So Ad Men Became Depth Men é um título que faz referência a um dos capítulos de The Hidden Persuaders (1957), obra de Vance Packard que critica as tecnologias de manipulação psicológica e simbólica que, desde a década anterior, estavam a transformar a indústria da publicidade. Trata-se de uma pintura de uma fase ainda inicial do percurso de Derek Boshier, marcada pela figuração e pela proximidade ao Pop britânico. Podem também observar-se referências de cariz surrealista, bem como sugestões que remetem para a estrutura narrativa característica da ficção científica. As formas e as cores, dominadas pelo contraste entre o verde e o vermelho, aproximam-se, sem coincidir, ao design gráfico e à mecanização da imagem. Neste distanciamento, a obra desenvolve a sua abordagem crítica e satírica ao culto recente das comodidades e do bem-estar.

 

A referência explícita à pasta de dentes é comum série Identi-Kit Man em que se insere (note-se que o primeiro anúncio comercial lançado na televisão britânica foi exatamente a uma pasta de dentes). Nesta série é desenvolvido o tema da publicidade, do consumismo e da perda de identidade, temática a que não terão sido estranhas leituras de obras que abordavam esta nova realidade social de uma forma crítica: a já citada The Hidden Persuaders; The Mechanical Bride: Folklore of Industrial Man (1951) de Marshall McLuhan; The Affluent Society, (1958) de John K. Galbraith; ou The Image (1960) de Daniel Boorstin.

 

Há em So Ad Men Became Depth Men um olhar crítico ou irónico sobre a crescente capacidade persuasiva da publicidade e a padronização social daí decorrente. Vance Packard definira, na obra citada, a produção social de custom-built men [pessoas feitas à medida], devido às cínicas manipulações simbólicas da publicidade. A figura humana, um hipotético homem comum apenas esquematizado, repete-se na pintura num sucessivo desmembramento, sublinhando a despersonalização face ao protagonismo assumido pelo produto representado. Num texto de catálogo de 1962 Boshier afirmou, neste sentido, que as figuras nas suas pinturas funcionam como símbolos de auto-identificação.

 

«Representa[m]-me a mim (a nós) como espectador, participante,  jogador, ou pequena roda na engrenagem – o ‘nós’ amorfo. A figura ou as figuras são colocadas dentro, contra ou como parte de um fundo, onde são manipuladas dentro de ‘acontecimentos’. Estes acontecimentos refletem sobre o carácter irónico, ambíguo, satírico e instável de situações. As figuras são uma auto-reflexão de uma análise psicológica visual e ambígua.»*

 

 

* Citado em British Pop, catálogo de exposição, Bilbao: Museo de Bellas Artes de Bilbao, 2005, p. 404. Tradução do revisor.

MG

 

Maio de 2010