Jane & Louise Wilson. Tempo Suspenso

Comemorações do Centenário da República

«Tempo Suspenso» foi o nome atribuído à maior mostra individual até à data da dupla britânica de artistas e irmãs gémeas Jane e Louise Wilson (1967). Apresentada em vários pontos do Centro de Arte Moderna, a exposição reuniu diversos trabalhos «numa retrospetiva sobre os 17 anos» da sua obra.
“Suspending Time” was the title of the first major solo exhibition to date of the British duo, twin sisters Jane and Louise Wilson (1967). Displayed in several spaces of the Modern Art Centre, the exhibition featured a diverse range of works in a retrospective selection made from the duo’s 17 year-long career.

«Tempo Suspenso» foi o nome atribuído à maior mostra individual até à data da dupla de artistas e irmãs gémeas Jane e Louise Wilson, nascidas em Newcastle, em 1967. Apresentada em diversos pontos do Centro de Arte Moderna (CAM) da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) (Hall, Sala 1, Sala 2, Nave e Sala Polivalente), a exposição contou com a curadoria da então diretora do Centro, Isabel Carlos, e reuniu fotografias, vídeos, esculturas e instalações-vídeo «numa retrospectiva sobre os 17 anos» da obra das artistas (Marques, Diário de Notícias, 22 jan. 2010).

Foi na altura da Bienal de Sharjah, em 2009, nos Emirados Árabes Unidos, que Isabel Carlos conheceu de perto a dupla de artistas que viria a convidar a expor no CAM, «lançando-lhes ao mesmo tempo o desafio de “trabalharem” o edifício do centro». As irmãs aceitaram desde logo o repto e, no ano seguinte, regressaram ao CAM para começar a idealizar a exposição (Ibid.).

O trabalho artístico de Jane e Louise Wilson, muito focado na ideia de duplicação, repetição, falha ou ruína, já era conhecido no início dos anos 90, estando presente em galerias de arte britânicas e culminando na sua nomeação para o Prémio Turner em 1999.

De acordo com Isabel Carlos, «o facto d[e] as artistas serem irmãs gémeas e de se tornar difícil distingui-las fisicamente reforça a dualidade linguística e a repetição do acto em que a obra se baseia». O ponto de partida da mostra foi a apresentação do vídeo Hypnotic Suggestion 505, criado em 1993, no qual as duas irmãs se filmaram a ser hipnotizadas por dois especialistas, um português e um inglês, e «o facto de ter sido filmado em Portugal, mais precisamente na desactivada Fábrica de Moagens Harmonia, na zona de Freixo, na cidade do Porto», foi uma das razões apontadas pela diretora do CAM para justificar a escolha desta peça para iniciar a exposição. Anteriormente, o vídeo já tinha sido exibido no âmbito da exposição «A Pasta de Walter Benjamim», com a curadoria de Andrew Renton, integrada nas II Jornadas de Arte Contemporânea do Porto (Jane & Louise Wilson. Tempo Suspenso, 2010, p. 2).

De acordo com o testemunho de Jane Wilson, este vídeo foi concebido como um pequeno vídeo em que a câmara explora as potencialidades da construção panorâmica da imagem, através de processos de focagem e desfocagem num tecido, numa cortina, como introdução e conclusão de uma filmagem. Este movimento evoca a cortina que se encontra atrás das artistas, no instante em que, supostamente, mergulham mais profundamente na hipnose. A câmara deixa de focar as irmãs e «detém-se longamente num plano aproximado e fechado da cortina azul à frente da qual, tal como num palco de teatro, a acção decorre» («Uma viagem pelo universo das irmãs Wilson», Sapo Vídeos, 22 jan. 2010).

A cortina surge igualmente representada nas fotografias provenientes do arquivo de Stanley Kubrick – cineasta americano apaixonado pela história europeia – e que constituíram um dos pontos de partida para a instalação-vídeo Unfolding the Aryan Papers (2009). A instalação partiu da idealização de um filme da autoria de Kubrick sobre o holocausto – The Aryan Papers – que nunca chegou a ser realizado. A obra apresenta uma sucessão de imagens (a preto-e-branco e a cores) de Johanna ter Steegue, atriz que iria protagonizar o filme, a vaguear «entre tempos e espaços, criando dobras sucessivas», nas quais a sua identidade se encontra sempre à deriva (Jane & Louise Wilson. Tempo Suspenso, 2010, p. 2).

