Sem título
De uma sequência de pinturas realizadas no início da década de 1970, conservadas na Coleção Moderna, esta pintura de José Escada obedece a uma linguagem ornamental, com a economia da cor – restringindo-se à combinação de três tons: verde olivina, preto e amarelo pálido. O motivo principal, um nó ou corrente cruzada, desenha um grande «S» ou duplo «S» ou «8», com anéis e perfis de cremalheira frisada em verde e preto. Este motivo contrasta com dois focos de luz sugeridos pelo amarelo pálido formando como dois leques ou conquilhas simétricas, o «coração» desta imaginária arte heráldica. É uma luz diáfana e misteriosa, parecendo brotar de uma fonte indefinida, interna e, simultaneamente, distante. O fundo é o campo preto de onde o monograma parece desenhar-se em relevo de acordo com uma estrutura cruciforme. Originando uma unidade completa e fechada, estes elementos visuais poderiam constituir um módulo de padrão – escudo ou emblema. Constituem pois elementos de uma gramática de antigos metalúrgicos, uma espécie de florão, glifo ou marca de fundidor com a qual o artista recriou para si uma identidade. Podemos considerar esta imagem sob o ponto de vista da variação sobre as figuras serpentiformes das correntes, dos cordões ou das amarras, temas sobre os quais José Escada se debruçou ao longo da sua carreira, desde meados dos anos de 1960 até ao final da vida. Esta obra foi – com outras três do mesmo ciclo e período – apresentada numa exposição antológica dedicada ao artista organizada no Centre Culturel Portugais da Fundação Calouste Gulbenkian, em Paris, em 1991.
Ana Filipa Candeias
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