O Mar: Eterno Retorno. Ourivesaria Pré-Hispânica da Colômbia

Segunda exposição organizada pelo Museo del Oro, apresentada na Fundação Calouste Gulbenkian. Projetada como parte integrante da representação colombiana na Expo ‘98, esta mostra desenvolvera-se em torno dos mitos cosmogónicos pré-colombianos, que entendiam a água como fonte de vida.
Second exhibition arranged by the Museo del Oro and held at the Calouste Gulbenkian Foundation. The show was designed as an exhibit representing Colombia at the Expo’98, illustrating the creation myths of the pre-Columbian people, who believed water to be the source of life.

Exposição organizada pelo Museo del Oro, como parte integrante da representação colombiana na Exposição Internacional de Lisboa de 1998 (Expo'98). Em conformidade com o tema geral da Expo'98 – «Os Oceanos: um património para o futuro» –, esta mostra propunha uma viagem pelos mitos cosmogónicos pré-colombianos, que entendiam a água como fonte de vida, responsável pelo princípio da existência na Terra e onde tudo terminaria um dia.

O Museo del Oro, fundado em 1939, reúne artefactos de várias culturas índias que, entre o século X a.C. e o século XV da nossa era, habitaram o território que atualmente constitui a Colômbia. Esta era a segunda vez que o Museo del Oro apresentava na Fundação Calouste Gulbenkian uma seleção de peças da sua coleção. Em 1988, tivera lugar na mesma sala do Museu Calouste Gulbenkian (MCG) a mostra itinerante «O Ouro e a História Pré-Colombiana». Enquanto esta última assentava numa perspetiva geográfica das culturas pré-colombianas, dividindo-se por zonas arqueológicas, a exposição de 1998 era marcada por uma abordagem temática e antropológica, que se estendia às comunidades indígenas ainda existentes naquele território.

O projeto museográfico resultou do trabalho conjunto de Gregorio Sokoloff, designer do Museo del Oro, e Mariano Piçarra, responsável pelo projeto e coordenação de montagem no MCG. Ao longo da sala foram criados pequenos núcleos temáticos que ilustravam os mitos cosmogónicos e documentavam crenças, tradições e rituais essenciais à preservação da ordem cósmica. Aos objetos em ouro, cerâmica, osso e pedra criados pelos grupos étnicos pré-colombianos – Tairona, Zenú, Quimbaya, Muisca, Calima, Tolima, Nariño –, juntavam-se pequenos textos das mitologias Kogi, Ika, Desana, Makuna, Zenú, Uwa, e painéis com fotografias desses povos indígenas atuais. Deste modo, procedia-se ao cruzamento entre passado e presente, revelando-se heranças culturais fortes e a persistência de costumes.

O percurso começava com os primórdios do mundo e do universo antes de existir vida: «No princípio estava o mar. Tudo estava escuro. Não havia sol, nem lua, nem gente, nem animais, nem plantas. O mar estava em toda a parte. O mar era a Mãe. Ela era o espírito do que viria…» (O Mar: Eterno Retorno. Ourivesaria Pré-Hispânica da Colômbia [Folha de sala], 1998, Arquivos Gulbenkian, MCG 03015)

Da água do mar, dos rios, das lagoas, consoante as diferentes mitologias, toma curso a povoação da Terra: «Os primeiros homens viajavam na canoa-serpente. […] Da canoa saíam os homens para povoar a terra deixando a sua marca nas grandes rochas, assim nasceram as diferentes tribos» (Ibid.), e subsequentemente os rituais de louvor à água: «Cantamos e fazemos oferendas para que o mar siga no seu lugar. […] Cantamos para não morrer, para que o mundo não se acabe» (Ibid.). Os elementos textuais selecionados serviam para a construção da narrativa e ajudavam simultaneamente o visitante a aproximar-se do significado das formas esculpidas e moldadas.

