Unplace, Arte em Rede. Lugares-entre-lugares

Programa Gulbenkian Próximo Futuro

Exposição coletiva integrada no Programa Gulbenkian «Próximo Futuro». A convite de António Pinto Ribeiro, coordenador do programa, os artistas desenvolveram um trabalho digital destinado à investigação científica e artística sobre as potencialidades e os limites da tecnologia e da linguagem digital.
Collective exhibition included in the Gulbenkian Next Future Programme. Artists were invited by programme director António Pinto Ribeiro to develop a digital work for scientific and artistic research into the potential and limitations of technology and digital language.

Exposição integrada no projeto «Unplace», uma iniciativa conjunta do Programa «Próximo Futuro» da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG), do Instituto Superior Técnico (Departamento de Engenharia Civil – Secção Arquitetura) e da Universidade Nova de Lisboa (Instituto de História da Arte), financiado em parte também pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia.

Enquanto projeto de investigação científica e artística sobre as possibilidades e os limites da tecnologia e da linguagem digital, a informação encontrada na Internet serviu de ponto de partida para a reflexão teórica sobre o tema.

Os meses de pesquisa, investigação, experiências e recolha de dados resultaram numa exposição de artes visuais inteiramente virtual, inaugurada em março de 2014 sob o título «Unplace. Arte em rede: lugares-entre-lugares». Paralelamente, decorreram vários seminários e simpósios relacionados com o tema, e teve lugar na FCG uma conferência internacional. A exposição virtual ficou disponível online até ao dia 19 de novembro de 2015.

O projeto curatorial teve como objetivo discutir o conceito de «museografia intangível», dentro da área das exposições de arte contemporânea, especificamente as produzidas para contextos virtuais e em rede. No sítio oficial do projeto, podia ler-se na apresentação: «Para além de meio indispensável de comunicação, para os museus, a Internet converteu-se num novo território de concretização de projectos de arquitectura de museus, design de exposições e curadoria, designadamente com o desenvolvimento de movimentos artísticos baseados em processos digitais, como a Arte Digital ou a Internet Art. Apesar do potencial criativo que a desmaterialização possibilita, tanto a nível do contentor arquitectónico como das colecções ou conteúdos expositivos, assiste-se a uma paradoxal prevalência da reprodução da realidade material, mediante a digitalização de espaços e peças com existência física, em detrimento da criação de novos ambientes ou novas obras.» (Projecto Unplace. Apresentação, 2015)

Propunha-se assim uma série de desafios e possibilidades ainda pouco exploradas, como a criação de raiz de ambientes virtuais, em vez de apenas uma simples reprodução de espaços ou de conteúdos expositivos físicos já existentes, e questionava-se, desse modo, a realidade, a arte e as instituições, com perguntas que, genéricas ou específicas, incidiam sobre o mundo mutante da arte virtual. A partir da ideia de que «o lugar é em todo o lado e em lado nenhum», a exposição reuniu «trabalhos de Internet Art e projectos web-specific que evidenciam tensões entre espaços reais e virtuais, através de práticas online que vão desde as geopoéticas, as ficções e o hacktivismo até projectos participativos em rede» (Unplace. Um museu sem lugar. Arte em rede: lugares-entre-lugares, 2015, p. 7).

Contudo, esta ferramenta sem espaço definido é sujeita à mudança involuntária: «Uma vez libertadas pelos seus criadores nestes incontroláveis ecossistemas, as obras de arte permanecem em trânsito constante, metamorfoseando-se indefinidamente em formas que escapam aos desígnios iniciais dos seus autores, e delineando territórios que estão continuamente entre uma coisa e outra.» (Ibid., p. 10)

Importa referir o facto de «apenas uma minoria de artistas contemporâneos recorrer às possibilidades da tecnologia virtual para a produção das suas obras ou para a sua instalação online», o que, somado aos custos que o meio acarreta, pode explicar «o interesse menor dos agentes de distribuição e conservação (galerias, coleccionadores, críticos, museus)» (Ibid., p. 8). No entanto, como afirmou a equipa do projeto «Unplace», o «uso das tecnologias digitais na criação e na exposição de obras de arte […] [torna] estas obras [um] enorme e estimulante desafio curatorial» (Ibid., p. 8).

