Construção orgânica
A preferência de Calouste Gulbenkian por motivos decorativos inspirados na natureza manifesta-se muito cedo através das cerâmicas de Iznik que adquiriu, e das extraordinárias criações de René Lalique, de quem foi um dos primeiros admiradores. A natureza em Lalique materializa-se através dos diferentes materiais utilizados, uns nobres outros inesperados, desenvolvendo uma gramática própria, singular mesmo, muitas vezes orgânica.
Calouste Gulbenkian, pela relação privilegiada que estabeleceu com o mestre da Arte Nova, reuniu um conjunto de desenhos preparatórios para joias que viria a adquirir, muitos deles oferecidos pelo próprio artista. Alguns desses desenhos revelam o método de trabalho do joalheiro, contendo a inscrição de diferentes perspetivas, enquanto outros parecem sugerir projetos acabados. Foi na tentativa de documentar obras da coleção que a Fundação Calouste Gulbenkian adquiriu alguns desenhos de Lalique surgidos no mercado francês em finais da década de 1990 e no início do novo século. Esta não é uma prática frequente, uma vez que a coleção reunida por Calouste Gulbenkian é uma coleção fechada, tendo como limite temporal o ano da sua morte (1955). Estes desenhos partilham com os trabalhos de Alexandre Conefrey, executados em 2007, em grandes folhas de papel que sugerem páginas de um álbum de botânica, o gosto pelo natural. Todavia, a fidelidade às espécies não parece tão determinante em Conefrey como em Lalique, recorrendo o primeiro a títulos que encerram enigmas inscritos no vazio da folha, contrariando os códigos da representação. O desenho, como arte autónoma, em Conefrey constrói uma identidade própria na matéria que lhe serve de suporte, enquanto em Lalique constitui um capítulo intermédio na concretização dos seus objetos de joalharia, ou é a ilustração do próprio projeto executado.
João Carvalho Dias, curador
The Lalique drawings make more than one connection. We placed them at the later end of the exhibition because they were only bought recently. Just as with some of the works at the other end of the show, especially the paintings, which were bought at around the same time, even though they are years apart, here at this end we have things bought with the eye of the present.
The founder’s collection is usually described as closed, but that is not 100% the case. If relevant material, relating to that which is already in the collection, becomes available, it may very occasionally be bought. This was the case with these studies by Lalique, which relate very closely to pieces on show in the museum. They were bought around the same time as the drawings by Alexandre Conefrey, and the reason to put them together is less about the dating than about the way they use nature on the page. Lalique was tremendously inspired by the way plants grow, and often used their shape and structure as a basis for his own creations. Lalique’s work is often based in symmetry, and even if Conefrey’s drawings are not quite so symmetrical, they too arrange the plant and its stalks across the page, marking out a kind of space which hints at the shallow space occupied by a plant, or by a piece of jewellery.
Penelope Curtis, curator