A paisagem como conceito, imaginário, percepção e representação, na esfera real ou ficcional, foi um tema de pesquisa presente no corpo de trabalho de Gil Amourous (1971) e de um conjunto de artistas portugueses maioritariamente formado na escola Ar.Co, emergente no final da década de noventa.

Nesta obra Sem título (1998) apresentada em 1999 na exposição 7/10 – 7 artistas ao 10º mês, no CAM, Amourous sublinha a importância concedida ao tratamento desse tema e género artístico. A composição, desenhada a pastel sobre papel, é dominada por um rectângulo de vegetação densa, com árvores e ramos que se entrelaçam, construindo um espaço sobrecarregado e de forte apelo visual.

Porque falamos do espaço de representação, importa mencionar o carácter e a qualidade de observação e percepção a que nos impele esta obra. Sendo o seu formato de dimensões consideráveis, ela pressupõe um processo de observação à distância que abarque o todo; porém, a profusão de pormenores e o efeito de atração induzido pelo reconhecimento despertam invariavelmente o desejo de uma maior proximidade com a imagem e o suporte da obra.

Nesse contacto mais íntimo o que verdadeiramente se destaca nesta composição é o desenho formado por 12 partes ou módulos de papel cartonado, enquadrado por uma margem negra que salienta ainda mais a vibração cromática da imagem. Nesse lugar tornam-se perceptíveis não só as partes constituintes como todos os detalhes que povoam este exercício de inscrição e materialização de uma paisagem natural. Tal como acontece na relação diferencial entre a visão macroscópica e microscópica da realidade, se aqui perdemos o desenho global, ganhamos em profundidade, na verificação dos pormenores, contornos, formas e no acompanhamento das junções, da continuidade e descontinuidade das linhas. Trata-se invariavelmente de aceder e literalmente acompanhar mais de perto as características e elementos do próprio processo de trabalho artístico de Gil Amourous, que no limite inferior deixou presente a zona de ensaio da sua paleta cromática.

Sandra Vieira Jürgens
Outubro 2014