A possibilidade de atribuir às obras mutabilidade constante de forma e de contexto questionava diretamente as funções e práticas das instituições artísticas tradicionais, os modos de circulação e exposição, receção e conservação.

A curadoria, a cargo de António Pinto Ribeiro e Rita Xavier Monteiro, baseou-se «na investigação desenvolvida pela equipa unplace e teve início, em 2014, com o Open Call para Projectos Artísticos». O objetivo era levar os participantes a desenvolverem «propostas artísticas que questionem as possibilidades de criação e recepção da obra de arte num espaço expositivo puramente virtual e em rede, num museu sem lugar» (Ibid., p. 7).

O júri da open call, constituído por António Pinto Ribeiro, Helena Barranha e Susana S. Martins, selecionou três projetos artísticos para figurarem na exposição virtual: Hanna Husberg e Laura McLean – Contingent Movements Archive (2013); John F. Barber – Radio Nouspace (2013-2015); LiMac [Sandra Gamarra Heshiki e Antoine Henry Jonquères] – Solo Show (2015). A exposição, além da apresentação destes três trabalhos, incluiu mais 16 obras de web art, escolhidas pela equipa de curadoria.

Embora admitisse um modo aleatório de visita, a exposição virtual estruturava-se em torno de dois grandes eixos temáticos, que se segmentavam em duas visitas. A primeira visita, subordinada ao tema «Redes de Poder e de Controlo», assentava nas perguntas-chave: «Como estão as tecnologias digitais a reconfigurar o espaço público? Até que ponto o virtual supõe uma rede dominante? De que modo a Internet molda preocupações políticas, sociais e culturais de artistas e activistas?» (Unplace. Um Museu sem lugar. Arte em rede: lugares-entre-lugares, 2015, p. 82)

O catálogo digital enquadra as explorações artísticas online mediante uma contextualização histórica do fenómeno da arte digital e evoca os fatores que, no início da Internet, na década de 90, atraíram os artistas para a utilização da rede: «Foi o fascínio pelo meio em si, a cultura de código aberto e acesso livre, sondando novas técnicas e possibilidades de criação: o hipertexto e o hiperlink, a telemática e a interacção, a realidade virtual e aumentada. Para estes artistas, a utilização da rede previa um alcance sem precedentes para os seus trabalhos e consolidava uma estratégia de insubmissão aos agentes culturais e de consumo da arte como objecto fetichista.» (Unplace. Um Museu sem lugar. Arte em rede: lugares-entre-lugares, 2015, p. 82)

A atualidade, porém, ainda na ótica dos organizadores do catálogo, «tende a afastar-se dessa visão optimista ao considerar as consequências culturais, políticas e sociais que [a] construção da aldeia global [Marshal McLuhan] acarreta. É por essa razão que as recentes estratégias artísticas se movem inversamente entre o material e o imaterial, focando-se mais nas transformações que a Web acarreta, e os conteúdos que lhes estão subjacentes, do que propriamente na tecnologia em si.» (Ibid.)

Na primeira visita temática, encontrávamos os artistas Ahmed El Saher (Egito); AOS – Art is Open Source (Itália); Clement Valla (França/EUA); GeoGoo, JODI (Bélgica/Países Baixos); Paula Levine (Canadá/EUA); Wilfredo Prieto (Cuba); Hanna Husberg (Finlândia/Suécia) e Laura Mclean (Austrália/Reino Unido); Grupo S.A.R.L. (Portugal).

Para os artistas integrados nesta primeira visita, está em causa o caráter «supostamente democrático na difusão da informação partilhada através das redes sociais», o que se traduz numa diversidade de abordagens, que vai desde «os perversos sistemas de manipulação de dados protagonizados por […] grandes empresas tecnológicas», denunciados pelo coletivo Art is Open Source, a posicionamentos mais políticos, como o de Ahmed El Saher, que usa a chamada «Batalha dos Camelos» (Egito, 2011) como pretexto para expor «episódios violentos da revolução egípcia e o modo como são encarados pela sociedade global» (Ibid., p. 83). Nesta categoria também se inscreve o trabalho de Hanna Husberg e Laura Mclean, que «especula sobre as consequências da catástrofe climática nas Maldivas e o seu impacto no povo que habita as ilhas, denunciando a ausência de políticas de prevenção» (Ibid.). O tema da manipulação de dados por parte de grandes empresas tecnológicas que desenvolvem software de mapeamento foi igualmente alvo da atenção dos criadores, bem como a «constante perturbação e diluição de limites» (Ibid., p. 83) que hoje se verifica entre «a intimidade e a exposição, o público e o privado, o local e o global, o virtual e o real» (Ibid., p. 83). «Os projectos artísticos apresentados nesta temática situam-se nesses lugares de fronteira e assumem uma postura de análise crítica, evidenciando estruturas de poder e domínio camuflados na rede», segundo se lê no catálogo digital (Ibid., p. 82).

