Desenhador e ilustrador, João Abel Manta publicou com muita regularidade obra gráfica na imprensa portuguesa entre o final dos anos sessenta e a década de setenta, período que engloba duas fases marcantes da história de Portugal, a Guerra Colonial e o fim da ditadura do Estado Novo, com o subsequente Processo Revolucionário em Curso (PREC).

 

Este trabalho de 1972, que integra o conjunto de ilustrações da obra Dinossauro Excelentíssimo de José Cardoso Pires (Lisboa: Arcádia, 1972), exemplifica o teor crítico e irónico dos trabalhos que produziu sobre a realidade portuguesa durante a vida política de António de Oliveira Salazar e do regime do Estado Novo.

 

A composição centralizada, não muito comum no trabalho de Manta, é dominada pela representação da fotografia de um peso de balança antiga, que por força da ampliação e do jogo entre a figura e o fundo se destaca plenamente no desenho. Essa enorme forma, imperativa, aqui exibida com uma aparência muito similar à de um forte, pode ser identificada como imagem crítica do regime e da nação. Com ela o artista simboliza o peso da realidade opressiva, mas também a condição e o estado do exercício do poder, aqui associado à figura sinistra que se observa no interior daquela construção, pronta a discursar mas solitária, encerrada e afastada da realidade, tornada prisioneira de si mesma, e que adquire contornos de uma silhueta de expressão maléfica, num teatro de sombras com fim anunciado.

 

 

 

Sandra Vieira Jürgens

Maio de 2015