Os Últimos Dias. Desenhos de Alexandre Conefrey, Paulo Brighenti, Rui Moreira, Rui Vasconcelos

Exposição coletiva de desenho, com curadoria de Nuno Faria, que reuniu 46 desenhos dos artistas portugueses Alexandre Conefrey, Paulo Brighenti, Rui Moreira e Rui Vasconcelos. A mostra apresentou um total de 46 obras sobre papel, realizadas em diversas técnicas.
Collective exhibition curated by Nuno Faria featuring 46 drawings by Portuguese artists Alexandre Conefrey, Paulo Brighenti, Rui Moreira and Rui Vasconcelos. The show included 46 works on paper displaying a variety of techniques.

Exposição coletiva de desenho intitulada «Os Últimos Dias», realizada em Lisboa e organizada pelo Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão (CAMJAP). O projeto ficou a dever-se à iniciativa de Nuno Faria, que assumiu a curadoria da exposição. Os artistas participantes foram Alexandre Conefrey (1961), Paulo Brighenti (1968), Rui Moreira (1971) e Rui Vasconcelos (1967).

De acordo com a proposta dirigida a Jorge Molder, então diretor do CAMJAP, «na exposição “Os Últimos Dias”, reúnem-se quatro artistas […] unidos por interesses comuns e por uma prática semelhante do desenho enquanto veículo autónomo de concretização das ideias» (Carta de Nuno Faria para Jorge Molder, jul. 1999, Arquivos Gulbenkian, CAM 00488). Sobre o tema-título proposto, Nuno Faria esclarece que se trata da «ideia de fim […] como algo que medeia um antes e um depois. Sujeito a múltiplas abordagens e associações, ele é também, e fundamentalmente, motivo de reflexão sobre o próprio trabalho» (Ibid.).

A mostra apresentou um total de 46 desenhos, executados em várias técnicas sobre papel, entre as quais grafite, carvão, guache, tinta-da-china, aguarela e folha de ouro. Todos os desenhos patentes na exposição foram realizados entre os anos de 1999 e 2000. Como referiu Jorge Molder acerca dos participantes: «Sendo possível encontrar algumas analogias nas suas obras […], é mais ao nível da poiesis que esta reunião [de artistas] se acha.» (Os Últimos Dias, 2000, p. 13)

No âmbito da exposição, foram incorporados na Coleção Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian seis desenhos de Paulo Brighenti, a série Nilo (composta por sete desenhos) de Alexandre Conefrey e oito desenhos de Rui Moreira.

O conceito da exposição partiu, pois, do seu título, «Os Últimos Dias», que se afirmou pelas suas numerosas associações semânticas, algumas delas explicitadas por Jorge Molder: «Entre a sugestão profética de que algum fim poderá estar próximo e a comum advertência de que se está a chegar a alguma data-limite até à qual se deverá executar uma particular acção.» (Ibid.) Qualquer que fosse a associação encontrada, como acrescentou Molder, «o seu carácter de coisa inadiável sobrepõe-se sempre e parece, aliás, ser este o traço que reúne estes quatro artistas, ou que ajuda, pelo menos, a suspeitar das razões da sua aproximação» (Ibid.).

Ao longo de mais de um ano de preparação da exposição, os artistas desenvolveram um trabalho intenso, que abrangeu conversas com o curador, desenhos e vários escritos. Segundo Nuno Faria: «Em sentido contrário daquilo que fará supor o título, foram dias vividos com o tempo, e não em contagem decrescente, contra o tempo.» (Os Últimos Dias, 2000, p. 16)

A exposição foi o resultado desses exercícios e discussões contínuas, e assinalou, por isso, um desafio comum em torno do desenho, explorando um tema predeterminado: o tempo, «categoria mental que informa todo o acto criador» (Marques, Expresso, 7 ago. 2000).