Nesta instalação-vídeo, as irmãs Wilson pretendiam demonstrar que a maior perturbação emanada pelas imagens em movimento residia no próprio tema do Holocausto: «It's very much about trying to understand the problems in being able to commit, to making a film, literally a film, about a piece of history which is so dark and so disturbing […] to understand the Holocaust as something that is», justificou Jane Wilson («Uma viagem pelo universo das irmãs Wilson», Sapo Vídeo, 22 jan. 2010).

Songs for My Mother, realizado em 2009 e exibido nesta mostra, baseava-se num diálogo entre uma atriz e outra personagem feminina acerca de questões ligadas à emigração, ao facto de a primeira não poder utilizar a sua língua materna e ao papel da roupa na construção da sua personagem. Este diálogo é subitamente interrompido por uma chamada telefónica que informa a atriz sobre o cancelamento do filme para o qual se preparava. De um testemunho de Jane Wilson, extrai-se que esta obra poderá ser entendida quase como um fragmento de um filme realizado, desta vez com atores profissionais e um guião, contribuindo para a ideia de que o percurso expositivo convidava à partilha de uma viagem pelo percurso artístico das autoras (Ibid.).

A exposição das duas irmãs integrou ainda outras obras, como um conjunto de cinco esculturas, algumas delas criadas propositadamente para integrarem o espaço do CAM em Lisboa. De entre as obras selecionadas, destaca-se a apropriação recorrente da imagem de réguas desdobráveis, em madeira, as chamadas yardsticks, que também surgiram nas fotografias do arquivo de Kubrick, nas instalações-vídeo já referidas e na série fotográfica Oddements, produzida entre 2008 e 2009. Esta série integrava uma sucessão de fotografias que apresentava «uma das maiores livrarias alfarrabistas londrinas». Entre «livros valiosos e antigos», «arrumados» de uma forma desorganizada e sempre com falhas visíveis (a falta de uma capa ou de uma página), surge uma figura feminina de costas «que é… a própria Louise Wilson», afirma Isabel Carlos (Jane & Louise Wilson. Tempo Suspenso, 2010, p. 4).

Das obras expostas ao longo do CAM, faziam parte a escultura suspensa Altogether – inspirada na obra do construtivista Alexander Rodchenko – e Spiteful of Dream (2008), uma videoinstalação cujo som inclui os testemunhos de emigrantes acolhidos no Centro Comunitário da Bósnia-Herzegovina, relatando as experiências traumáticas por eles vividas enquanto fugiam da guerra para procurar refúgio no Reino Unido: «O filme centra-se no movimento de uma enorme turbina e numa sequência caleidoscópica, que juntamente com o som e a imagem configuram uma verdadeira coreografia.» («Jane e Louise Wilson. Tempo Suspenso», 2010)

A exposição incluiu ainda um conjunto de cinco fotografias a preto-e-branco de grande escala (180 × 180 cm), com representações de bunkers da Segunda Guerra Mundial ao longo da costa da Normandia, a série Sealander, de 2006. Edifícios abandonados e lugares vandalizados ou em ruínas são motivos frequentes na obra das artistas.

Não foi a primeira vez que a FCG recebeu o trabalho das gémeas Wilson. Em 1996, integraram a exposição coletiva «Quartos Duplos», que incluiu obras de várias duplas de artistas e que pretendeu dar a conhecer o lado inconsciente de uma natureza coletiva, permitindo a reflexão sobre o tipo de colaboração e o modo como a autoria dos trabalhos é partilhada.

«Jane & Louise Wilson. Tempo Suspenso» foi inaugurada a 21 de janeiro de 2010 e partilhou este dia com a inauguração de outras exposições, uma delas «Abstracção e Figura Humana na Colecção de Arte Britânica do CAM», organizada em relação com a exposição individual das irmãs Wilson. Esta relação foi feita a partir da influência que os artistas Victor Pasmore, pelo seu percurso desde a figuração ao construtivismo, e Richard Hamilton, por ser considerado um «pioneiro da instalação enquanto linguagem artística», tiveram na obra da dupla. Pasmore e Hamilton estiveram ambos representados na exposição coletiva acima referida (Abstracção e Figura Humana na Colecção de Arte Britânica do CAM [folheto], 2010).

Para as irmãs Wilson, foi igualmente importante a referência a um trabalho conjunto de Pasmore e Hamilton, Suspended Construction, apresentado na exposição «Environmental Painting», em 1956, na Galeria Hatton, em Newscastle, de onde as irmãs são naturais (Ibid.).

