma e Pavia (Porto, 1983).

 

Os anos 90, que abrem com uma exposição seminal da pintura de Penalva no CAM (1990), trariam nova viragem artística. Considerando que a pintura, por si só, não cumpria a desejada complexidade e densidade narrativa, Penalva foi recorrendo a outras práticas e linguagens artísticas, recuperando a sua experiência inicial com o teatro e a coreografia para explorar o filme, o vídeo, o texto e a instalação. Desde então, João Penalva assume-se acima de tudo como um «contador de histórias», interessado em desafiar a realidade com a imaginação, e empenhado em construir e desconstruir estruturas narrativas através da combinação de sons, imagens e textos (escritos e orais). Estes elementos narrativos funcionam – tal como na sua pintura – por justaposição ou por disjunção, sendo montados em instalações de grande escala e com vários suportes, ou em obras íntimas com filmagens e projecção de slides, desenho e pintura, que têm por ponto de partida a fotografia, a linguagem, o objecto, o teatro, ou o vídeo – que de início surge subjugado à instalação, mas vai evoluindo como produto autónomo de reflexão cinematográfica, dominante em anos recentes.

 

As narrativas visuais e literárias deste modo elaboradas assumiram pois duas vertentes distintas: ora partindo de referentes específicos da ficção e da realidade, dissecando os discursos com referências tiradas da literatura e da história da arte; ora partindo de lugares e situações que escapam a um reconhecimento no tempo e no espaço, transfigurados em espaços inefáveis, em ficções de contemplação, tendência que se vem acentuando mais nos últimos anos. Enquanto a primeira nasce de uma investigação artística e da procura documental acerca do evento primordial, colhendo documentos, memórias, relatos e histórias, e de um trabalho constante a partir de materiais concretos encontrados ao acaso (objets trouvés), a segunda operação delimita um território no qual se pretende anulado o tempo e o espaço, apostando na ambiguidade e no desfoco, em filmes cujas vozes de narrador estão em línguas imprevistas (russo, japonês, sueco), ou em fotografias onde tudo vive num estado de limbo, mostrando fisionomias de objectos misteriosos e indeterminados. A ambivalência deste trabalho é também evidente nas suas séries de livros de artista que conciliam os dois pólos em tensão, tanto usando imagens que foram retiradas do seu arquivo ecléctico, como fotografias suas do movimento das nuvens e das ondas.

 

O trabalho de Penalva encontra-se centrado em estratégias de visualidade – como esta é criada, transmitida e recebida –, que em muito depende da sua forte intervenção artística na prática curatorial das exposições individuais, numa clara decisão programática de interrelacionar as suas obras e de garantir que o público nelas se envolva performativamente, relacionando-se com a disposição coreografada dos objectos, do mesmo modo que nas suas fotografias os textos com narrativas e personagens convidam o observador a associar as palavras às imagens, uma forte aposta na hipernarratividade das suas obras, graças à qual Penalva consegue que os terrenos da narrativa e da ficção galguem as margens da realidade.

 

João Penalva representou Portugal na XXIII Bienal Internacional de São Paulo (1996) e na XLIX Bienal de Veneza (2001). Expôs também na I Bienal Internacional de Melbourne (1999), na Berlin Biennale 2 (2001) e na Bienal de Sidney (2002). Foi artista convidado do programa de residências Les Récollets (Paris, 2005) e da DAAD (Berlim, 2003-2004), e ganhou o Bryan Robertson Award (Londres, 2009). Após uma década de exposições individuais cada vez mais frequentes e espalhadas pelo mundo, viajando por Vilnius, Londres, Innsbruck, Glasgow, Malmö, Milwaukee, Toronto, Budapeste, Berlim, Paris, Munique ou Perth, são apresentadas retrospectivas de João Penalva no CAM (2011) e na Brandts Kunsthallen em Odense, Dinamarca (2012).

 

 

* “Diálogo entre João Fernandes e João Penalva” in João Penalva, Porto: Fundação de Serralves, 2005, p. 12.

 

 

Afonso Ramos

Junho de 2011

 

 

Atualização em 23 janeiro 2015

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