A segunda visita, dedicada ao tema «Espaço(s) de Ficção e Interacção», partia também de um conjunto de indagações: «O que significa estarmos conectados? Até que ponto pode o virtual alterar e ampliar a percepção e experiência do real? Que potencialidades a cultura de rede oferece no modo como nos expomos e relacionamos com os outros?»

No âmbito da temática desta segunda visita, «os projectos artísticos apresentados […] revelam experiências tecnologicamente mediadas e que acontecem num espaço intersticial, a um tempo real e virtual» (Ibid., p. 86). Os artistas pensavam, assim, «a construção e a representação da realidade a partir de acções moldadas pelos dispositivos tecnológicos». Os projetos que se enquadravam neste tema refletiam não só esta problemática, como também «a noção de comunidade e a definição de um novo perfil do espectador online», o que levava a «repensar o carácter sociopolítico do museu, bem como a experiência da arte em rede» (Ibid., p. 86). Os artistas representados neste grupo eram Ai Weiwei & Olafur Eliasson (China/Dinamarca); Alfredo Jaar (Chile); Giselle Beiguelman (Brasil); João Paulo Serafim (Portugal); John F. Barber (EUA); Thomson & Craighead (Reino Unido); Perry Bard (Canadá); Sandra Gamarra & Antoine-Henry Jonquères (Peru/França).

A conceção do website da exposição ficou a cargo da agência de design GBNT, que, mais do que apenas criar um website onde se mostrariam obras de arte, queria proporcionar «uma experiência que evidenciasse a natureza do espaço virtual, bem como a especificidade de cada obra e autor» (Ibid., p. 11). A implementação do projeto procurou seguir as «directrizes» e a «linguagem unplace», apostando simultaneamente na coerência conceptual e numa experiência de navegação «simples e intuitiva, que reserva ao utilizador a liberdade de escolha no modo como acede às obras e conhece os autores» (Ibid.). Deste propósito nasceu uma «noção de espaço vivo, em constante movimento, gerada pela interacção com o visitante e o próprio website, [que] traduz a evidência de um mundo de arte virtual que está em permanente evolução e mutação» (Ibid.).

Paralelamente ao processo de investigação e realização da exposição online, a equipa do Unplace desenvolveu um projeto para a criação de uma base de dados organizada em várias categorias. Pretendia-se reunir e sistematizar informação sobre artistas, obras de arte digital e exposições virtuais que propusessem novas relações entre arte, tecnologia e sociedade. Visava-se essencialmente explorar «o potencial que as bases de dados e as culturas em rede assumem em projectos artísticos e [em] comunidades virtuais», tanto a nível nacional como internacional (Unplace. Base de dados, 2015). Na altura da realização da exposição, este projeto estava em processo de criação, não tendo sido encontrados desenvolvimentos atuais.

O projeto rendeu diversas publicações: um catálogo digital da exposição, dois e-books (fruto das conferências), o registo das 23 entrevistas realizadas (edição digital de um booklet) e material teórico publicado no decurso da investigação (Unplace. A museum without a place, 2015).

Ana Lúcia Luz, 2020


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Eventos Paralelos

Ciclo de conferências

Uncertain Spaces. Virtual Configuration on Contemporary Art and Museums

31 out 2014 – 1 nov 2014
Fundação Calouste Gulbenkian / Edifício Sede – Auditório 3
Lisboa, Portugal
Colóquio

Apresentação do projeto «Unplace, Arte em Rede. Lugares-entre-lugares»

19 jul 2015
Fundação Calouste Gulbenkian / Edifício Sede – Auditório 3
Lisboa, Portugal
Programa cultural

Programa Próximo Futuro

2009 – 2015
Fundação Calouste Gulbenkian
Lisboa, Portugal

Publicações


Material Gráfico


Periódicos


Páginas Web


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