As intenções de Nuno Faria para a exposição eram claras: «Tratava-se sobretudo de viver uma experiência na qual o tempo fosse determinante e se constituísse como elemento operativo (não se manifestando somente como entidade abstracta e imaterial, mas sendo efectivamente material de reflexão e de trabalho). […] Tratava-se ainda de ignorar os papéis tradicionalmente definidos numa relação deste género, provocando uma contaminação constante entre teoria e prática (mas o que é de ordem práxica na teoria e de ordem teórica na práxis?)» (Os Últimos Dias, 2000, p. 16) Por tudo isso, «Os Últimos Dias foram o problema (a abstracção, a fronteira, a linha, o cenário, a fachada) mas também a compreensão do problema, a sua vivência, a sua decifração» (Ibid.).

Por nunca ter sido imposta aos artistas uma proposta com limites semânticos definidos, a exposição resultou como uma redefinição pessoal das fronteiras do desenho. Dessa forma, a exposição apresentou uma prática muito variada do desenho, apesar de ter sido possível sinalizar algumas recorrências: além da tematização do tempo, comum a todas as abordagens – «o tempo como extinção ou como memória, como experiência de desaparecimento e de elevação, o tempo de fazer, o tempo da construção de um corpo» (Ibid.) –, a paisagem (ou elementos dela retirados) surgiu como pano de fundo.

Lúcia Marques, então crítica de arte no semanário Expresso, analisaria as propostas apresentadas por cada um dos artistas. Em relação a Alexandre Conefrey, dirá que «o encontro com a palavra e a imagem configura um tempo transgredido, em que se forjam referências sincrónicas num trânsito ilusoriamente arbitrário de associações semânticas e visuais». Sobre Paulo Brighenti, referir-se-á a um «tempo fugaz e impressivo nas atmosferas ou topografias […], em que o vazio se constitui como matéria sensível em potência definindo as fronteiras da nossa percepção». Por fim, «tempo também rasurado, parcialmente aniquilado da sua condição prospectiva, com R. Moreira e R. Vasconcelos. O primeiro, delimitando os intervalos de uma metamorfose inexorável, o segundo construindo a paisagem num processo cumulativo de memórias com diferentes intensidades» (Marques, Expresso, 7 ago. 2000).

Todos os desenhos seriam, portanto, o resultado de uma experiência que partilhou a discussão, o esboço inicial e o seu desenvolvimento, assim como teriam em comum o facto de «glosarem a paisagem como expressão sensível de uma projecção subjectiva, salvaguardando sempre nesse entendimento colectivo a singularidade de cada proposta» (Ibid.).

No texto que escreve sobre a exposição, o crítico João Pinharanda aponta também a «disciplina» como uma ideia importante para a exposição, na medida em que «as imagens apresentadas se incluem no campo de uma linguagem específica, não contaminada nem na técnica, nem no suporte, nem no tema por outras linguagens» (Pinharanda, Público, 2 jun. 2000).

O crítico acrescentaria: «Ora o que temos na presente exposição é um conjunto de estratégias de afirmação: o papel, o lápis, a tinta-da-china, as sanguíneas ou os guaches como materiais de suporte e inscrição; a paisagem como tema exclusivo embora repartido entre a paisagem como construção do natural e a paisagem como discurso historicizado e/ou culturalmente orientado; a definição rigorosa das linhas de inscrição da imagem, embora no seu interior se instalem jogos entre a mancha de preenchimento e a mancha de não preenchimento ou esvaziamentos (os fundos brancos do papel). Ora estes jogos instauram climas de desequilíbrio […]. E a consideração de dois tipos de paisagem marca também uma zona de instabilidade conceptual.» (Ibid.)

Retomando a premissa geral que motivou os desenhos da exposição – sujeitos à ideia de um fim como algo que intercede um antes e um depois –, essa ideia proporcionou ainda aos artistas uma reflexão sobre o seu próprio trabalho e o estatuto da obra de arte. Nas palavras de Nuno Faria: «Tal como percepção do fim pressupõe dois momentos distintos mas unidos por uma continuidade temporal, também o desenho-linha estrutura e delimita o suporte sobre o qual se inscreve. Desenho-linha e desenho-escrita assumem-se, assim, como forma de expressar, traduzir e interpretar o real. Mais do que simples representação da realidade, o desenho permite a recriação do mundo tal como ele é: “Eu quero as coisas. As coisas querem-me".» (Carta de Nuno Faria para Jorge Molder, jul. 1999, Arquivos Gulbenkian, CAM 00488)

Os eventos paralelos associados à exposição visaram a organização de diversas visitas guiadas, orientadas pelo curador, e em que participaram igualmente os quatro artistas.

