Os medalhões de Abuquir
A coleção de numismática de Calouste Gulbenkian abrange exclusivamente moedas gregas dos períodos arcaico, clássico e helenístico (c. 650-30 a. C.). Os onze medalhões de Abuquir são, por isso, exceções: apesar de terem sido concebidos no norte da Grécia e de apresentarem inscrições em grego antigo, remontam ao século III d. C., altura em que a região se encontrava sob o domínio do Império Romano.
Embora Gulbenkian soubesse que os medalhões não se enquadravam na sua coleção, estava determinado a adquiri-los. Como se pode verificar pela sua correspondência com Stanley Robinson, seu consultor e membro do Departamento de Moedas e Medalhas do British Museum, Gulbenkian pensava que os medalhões datavam do século I a. C.; quando a sua datação foi corrigida, sugeriu que talvez combinassem com a sua coleção de medalhas do Renascimento. Ainda que Robinson o tenha informado de que os medalhões eram tão diferentes das suas medalhas quanto das suas moedas, Gulbenkian afirmou que eram muito bonitos e que os compraria na mesma.
As peças foram encontradas por acaso em Abuquir, no Egito, em 1902, e faziam parte de um conjunto de vinte medalhões, seiscentas moedas de ouro e cerca de vinte lingotes gravados. Eram muito raros entre os objetos do mundo antigo, podendo ser comparados com apenas três outros medalhões, conservados atualmente em Paris e encontrados no Tarso, onde hoje se situa a Turquia.
No entanto, enquanto os medalhões do Tarso só têm imagens numa das faces, os exemplares de Abuquir são gravados dos dois lados. Pouco depois de a descoberta de Abuquir se tornar pública, os medalhões foram apresentados à Bibliothèque nationale de France, em Paris, e ao British Museum, em Londres, mas nenhuma das instituições os adquiriu por não terem a certeza de que fossem verdadeiros.
Assim, cinco medalhões foram sugeridos à Casa da Moeda de Berlim, que os comprou após o conhecido académico Heinrich Dressel os ter declarado genuínos. A partir desse momento, a autenticidade dos medalhões de Abuquir tem sido globalmente aceite.
Os medalhões que não foram comprados pela Casa da Moeda de Berlim foram vendidos a colecionadores privados de várias partes do mundo. Gulbenkian adquiriu três exemplares a James Loeb em 1949 e os restantes oito à Pierpoint Morgan Library no mesmo ano.
As imagens reproduzidas nos medalhões estão sobretudo relacionadas com Alexandre Magno (356-323 a. C.); o seu retrato aparece em sete deles e o da sua mãe, Olímpia, em dois. Alexandre Magno também está representado em várias cenas, montando o seu cavalo Bucéfalo ou recebendo armas de Nike, rainha da vitória. O nome de Alexandre, em grego, também surge algumas vezes nas inscrições num dos lados dos medalhões. Um deles representa o imperador romano Caracala (198-217 d. C.), que tentou imitar Alexandre nas suas ações e na sua aparência.
Inicialmente, pensou-se que os medalhões fossem prémios atribuídos aos vencedores de competições desportivas; contudo, hoje acredita-se que terão funcionado como oferendas destinadas a oficiais superiores do mundo romando, possivelmente na Macedónia, onde foram feitos.
George Watson
Goethe-Universität Frankfurt am Main, Institut für Archäologische Wissenschaften