Das Áfricas é um conjunto de cerca de 100 fotografias da autoria de José Afonso Furtado (1953), diretor da Biblioteca de Arte (BA) da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) entre 1992 e 2011. Apresenta paisagens captadas entre 1988 e 1990, que manifestam a presença colonial portuguesa entre a monumentalidade e a ruína. São imagens desertas de gente, com a presença humana a ecoar apenas nos edifícios e objetos que a câmara capta, sempre a preto-e-branco, e sempre enfatizando um dramatismo ora naturalista, ora histórico e patrimonial. 

A primeira notícia de uma exposição de imagens desta série remonta a 1991, na Galeria Cómicos/Luís Serpa, em Lisboa. Por ocasião dessa mostra, editou-se um livro que reproduz 50 das fotografias de Furtado, acompanhadas pelas introspeções da escritora Maria Velho da Costa. Essa edição, na sua versão mais regular, encontra-se atualmente disponível para consulta na BA. À data da sua publicação, contou ainda com uma edição limitada de 100 exemplares, numerados e assinados por Furtado, e uma edição de luxo, de 15 exemplares, com três provas fotográficas originais igualmente assinadas pelo autor (Das Áfricas, 1991). Em 2005, catorze anos após a sua publicação, o livro mereceu um extenso comentário de Helena Carvalhão Buescu (Buescu, «O tempo longo da história: Das Áfricas», Rivista di Studi Portoghesi e Brasiliani, VII, 2005). Outra análise seria trazida mais tarde por Adília Martins de Carvalho, sob o título «Das Áfricas: Le regard de Maria Velho da Costa sur les paysages photographiques de José Afonso Furtado» (Carvalho, Hommes et Paysages, CREPAL. Cahier n.º 16, 2010).

Em 1997, uma seleção dessas fotografias seria apresentada em Paris, no Centre Culturel Calouste Gulbenkian, e, logo no ano seguinte, o Serviço de Bibliotecas e Apoio à Leitura (SBAL) da FCG, então dirigido por Vasco Graça Moura, organiza uma exposição itinerante de 33 provas da mesma série, seis delas inéditas. A mostra viajou pelo norte de Portugal integrada no Programa «Apoio à Leitura», iniciativa orquestrada com as autarquias aderentes à rede de bibliotecas fixas gerida pelo SBAL. Foi apresentada em Caminha, na Biblioteca Fixa n.º 152, de 2 de junho a 2 de julho de 1999. Informações arquivadas indicam que terá depois viajado até Trás-os-Montes, para ficar patente na Sala de Exposições Temporárias das Termas de Chaves, entre 9 e julho e 8 de agosto de 1999. Terá descido posteriormente até à Beira Alta, dando-se a ver na Casa da Cultura de Figueira de Castelo Rodrigo, de agosto a setembro de 1999 (Arquivos Gulbenkian, SBAL 01394, SBAL 01395 e SBAL 01397).

Para acompanhar este acervo, o SBAL publicou um folheto de exposição que conta com um texto do próprio Graça Moura redigido para o efeito. Os Arquivos Gulbenkian guardam uma calendarização provisória das itinerantes do SBAL para 1999. Esse documento indicia que Das Áfricas poderá ainda ter sido apresentada nas cidades de Ourém, em maio de 1999, e de Faro, em setembro de 1999. Este último caso, a confirmar-se, ter-se-á tratado de uma apresentação em conjunto com a exposição de fotografia «Sem Luvas», de Olívia da Silva (Calendarização provisória das exposições itinerantes, 1999, Arquivos Gulbenkian, SBAL, 01394).

A fotografia foi um medium muito frequente nas exposições itinerantes do SBAL. Para tal terá pesado a portabilidade e reprodutibilidade do objeto fotográfico, aliado ao próprio facto de o campo bibliográfico ser um dos seus principais ambientes editoriais da fotografia. São evidentemente imensas as cumplicidades entre o universo da fotografia e o dos livros, e muitas foram salientadas nas exposições de fotografia integradas nestas «Acções de Apoio à Leitura» do SBAL. Entre as que integraram o programa, nesse ano de 1999, encontram-se «Sem Luvas» e «Memórias de Nós», duas exposições de âmbito educativo de Olívia da Silva (Relatório Balanço e Contas. FCG. 1999, 2000, p. 96).

Voltando a José Afonso Furtado, deve notar-se que esse terreno de afinidades entre o fotográfico e o literário está, também ele, muito presente no seu perfil autoral. Com formação universitária em filosofia, Furtado ingressou mais tarde no Instituto Português de Fotografia, onde viria a ser professor de História da Fotografia. Desde 1984 que expõe o seu trabalho fotográfico e, à data da primeira apresentação de Das Áfricas, em 1991, encontrava-se já representado nas coleções da Secretaria de Estado da Cultura e do Centro Hospitalar das Caldas da Rainha (Das Áfricas, 1991). Tem também assinado textos e assina uma tradução portuguesa dos Ensaios sobre Fotografia [1977], de Susan Sontag. Foi membro do Conselho Consultivo do Centro Português de Fotografia.

Já no campo do livro e da leitura, Furtado tem aliado a docência e a ensaística (atualmente muito ocupada pela problematização das tecnologias digitais) a cargos de relevância em organismos públicos e privados, desde logo, o de presidente do Instituto Português do Livro e da Leitura (1987-1991), a já referida direção da Biblioteca de Arte da FCG, e seu papel no âmbito do Plano Nacional de Leitura. Foi ainda vice-presidente do Conselho Consultivo da Fundação Luso-Brasileira para o Desenvolvimento da Língua Portuguesa e membro do Conselho Superior de Bibliotecas, da Comissão Nacional de Língua Portuguesa e da Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses («José Afonso Furtado», Infopédia, 2003-2020).

Daniel Peres, 2019