O catálogo da exposição foi editado pelo CAMJAP e encontra-se organizado em duas partes distintas. A primeira inclui breves ensaios da autoria de Nuno Faria sobre aspetos da obra de cada um dos artistas – os ensaios não se relacionam diretamente com a prática específica do desenho. A segunda parte diz respeito à exposição propriamente dita, incluindo a reprodução das obras que a compõem e uma conversa sob a forma de diário, intitulada «Os Últimos Dias», em que se discutem problemas, expectativas e perplexidades que ao longo do tempo de preparação da exposição se foram colocando. O catálogo inclui igualmente uma introdução de Jorge Molder, a biografia dos quatro artistas e a reprodução dos desenhos apresentados.

No Relatório e Contas da Fundação relativo ao ano de 2000, a curadoria de Nuno Faria ficará registada como «excedendo estas funções». Do autor desta iniciativa dir-se-ia ainda que «desenvolveu um assinalável trabalho de reflexão e maiêutica» (Relatório Balanço e Contas. FCG. 2000, 2001, pp. 85-86).

O acolhimento da crítica especializada à exposição foi positivo, tendo sido possível reunir várias recensões associadas ao evento.

Joana Brito, 2019


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Coleção Gulbenkian

Nilo

Alexandre Conefrey (1961-)

Nilo, 2000 / Inv. 00DP1825 1-7

sem título

Paulo Brighenti (1968-)

sem título, 2000 / Inv. 00DP1797

sem título

Paulo Brighenti (1968-)

sem título, 2000 / Inv. 00DP1798

sem título

Paulo Brighenti (1968-)

sem título, 2000 / Inv. 00DP1799

sem título

Paulo Brighenti (1968-)

sem título, 2000 / Inv. 00DP1800

sem título

Paulo Brighenti (1968-)

sem título, 2000 / Inv. 00DP1801

sem título

Paulo Brighenti (1968-)

sem título, 2000 / Inv. 00DP1802

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1803

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1805

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1806

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1808

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1809

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1810

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1804

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1807

Nilo

Alexandre Conefrey (1961-)

Nilo, 2000 / Inv. 00DP1825 1-7

sem título

Paulo Brighenti (1968-)

sem título, 2000 / Inv. 00DP1797

sem título

Paulo Brighenti (1968-)

sem título, 2000 / Inv. 00DP1798

sem título

Paulo Brighenti (1968-)

sem título, 2000 / Inv. 00DP1799

sem título

Paulo Brighenti (1968-)

sem título, 2000 / Inv. 00DP1800

sem título

Paulo Brighenti (1968-)

sem título, 2000 / Inv. 00DP1801

sem título

Paulo Brighenti (1968-)

sem título, 2000 / Inv. 00DP1802

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1803

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1805

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1806

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1808

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1809

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1810

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1804

S/ Título

Rui Moreira (1971-)

S/ Título, 2000 / Inv. 00DP1807


Eventos Paralelos

Visita(s) guiada(s)

[Os Últimos Dias. Desenhos de Alexandre Conefrey, Paulo Brighenti, Rui Moreira, Rui Vasconcelos]

17 jun 2000 – 8 jul 2000
Fundação Calouste Gulbenkian / Edifício Sede – Galeria de Exposições Temporárias (piso 01)
Lisboa, Portugal

Publicações


Material Gráfico


Fotografias


Periódicos


Fontes Arquivísticas

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00488

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém convites para a inauguração; documentos referentes aos empréstimos e seguros das obras; correspondência interna entre serviços da FCG e proposta de exposição assinada pelo curador. 1999 – 2000

Arquivo Digital Gulbenkian, Lisboa / ID: 108927

Coleção fotográfica, cor: aspetos (FCG, Lisboa) 2000


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