O primeiro núcleo era dedicado ao mar e suas criaturas, e ao sol. Em duas vitrinas, foram dispostos objetos em forma de espiral ou que incorporavam este símbolo do desenvolvimento da vida. Maioritariamente, eram conchas de caracóis e búzios de diferentes formas e feitios que se usavam ou serviam de inspiração para a criação de oferendas ao mar.

O sol era tema de uma outra vitrina, representado por máscaras em ouro: «O Sol é um homem com máscara de ouro. Dele saem raios e esses raios fazem com que a vida nasça e com que tudo cresça.» (O Mar Eterno Retorno. Ourivesaria Pré-Hispânica da Colômbia, 1998, p. 13)

Seguindo a genealogia estabelecida por esses mitos, os dois núcleos seguintes centravam-se nos «descendentes» do mar e do sol: as lagoas, os homens e os rios. Um barco de madeira, produzido por um dos grupos indígenas que perduraram, abria este espaço, de forma a ilustrar o mito que afirmava que o sol e a lua navegavam pelo céu, juntamente com os espíritos protetores do mundo. Nas vitrinas, uma taça muisca revelava o modo de representação das lagoas sagradas, e um conjunto de pequenas figuras humanas modeladas em argila retratava os primeiros povos que, segundo a mitologia desana, haviam surgido das lagoas fertilizadas pelo sol. A relação destes povos com a natureza, enquanto elemento sagrado, era ilustrada através de uma maqueta que recriava uma cerimónia de oferendas de ouro à lagoa sagrada.

Seguiam-se os rios e os pântanos e a sua biodiversidade. Sapos, rãs, lagartos, jacarés davam forma a objetos utilitários ou de adorno, em ouro, cerâmica, pedra e concha.

O último espaço, dedicado ao ritual, era marcado por uma figura masculina, em tamanho real, que representava um xamã com o seu traje completo. Nas vitrinas, pequenas estatuetas, que representavam homens-ave, homens-jaguar, homens-jacaré, homens-serpente, remetiam para os poderes do xamã (homem sagrado), o único capaz de manter ou recuperar o equilíbrio do universo.

A importância do ritual para estas comunidades indígenas ia sendo percebida ao longo da exposição pela predominância de oferendas e objetos votivos. Contudo, era apenas no final da mostra que as consequências da ausência de rituais eram enunciadas, e o cenário do final dos tempos era prenunciado através de uma fotografia do mar revolto e do seguinte texto ika: «Quando os homens se esquecerem do ritual, quando o mundo se acabar. O sol e a lua serão gente outra vez. O fogo partirá. As pessoas serão esquecidas. E o mar voltará a cobrir a terra.» (O Mar: Eterno Retorno. Ourivesaria Pré-Hispânica da Colômbia [Folha de sala], 1998, Arquivos Gulbenkian, MCG 03015)

Mariana Roquette Teixeira, 2018


Ficha Técnica


Eventos Paralelos

Visita oficial

[O Mar Eterno Retorno. Ourivesaria Pré-Hispânica da Colômbia]

17 jul 1998
Fundação Calouste Gulbenkian / Museu Calouste Gulbenkian – Galeria de Exposições Temporárias
Lisboa, Portugal

Publicações


Material Gráfico


Fotografias

Visita oficial do presidente da República da Colômbia, Ernesto Samper Pizano, e da sua mulher Jacquin Strouss, acompanhados por Pedro Tamen, administrador da FCG (à esq.) e João Castel-Branco Pereira, diretor do Museu Calouste Gulbenkian (à dir.)

Documentação


Periódicos


Fontes Arquivísticas

Arquivos Gulbenkian (Museu Calouste Gulbenkian), Lisboa / MCG 03095

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém correspondência interna e externa, lista de obras, «condition report», projeto curatorial, processo de edição do catálogo, maqueta do convite e do cartaz, convite, recortes de imprensa. 1998 – 1999

Arquivos Gulbenkian (Serviço de Comunicação), Lisboa / COM-S001-D02640

Coleção fotográfica, cor: visita do Presidente da República da Colômbia Ernesto Samper Pizano à FCG por ocasião da exposição (FCG, Lisboa) 1998


Exposições Relacionadas

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