Neste guache de 1959, Francis Smith centra a atenção na rua da Chaussée d’Antin, artéria comerciante de Paris onde se situam as famosas Galeries Lafayette. Autêntica celebração do Verão e da moda feminina de finais de 1950 (o saiote é aqui a peça mestra), os brancos, rosas e azuis tufados que atraem o olhar prolongam outras visões pictóricas nascidas de outras sensibilidades, também elas atentas aos efeitos cromáticos da luz sobre a matéria. Podemos aproximar a densidade luminosa dos jupons de Francis Smith da feérie de brancos com que Claude Monet pintou Les Dindons (1877) ou, num registo temático mais “canalha”, aproximá-las dos movimentados saiotes das dançarinas de cancã com que Henri de Toulouse-Lautrec ilustrou o cartaz da troupe de Mlle. Eglantine, na década de 1890. Podemos, ainda, invocar os alvos saiotes de Les danseuses de French Cancan que se agitam na tela do mundano Jean-Gabriel Doumergue (1889-1962), grande retratista da parisienne da primeira metade do século XX. Mas, uma vez esboçado este quadro de associações plásticas e temáticas possíveis, resta ressalvar aquilo que é, afinal, uma evidência. A delicada e discreta parisienne de Francis Smith espelha a alma do seu criador. Avessa a mundanidades e a qualquer espécie de pavoneios, ela é aquela delicada flor que opõe a sua graça e a sua frescura ao imponente e severo casario haussmaniano.
ILC