No contexto de uma obra que aparece associada ao universo Pop principalmente pela recusa da marca autoral do gesto de pintar, View of the Bay (Vista da Baía) aponta-nos características formais que identificam o artista até finais da década de 70: o preenchimento da superfície pictórica por cores planas e densas e a demarcação dos limites das formas por uma grossa linha a preto. Esta última característica, que abandonará por encontrar ali um recurso que facilitava o pensamento plástico e denunciava a autoria, pode relacioná-lo com Roy Lichtenstein. Mas a sua orientação temática é em tudo diferente, residindo aí o seu maior argumento na recusa do rótulo Pop. Patrick Caulfield, que no Verão de 1960 viaja pela Grécia, Itália e França, pretende uma actualização da tradição pictórica europeia, identificando como seus temas principais a pintura de paisagem, de espaços interiores e de naturezas-mortas.

 

Com raras excepções, a ausência nas suas composições não só do rosto, mas também da figura humana, parece convocar o espectador abarcando-o pela realidade que lhe é oferecida, numa neutralidade aparente que potencia a contemplação das coisas como elas ali se encontram. Obedece, assim, àquela que parece ser uma via de longa duração no seu percurso: a atenção à recepção da obra. Neste caso, o domínio da grinalda que atravessa a superfície pictórica na diagonal é eloquente. O vento sentido de forma quase fotográfica, reforçado pelos dois traços curvos no canto inferior esquerdo, e a tonalidade mais escura do azul da grinalda confirmando a iluminação da baía, ajudam à sugestão desse abarcar do espectador que não é perturbado pelas figuras humanas, tratadas como mais um elemento da paisagem que se estende diante nós. Este distender do plano pictórico é significante ao atentarmos à opção inicial do pintor por telas quadradas, por não serem automaticamente associáveis a um panorama, em telas que se desenvolvem na horizontal, ou à figura humana, em telas verticais.

 

Ao longo da carreira, Caulfield coloca à sua disposição todos os recursos técnicos que possui, encarando-os criticamente e fazendo-os corresponder às necessidades intrínsecas desta ou daquela obra. Nesta superfície horizontal e de grandes dimensões, que corresponde às necessidades formais de uma pintura de paisagem como a entendia o autor, a relação de azuis que distingue as três áreas principais do quadro é iluminada pelo uso de vermelhos, laranjas, amarelos e brancos. Remete-nos para a memória da Côte d’Azur, devendo recordar-se a importância que tem na geografia da arte moderna pelo trabalho aí desenvolvido por pintores como Cézanne ou Matisse.

 

 

André Silveira

Maio de 2010