Para acompanhar e complementar a mostra, a FCG publicou um catálogo com a reprodução das obras expostas e com breves ensaios redigidos pela curadora da exposição, Isabel Carlos, e pelo realizador e crítico de cinema Mark Cousins, que faz uma reflexão crítica mais aprofundada sobre a exposição e sobre o modo como as artistas articulam vários dos elementos das suas obras. Um dos exemplos dados por Cousins é exatamente o uso das réguas em grande parte dos seus trabalhos, afirmando que estas introduzem «não só a medição mas a medida em si, ou seja, uma unidade de espaço que, em termos musicais, é também uma unidade de tempo que cria condições de repetição e de variação» (Jane & Louise Wilson. Tempo Suspenso, 2010, p. 24).

No âmbito desta exposição em Lisboa, o CAM decidiu adquirir, em janeiro de 2010, quatro obras de Jane e Louise Wilson: Measure Obsolescere 2 (2010) (Inv. EE76), Oddments Room I (2008) (Inv. FE100), Oddments Room VI (2009) (Inv. FE101) e Hypnotic Suggestion 505 (1993) (IM31).

A inauguração da exposição contou com a presença das artistas Jane e Louise Wilson, de Isabel Carlos e do então presidente da FCG, Emílio Rui Vilar. Após ter sido exposta em Lisboa, a mostra esteve patente no Centro Galego de Arte Contemporánea, em Santiago de Compostela, entre 21 de outubro de 2010 e 23 de janeiro de 2011.

Joana Atalaia, 2019


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Coleção Gulbenkian

Hypnotic Suggestion 505

Jane & Louise Wilson (1967-)

Hypnotic Suggestion 505, Inv. IM31

Measure Obsolescere 2

Jane & Louise Wilson (1967-)

Measure Obsolescere 2, Inv. EE76

Oddments Room I (Camping amongst Cannibals)

Jane & Louise Wilson (1967-)

Oddments Room I (Camping amongst Cannibals), Inv. FE100

Oddments Room VI (My Life in Four Continents)

Jane & Louise Wilson (1967-)

Oddments Room VI (My Life in Four Continents), Inv. FE101

Hypnotic Suggestion 505

Jane & Louise Wilson (1967-)

Hypnotic Suggestion 505, Inv. IM31

Measure Obsolescere 2

Jane & Louise Wilson (1967-)

Measure Obsolescere 2, Inv. EE76

Oddments Room I (Camping amongst Cannibals)

Jane & Louise Wilson (1967-)

Oddments Room I (Camping amongst Cannibals), Inv. FE100

Oddments Room VI (My Life in Four Continents)

Jane & Louise Wilson (1967-)

Oddments Room VI (My Life in Four Continents), Inv. FE101


Eventos Paralelos

Visita(s) guiada(s)

Uma Obra de Arte à Hora do Almoço

jan 2010 – abr 2010
Fundação Calouste Gulbenkian / Centro de Arte Moderna
Lisboa, Portugal
Oficina / Workshop

Técnicas Artísticas para Não-artistas. Experiências Videográficas: Gravar, Editar e Levar para Casa

fev 2010
Fundação Calouste Gulbenkian / Centro de Arte Moderna
Lisboa, Portugal
Curso

Entre a Ficção e a Realidade. Uma Aproximação à Teoria e Prática do Video

jan 2010
Fundação Calouste Gulbenkian / Centro de Arte Moderna
Lisboa, Portugal
Visita(s) guiada(s)

Encontros ao Fim da Tarde

jan 2010 – abr 2010
Fundação Calouste Gulbenkian / Centro de Arte Moderna
Lisboa, Portugal
Visita(s) guiada(s)

Domingos com Arte

jan 2010 – abr 2010
Fundação Calouste Gulbenkian / Centro de Arte Moderna
Lisboa, Portugal

Publicações


Material Gráfico


Fotografias

Teresa Gouveia (à esq.), Emílio Rui Vilar (ao centro) e Isabel Carlos (à dir.)
Jane Wilson
Ana Gomes da Silva (à esq.)
Isabel Carlos (à esq.) e Emílio Rui Vilar (à dir.)
Isabel Carlos (à dir.)
Jane Wilson (à esq.) e Louise Wilson (à dir.)

Multimédia


Documentação


Periódicos


Páginas Web


Fontes Arquivísticas

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 01123

Pasta com documentação referente à aquisição de quatro obras da dupla Jane & Louise Wilson aquando da inauguração da exposição. 2010 – 2010

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00640

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém convite, programa de visitas guiadas, documentação sobre empréstimo de obras, textos para catálogo, entre outros. 2009 – 2010

Arquivo Digital Gulbenkian, Lisboa / ID: 8286

Coleção fotográfica, cor: aspetos (FCG-CAM, Lisboa) 2010

Arquivo Digital Gulbenkian, Lisboa / ID: 8285

Coleção fotográfica, cor: inauguração (FCG-CAM, Lisboa) 2010


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